Produtoras e entidades assinam "Pacto de responsabilidade anti-assédio no setor audiovisual"

A segunda edição do Seminário Internacional Mulheres no Audiovisual, que aconteceu nesta quarta-feira, dia 04 de julho, encerrou com um momento histórico: representantes de produtoras e entidades do mercado assinaram o inédito "Pacto de responsabilidade anti-assédio no setor audiovisual", um documento criado em parceria entre essas organizações e jurídicos que tem como objetivo funcionar como referência para busca de informações e orientações para casos de assédio em sets de filmagem e demais ambientes de trabalho da área.

Recentemente, o audiovisual ajudou a mudar a percepção do assédio no espaço público – um exemplo é o lançamento do documentário nacional "Chega de Fiu-Fiu", campanha criada em 2014 e que, neste ano, virou filme – a obra, inclusive, faz parte da programação do primeiro "Festival Internacional de Mulheres no Cinema", que acontece agora na primeira quinzena de julho. A produção das diretoras Amanda Kamanchech e Fernanda Frazão foi financiada coletivamente, via "Catarse", enfatizando assim a demanda do público por conteúdos com a temática.

Além de servir como janela para exposição do assunto, o audiovisual fez questão de abordar o assédio dentro do próprio setor. Uma capa recente da revista Time e manifestações de atrizes globais na última edição do Globo de Ouro trouxeram à tona uma série de denúncias de episódios envolvendo assédios contra atrizes, produtoras, figurinistas entre outras. Campanhas difundidas no meio digital, como a #MeToo, na qual mulheres relatam suas próprias experiências de assédio, reforçaram a criação de ações institucionais ao redor do mundo. No Brasil, denúncias também foram aparecendo em ambientes como sets de novelas ou de filmes.

Antônia Pellegrino, roteirista premiada pela Academia Brasileira de Letras e pela Academia Brasileira de Cinema e curadora do blog "#AgoraÉQueSãoElas", da Folha de S.Paulo, foi quem tomou a iniciativa de levar o assunto pessoalmente para as principais produtoras brasileiras. Com o reforço e a chancela de Marianna Souza, gerente executiva da Associação Brasileira da Produção de Obras Audiovisuais – a Apro – que reconheceu a demanda do setor pela tomada de atitude diante da questão problemática, foi criado o "Grupo Anti-Assédio", que tinha como objetivo a adoção de uma medida institucional sobre o assédio no audiovisual.

O advogado Caio Mariano, do escritório Caio Mariano Advogados, foi um dos redatores do "Pacto de responsabilidade anti-assédio no setor audiovisual". "Nosso objetivo principal era tratar o tema de forma direta e objetiva, e não como tabu.", explica. O advogado afirma que a legislação brasileira ainda é tímida nesse assunto – para ser considerado assédio, por exemplo, os atos precisam ser cometidos por alguém em posição hierárquica superior, o que dificulta bastante a criminalização. Além disso, quem testemunhou um caso de assédio e quer denunciar, não consegue. "A denúncia pode ser feita apenas pela vítima.", diz.

Mateus Basso, advogado com experiência nas áreas de Entretenimento, Direito de Autor, Propriedade Industrial, Terceiro Setor e Administrativo, também participou da redação do Pacto: "Reunimos dicas práticas de como agir diante de situações de assédio para que isso realmente tome forma e não vire uma 'leitura morta'.". O documento conta com uma cartilha que explica o que deve ser feito por parte da vítima, da testemunha e também da produtora responsável pelo set de filmagem onde a situação de assédio aconteceu. "A vítima, por exemplo, deve reunir o máximo de provas, como fotos, gravações e relatos, e aí denunciar, procurar assistência jurídica e psicológica e então enfrentar o ocorrido com seriedade, coragem e determinação.", sugere. "Às testemunhas, cabe oferecer apoio emocional e legal, isto é, se colocando à disposição para depor a favor da vítima.", completa. E, por fim, o advogado relata o que a cartilha recomenda aos produtores: ter a premissa básica de seguir as normas e as leis; Oferecer treinamento "anti-assédio" para a equipe; Adotar uma política interna contra o assédio; Zelar pelo ambiente de trabalho; Abrir canais acessíveis para denúncia; Cuidar da possível retaliação à vítima.

Além de Caio Mariano e Mateus Basso, participaram da redação do Pacto os jurídicos Gabriela Pastore, João Paulo Morello e Patricia Portaro. Já as produtoras participantes foram Academia de Filmes, Hungry Man, Conspiração, Prodigo Films, Gullane e O2. Durante o evento, Marianna Souza, da Apro, ressaltou: "Manter um ambiente de trabalho saudável é obrigação legal, por isso é importante que as produtoras participem dessas discussões".

Os eixos de atuação do pacto dividem-se em três: Prevenção (distribuição de cartilha didática, realização de workshops de sensibilização e disclaimer nos contratos de trabalho); Intervenção (criação de uma ouvidoria, apuração dos casos e acompanhamento); e Proteção (repreensão e punição dos casos comprovados e garantia da não reincidência dos mesmos). A Ancine comprometeu-se a trabalhar na divulgação da agenda do Pacto, compartilhando, por exemplo, as datas dos workshops.

O momento de assinatura do "Pacto de responsabilidade anti-assédio no setor audiovisual" foi comandando por Debora Ivanov, diretora da Ancine. Assinaram o documento os seguintes nomes do setor: Paulo Schmidt, presidente da Apro; Rachel do Valle, gerente-executiva da Bravi; Leo Edde, presidente do Sicav; Magda Hruza, também representante do Sicav; Simoni de Mendonça, da diretoria do Siaesp; Sonia Santana, presidente do Sindcine; Ana Souto, representante do Sated; Pedro Ribeiro, da Gullane; Renata Brandão, da Conspiração; Beto Gauss, da Prodigo Films; e Andrea Barata, da O2 Filmes. Todos comprometeram-se a adotar na prática as instruções estabelecidas pelo Pacto.

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