Cinema x VoD: representantes do setor comentam alternativas para boa convivência entre as janelas

O filme escolhido para encerrar a programação da 42ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo foi "Roma", produção da Netflix que estará na grade da plataforma a partir de dezembro deste ano. De fotografia em preto e branco, a obra do diretor mexicano Alfonso Cuarón não pode ser exibida em alguns países, como a França, por ser originária da Netflix e, por isso, não cumprir com as janelas de exibição obrigatórias por lá. E é justamente essa discussão – sobre a convivência dos cinemas com as plataformas de VoD – que reuniu importantes representantes do setor nesta quinta, 24/10, durante o II Fórum Mostra, parte da programação do evento.

Para Rodrigo Saturnino, diretor geral da Sony Pictures no Brasil, não há dúvidas de que o cinema e o VoD vão conviver bem, sim – isto é, um não vai tirar o público do outro. "O cinema ainda conta com três fatores – tecnologia, conforto e segurança – que o colocam um passo à frente de qualquer serviço que as pessoas tenham em casa. Ir ao cinema é uma atividade e as pessoas querem sair. Isso é o suficiente.", declarou. "A discussão da janela sempre esteve presente. Lembro de discutir o que aconteceria com as locadoras em 2010, durante o Festival de Paulínia, e daí pra frente o cenário mudou muito rápido. É claro que não vamos atentar contra a liberdade de escolha do consumidor. Mas comparando com outras formas de entretenimento no Brasil, o cinema se destaca até no preço. É mais barato ir ao cinema do que assistir a um jogo de futebol no estádio, por exemplo.", completou. "E temos dados que comprovam que filmes lançados no cinema ainda valem mais, por princípio. Melhora a performance dele em outras plataformas.", concluiu.

Adhemar Oliveira, diretor do Espaço Itaú de Cinema e representante dos exibidores no Painel, também é otimista diante do cenário atual, mas apresenta alternativas. "O cinema também pode funcionar no estilo de assinatura, como são as plataformas de streaming atualmente. E ainda acho que a rede de cinema também poderá estabelecer suas próprias plataformas online no futuro. Com a tecnologia se espalhando, vai ser relativamente fácil criar isso.", disse. "E a questão é que salas de cinema custam de 3 a 5 milhões de reais para serem feitas. Já gastamos esse dinheiro, já estamos aqui. Não vamos mudar de uma hora pra outra e jogar tudo fora.", afirmou.

Representando uma marca que já nasceu no universo do streaming, Luiz Bannitz, diretor de conteúdo e de negócios do Looke, conta que a plataforma surgiu inicialmente para suprir um movimento de queda no mercado de home video, em um formato de locação e compra semelhante ao das locadoras físicas. "O diferencial é o grande volume de oferta que o digital permite, o que não é viável em outros meios que tenham custos associados à distribuição.", apontou. "Apesar disso, da nossa perspectiva, é um momento complicado. Plataformas querem comprar conteúdo com exclusividade, ao mesmo tempo em que as TVs também querem, mas para disponibilizá-los em suas plataformas de VoD… Como compor esse conflito entre janelas é o grande desafio.", declarou. Bannitz sugere um esquema de lançamento simultâneo para o Brasil, o qual ele sabe que sofreria bastante resistência por parte das salas exibidoras. "É impossível lançar um filme no país inteiro, então seria uma opção para cobrir isso, com uma proposta de estrear no digital somente nas praças que não receberão o filme nos cinemas. É uma ideia. Afinal, estamos em um período de experimentação. O VoD eliminou questões de datas, regras e prazos.", explicou.

Ainda analisando possíveis formas de conciliar lançamentos de cinema e VoD, Saturnino opina: "O FSA poderia abrir uma linha de financiamento para filmes que serão lançados exclusivamente no VoD. A parcela de renda no cinema ainda é muito importante. Dessa maneira, as obras não se misturam. Documentários, por exemplo, não vão bem no cinema. Não é o veículo ideal para eles. Já o VoD, sim. É perfeito para documentários.". Segundo ele, o consumidor já sabe exatamente o que fazer. "A gente é que não sabe.", brincou. O diretor da Sony falou ainda sobre a diferença entre o setor do cinema no Brasil e no resto do mundo. "França e Espanha, por exemplo, são países onde o segmento de filmes de arte, apesar da tradição, está em crise. E há filmes da Sony que só o Brasil lança. 'Desobediência' é um exemplo disso, e que acabou performando bem nos cinemas daqui.", citou.

Por fim, todos pontuaram benefícios que a era do streaming trouxe. "O VoD aumentou consideravelmente nossa oferta. Hoje, vemos coisas que jamais veríamos no Brasil, principalmente dentro de casa. Isso é algo que nem o VHS, o DVD ou o Blu-Ray conseguiram. Até o cinema foi beneficiado pelo VoD, uma vez que a questão da pirataria diminuiu bastante, agora que os títulos chegam mais rapidamente ao público final.", analisou Saturnino. Já para Adhemar, tudo indica que a tendência é que o audiovisual se torne cada vez mais segmentado por conta do digital. "Conforme a tecnologia evolui, nichos são criados. Tem espaço para todos, não há porque falar em monopólio. Até os menores têm seu espaço e seus próprios públicos.", completou.

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