Auditoria sobre Artigo 39 questiona se recolhimento de 3% pelas programadoras foi correto

A auditoria realizada pela Ancine em relação à aplicação dos recursos do Artigo 39 recomenda que seja feito um cruzamento de dados com a Receita Federal para que se verifique se os recursos recolhidos correspondem, de fato, aos 3% das remessas ao exterior, conforme determina a MP 2.228/2001. A constatação da auditoria é que "nos últimos cinco anos, relatório disponível no Observatório Brasileiro do Cinema e do Audiovisual indica que somente em 2017 o valor recolhido pelo mecanismo de incentivo do art. 39, inciso X, da Medida Provisória nº 2.228-1/01 é aproximadamente igual a 3% (três por cento) dos pagamentos/créditos/remessas/empregos/entregas para o exterior; o que sinaliza uma possível evasão fiscal da ordem de quase R$ 157,7 milhões". Ou seja, segundo este indício analisado pela auditoria, as programadoras podem estar recolhendo menos do que deveriam, razão pela qual o relatório foi mandado não apenas para o Ministério Público Federal mas também para a Receita Federal. Entre 2013 e 2017, as programadoras recolheram R$ 356 milhões.

Uma das recomendações dos auditores é que "seja pactuado, pela SFO (Superintendência de Fomento) com a Secretaria da Receita Federal do Brasil, o envio, no mínimo anual, para a ANCINE de informações a respeito dos valores de pagamentos, dos créditos, dos empregos, das remessas ou das entregas, aos produtores, distribuidores ou intermediários no exterior, de importâncias relativas a rendimento decorrente da exploração de obras cinematográficas e videofonográficas ou por sua aquisição ou importação, a preço fixo, para que se possa comprovar, minimamente, a integridade e a confiabilidade dos valores depositados pelas programadoras/investidoras nas contas de recolhimento, em consonância com art. 39, inciso X, da Medida Provisória nº 2.228-1/01", segundo documento a que este noticiário teve acesso.  A auditoria também recomenda que "caso seja identificado que os valores recolhidos nos últimos cinco anos (2013-2017) foram realmente inferiores a 3% (três por cento), em dissonância com o art. 39, inciso X, da Medida Provisória nº 2.228-1/01, que a SFO tome as medidas administrativas cabíveis e necessárias, para contrapor eventual evasão fiscal dos agentes econômicos envolvidos".

No mercado de TV por assinatura há o entendimento bastante consolidado entre as programadoras, inclusive, de que o recolhimento dos 3% recolhidos não constituem exatamente um benefício fiscal. Estes recursos, segundo esta análise tributária, podem ser entendidos como um investimento feito pelas programadoras em produção para evitar que as operadoras tenham que pagar os 11% de Condecine sobre a remessa ao exterior. "O contribuinte da Condecine-Remessa não é a programadora, é a operadora caso a programadora não tivesse feito a opção pelo Artigo 39. Portanto os 3% depositados e aplicados via Artigo 39 são recursos de investimento em programação. A programadora faz isso para diminuir o encargo para a operadora. A programadora não é sujeito passivo do tributo. O que ela faz é dar um benefício fiscal para o outro, que é a operadora", explica uma fonte.

Outro achado da auditoria foi o fato de que a conjugação dos diferentes dispositivos normativos da Ancine permitia a indicação formal de projeto audiovisual ainda não aprovado pela agência para aplicação de recursos, mas houve casos de projetos que sequer haviam sido submetidos à aprovação da agência. Como são muitos casos, seria necessário olhar caso a caso, dizem fontes do mercado, indicando que em geral o que acontecia era um descasamento entre o registro pelo programador e pelo produtor. Uma fonte da agência, contudo, defende a auditoria neste aspecto. "A exceção se tornou a regra. Um em cada quatro projetos foi aprovado com alguma excepcionalidade, seja na questão do prazo de aplicação, seja pelo fato de a produção não ter sido sequer apresentada ainda à agência", diz a fonte, destacando que em 200 projetos analisados, havia problema em 64 deles. A própria auditoria indica, em suas conclusões, que isso acontecia pela falta de controle interno.

Vale destacar que na matéria publicada originalmente por este noticiário sobre o assunto há duas imprecisões, já retificadas: a auditoria foi realizada pelo auditor da agência, e não por uma comissão de auditoria indicada pelo presidente. E o envio ao Ministério Público Federal não foi uma liberalidade, como afirmou este noticiário, mas uma consequência do fato de as denúncias originais que ensejaram a auditoria terem sido encaminhadas pela presidência da Ancine ao MPF.

A auditoria conclui que "não há conformidade plena dos procedimentos de aplicação dos recursos originados do art. 39, inciso X, da Medida Provisória nº 2.228-1/01 e não há eficácia plena dos controles internos". Diz ainda que há controles internos na SFO que "auxiliam razoavelmente no alcance do objetivo operacional analisar, decidir e monitorar adequadamente a aplicação de recursos advindos do art. 39, inciso X, da Medida Provisória nº 2.228-1/01. Entretanto, há oportunidades de melhoria para evitar ou minimizar a materialização de eventos de riscos". Por fim segundo o documento a que este noticiário teve acesso, "as recomendações expedidas direcionam a um sistema de controles internos que possibilite maior conformidade do processo de aplicação de recursos e propicie a mitigação ou a inibição de imprecisões desse processo. O aprimoramento desse sistema contribuirá para minimizar possíveis consequências, tais como: 'insatisfação dos regulados', 'imagem/reputação comprometida com a sociedade' e 'atuação de órgãos de controle – CGU, TCU e Ministério Público' ".

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