SAv suspende plataforma de VOD e Canal da Cultura e quer mais protagonismo na gestão do FSA

O economista pernambucano Alfredo Bertini assumiu a Secretaria do Audiovisual do Ministério da Cultura no início de junho, a convite do ministro Marcelo Calero. Os dois não se conheciam. Bertini foi indicado por sua atuação na área do audiovisual (é diretor do festival de cinema de Pernambuco) e pelos seus textos sobre o tema, como o livro "Economia da Cultura – A Indústria do Entretenimento e o Audiovisual no Brasil".

Nesta entrevista exclusiva ao Tela Viva News, a primeira que concedeu desde que assumiu o cargo, ele conta que pretende cuidar de perto da questão da Cinemateca, gerenciar os projetos e acervos que já estão prontos e reassumir o protagonismo na atividade de fomento. Bertini falou durante a ABTA 2016, que aconteceu em São Paulo na semana passada.

TELA VIVA – Quais serão suas principais diretrizes frente à SAv?

Alfredo Bertini – Uma parte ainda não posso antecipar, pois virão novas missões, mas a ideia geral é criar condições de governança para a política audiovisual no país, aproveitando parte do que já foi construído. Estou fazendo um "pacotaço" (de ações), incluindo a Programadora Brasil e os NPDs (Núcleos de Produção Digital).

Como isso se reflete nas ações a serem tomadas?

No curto prazo teremos a volta da revista do CTAv, e retomaremos as condições de funcionamento da Cinemateca, planejando seu futuro de forma que consiga daqui para a frente sobreviver às crises. Também estamos inclinados a estudar o apoio de alguma universidade federal e de departamentos de economia para estudos sobre o consumo de audiovisual no Brasil. Temos expertise na oferta, a política sempre foi feita com base na oferta. Mas não há nada sobre o perfil de consumo. É um mercado complexo, que envolve cinema, DVD, TV, VOD. Temos que entender como o público reage. Por exemplo: até que ponto os produtos são susceptíveis à variação de preços? Sou economista, me preocupa esta elasticidade, sempre vi por este viés.

"Queremos estudar o mercado audiovisual no Brasil. Sempre pensamos na oferta, mas sabemos pouco sobre a demanda"
"Queremos estudar o mercado audiovisual no Brasil. Sempre pensamos na oferta, mas sabemos pouco sobre a demanda"

E em relação aos editais?

Estamos pensando agora em abrir um edital para filmes voltados a adolescentes. Aqui entra a questão que eu mencionei antes, de conhecer a demanda. Será que vale a pena abrir um edital assim? Será que este público quer ver filmes, ou prefere séries, ou games? Achamos que é melhor abrir agora, não ficar parados, mas no futuro queremos saber mais, ter mais informações antes de lançar um edital. A gestão anterior acertou ao fazer editais para o público infantil, vamos continuar com isso. E daremos sequência às demais atividades, às comissões existentes, ao processo de indicação ao Oscar, os editais de games, do DocTV e do Fundo Setorial do Audiovisual. Vamos criar mais 18 NPDs, mas não sabemos como está o uso dos 16 atuais. Estou mandando funcionários aos estados para ver isso. 

E para o longo prazo, considerando que esta gestão tem no máximo dois anos à frente?

A partir de 2017 queremos estabelecer esta nova governança. Quero fechar acordos internacionais, não só para coprodução, mas também para a formação profissional.

Como eu disse, sempre trabalhei com informação, então quero estabelecer um sistema de gestão de projetos, com parâmetros de avaliação de gestão. Numa segunda etapa da pesquisa sobre o audiovisual, quero discutir modelos que permitam a institucionalização do modelo de acervos. É fundamental criar um modelo institucional que preserve a Cinemateca e o CTAv das idas e vindas políticas.

Como está a questão da Cinemateca?

O problema que houve é página virada. Está em vigor um convênio com a Acerp (Associação Roquette Pinto) até dezembro, e lançaremos nos próximos dias um edital para uma nova gestão via OS (Organização Social). Enquanto isso estamos constituindo uma comissão para pensar numa saída, nesse modelo institucional.

"Não vejo como tomarmos uma iniciativa dessas nesse momento" sobre a plataforma própria de VOD)
"Não vejo como tomarmos uma iniciativa dessas nesse momento" (sobre a plataforma própria de VOD)

Pretende continuar com o projeto de uma plataforma própria de VOD, para exibir os conteúdos nacionais (a plataforma foi proposta pelo ex-secretário Pola Ribeiro, veja mais aqui)?

Vivemos um momento público difícil, de ajustes. Então, naquilo que puder ser feito pela iniciativa privada, os empreendedores serão chamados. O papel público é de regulador, de mediador. Não vejo como tomarmos uma iniciativa dessas nesse momento.

E o Canal da Cultura?

Vou levar esta ideia para as novas mídias. Não posso pensar sem ter os olhos para a frente, para a inovação. Esta visão de TV pública, para este canal, não acho que seja o caminho. Quero sim retomar o projeto da Programadora Brasil (nota: sistema de entrega gratuita de DVDs a escolas e outros órgãos para difusão do conteúdo nacional, criado em 2007), mas dentro desta filosofia. Por que não podemos distribuir pela web, com parceiros que tenham esta expertise? Temos que enxugar o setor público.

Bertini descarta a criação por ora do Canal da Cultura, preferindo a distribuição do conteúdo da Programadora Brasil por outros meios
Bertini descarta a criação por ora do Canal da Cultura, preferindo a distribuição do conteúdo da Programadora Brasil por outros meios

Mas o MinC tem direito a um canal aberto, previsto no decreto da TV digital. Vão abrir mão disso?

Não é abrir mão, mas estabelecer uma escala de prioridades. Para se alcançar os consumidores hoje não precisa passar pela TV. Temos mais de 900 títulos em acervo, mais de 200 mil DVDs. Por que não escoar isso para as bibliotecas, dar às escolas? Conseguimos atingir 30% a 40% das bibliotecas. Também pode ser feita uma parceria com a TV Escola, do MEC, ou com outros canais que possam dar escoamento.

O ministério pretende ter um papel mais ativo nas definições de políticas do FSA (Fundo Setorial do Audiovisual)?

Está é a mudança principal. Queremos parceria com a Ancine, mas tem um papel que cabe à SAv sobre a política do audiovisual. Vamos participar ativamente de todas as instâncias gestoras, restabelecer este espaço que foi delegado (à Ancine).

Este é um fundo que está fora do contingenciamento, porque tem origem no setor, e não no Tesouro, diferentemente do FNC (Fundo Nacional de Cutura). Um exemplo do que queremos fazer é cuidar mais da preservação. Uma política nova poderia pensar mais na memória. Por que não fazer isso com recursos do FSA? É uma decisão política.

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