Malu Miranda, head de originais da Amazon no Brasil, afirma que diversidade é prioridade para o estúdio

Por mais de 20 anos, Malu Miranda trabalhou como assistente de direção, segunda unidade de direção e produtora em projetos dirigidos por cineastas renomados como Steven Spielberg, Katia Lund, Fernando Meirelles, Hany Abu Assad, Justin Lin e Sandra Kogut. Vivendo e trabalhando entre o Brasil, os Estados Unidos e a Europa, ela teve uma formação cinematográfica diversificada. Graduou-se em Cultura Moderna e Mídia/Cinema pela Brown University em 1999. Em 2009, juntou-se a André Pereira para formar a Lupa Filmes, onde desenvolveram uma vasta gama de conteúdos, lançando dois longas-metragens de sucesso – "Mato Sem Cachorro" e "O Rastro". Em março de 2019, Miranda ingressou no Amazon Studios como Head de Conteúdo Original Brasileiro com o objetivo de criar os primeiros conteúdos originais locais do Amazon Prime Video. 

"A Amazon é obcecada pelo consumidor final. Queremos criar um serviço que tenha conteúdo para todo mundo. E, nesse sentido, como a gente trabalha com o Brasil, um dos locais mais vastos e diversificados do mundo, com regiões com suas próprias culturas, nossas produções têm de refletir essa diversidade, isto é, retratar um Brasil que seja real, autêntico, com histórias representativas da nossa cultura", declara a executiva em entrevista exclusiva para TELA VIVA. "A gente pretende erguer as vozes dos realizadores brasileiros para oferecer conteúdo para o público brasileiro em primeiro lugar. Além disso, queremos que nossos filmes e séries representem conteúdos que o consumidor não acha em nenhum outro lugar. Visamos produções diferentes e inusitadas. O streaming abriu portas para um outro tipo de contar história que é uma delícia. E queremos deliciar os consumidores com todas as oportunidades que temos", completa. 

Diversidade como prioridade 

À frente das produções originais do Amazon Prime Video, Miranda bate bastante na tecla da diversidade. Mas, na prática, como isso é feito? "Não tem como retratar a realidade brasileira sem falar de diversidade. Não dá para não abrir portas para todos porque, afinal, o Brasil é isso, uma mistura diversificada. Queremos construir e ajudar intencionalmente isso acontecer. Em relação aos grupos sub-representados, se você não intencionalmente apoiá-los desde o início, acaba passando. E a gente continua nessa roda, que gira no automático e não se reflete em mudanças positivas", explica. 

A profissional afirma que, na Amazon, manter equipes diversas e, por consequência, produzir conteúdos diversos, é uma missão única e global. "A Jennifer Salke, head do estúdio, é uma mulher super forte e que tem um olhar e foco diversificado. Todo mundo na equipe acaba trabalhando com essa visão. Temos também uma chefe de diversidade e inclusão com quem troco frequentemente. Tudo isso acaba influenciando nosso olhar e é muito inspirador. Além disso, o fato de eu ter construído o Amazon Studios desde o primeiro dia, isto é, ter sido a primeira funcionária, começar a pensar em como a gente constrói nossa equipe, ajudou. Esse era o pensamento desde o início: ter pessoas no time de backgrounds, olhares e regiões diferentes. O conteúdo vai refletir isso", pontua. 

"A diversidade amplifica todas as possibilidades de conteúdo e, com isso, todo mundo tem a ganhar", declara Miranda. Focando especialmente no fato de a Amazon ter mulheres ocupando cargos de liderança ao redor do mundo, além de a principal posição, no topo do estúdio global, ela reflete: "Não sei se existe outro estúdio com uma gama de liderança feminina tão grande. Isso, pra mim, é um orgulho imenso. A gente tem muito o que comemorar. E eu espero que a gente possa ir estendendo a mão. Eu não poderia estar nesse lugar hoje se, desde o meu primeiro dia de estágio, eu não tivesse tido grandes mentoras mulheres. É uma coisa que eu procuro muito fazer para ajudar essa roda girar. Acredito muito em mulheres levantando outras mulheres". 

Relação com a produção independente 

Miranda garante que as possibilidades de parceria entre a Amazon e as produtoras independentes brasileira são inúmeras. "O streaming está aí para dizer que não há regras. Nesse sentido, estamos prontos para tudo", diz. "Há casos em que a gente recebe o roteiro e já enxerga nele um ponto de partida incrível. Ou então o realizador chega até nós somente com a ideia inicial. Quero apostar muito nisso, nas ideias. Por isso não tem regras", prossegue. 

Além disso, ela ressalta que há espaço para pessoas novas no mercado. "Hoje, estamos lançando séries com produtoras maiores e já bem estabelecidas, mas também estamos produzindo coisas com pessoas estreantes, que estão fazendo suas primeiras séries para o streaming. E essa mistura tem sido uma alegria para mim. Eu, particularmente, gosto de trabalhar com grupos de diferentes regIões do Brasil, com realizadores que são sub-representados e sub-utilizados no mercado. Por isso, todas as formas de produzir são muito bem-vindas", conclui. 

Calendário de lançamentos 

O Prime Video tem um amplo cronograma de lançamentos para os próximos meses. "Estamos super animados com esse calendário. É divertido estrear!", comemora Miranda. 

Lançada no último dia 26 de março, a série "5X Comédia", gravada durante a pandemia, inaugurou a safra de ficções originais da Amazon no Brasil. Sobre a produção, Miranda comenta: "Foi muito desafiador contar uma história que tem a pandemia de pano de fundo e produzir de forma totalmente remota. Tivemos atores interpretando pessoas que moram juntas mas que, na verdade, estavam cada um em um estado do país. Foi uma costura criativa e técnica e um projeto que me dá muito orgulho de ter realizado". 

Entre as próximas estreias está "DOM", que teve suas filmagens concluídas em março do ano passado, pouco antes da chegada da pandemia de Covid-19 ao Brasil. Inspirada em fatos reais, a história da série acompanha um homem chamado Victor, um agente da inteligência militar que enfrentou a guerra às drogas como missão de sua vida e, depois de muitos anos, precisa enfrentar as baixas em sua vida pessoal enquanto observa seu próprio filho, Pedro, sucumbir ao vício. Enquanto Victor observa a vida de Pedro sair dos trilhos com o vício em cocaína, ele descobre outro lado da vida do filho, que também se torna um dos criminosos mais procurados do Rio de Janeiro. A série conta com direção de Breno Silveira e é estrelada por Gabriel Leone e Flavio Tolezani. "É uma série grande, com muita figuração, coisa que a gente não conseguiria fazer no cenário da pandemia. Foi uma felicidade a gente ter terminado as gravações e poder fazer toda a pós-produção durante o período de isolamento, já que é um trabalho muito mais fácil de fazer de forma remota. Esse projeto me emociona muito. Breno Silveira é um mestre em falar de laços familiares, ele brilha muito nesse lugar. É uma união de cenas fortes e pulsantes de ação com uma história super íntima e emocionante", adianta. 

Por fim, entre as produções mais aguardadas, está "Manhãs de Setembro". A série apresenta a jornada de Cassandra (interpretada pela cantora e compositora Liniker) que, desde que deixou sua cidade natal para trás, decidiu não fazer concessões para se tornar o que sempre quis ser: uma mulher trans livre e independente. Depois de anos comendo o pão que o diabo amassou, Cassandra consegue, finalmente, alugar um espaço só seu para morar; tem um namorado que adora, Ivaldo (Thomás Aquino); e, além do trabalho de motogirl no centro da capital paulista, realiza o sonho de ser cover de Vanusa – cantora brasileira que fez sucesso nos anos 1970. Quando as coisas começam a entrar nos eixos para ela, porém, sua vida sofre uma tremenda reviravolta. Leide (Karine Teles), sua ex, reaparece com um menino, que diz ser filho de Cassandra. A nova série tem direção de Luis Pinheiro ("Samantha") e Dainara Toffoli ("Amigo de Aluguel"), ideia original de Miguel de Almeida, e traz no elenco nomes como Thomás Aquino ("Bacurau"), Karine Teles ("Que Horas Ela Volta?"), Paulo Miklos ("Califórnia"), Gustavo Coelho ("Luz do Sol"), Isa Ordoñez ("Treze Dias Longe do Sol"), Clodd Dias ("Entrega Para Jezebel") e Gero Camilo ("Bicho de Sete Cabeças"). A cantora Linn da Quebrada participa como atriz convidada. Com roteiro de Josefina Trotta ("Amigo de Aluguel"), Alice Marcone ("Born To Fashion") e Marcelo Montenegro ("Lili, a Ex"), "Manhãs de Setembro" é produzida por Andrea Barata Ribeiro e Bel Berlinck, da O2 Filmes, e estreia no Prime Video ainda este ano. 

"Todo mundo tem que assistir a essa série com uma caixa de lanços do lado", brinca Miranda. "É uma produção linda, com emoções à flor da pele, de um jeito que eu não vejo no Brasil há muito tempo. E foi uma realização primorosa, feita com todos os protocolos, em meio à pandemia. Digo que conseguimos construir um oásis", conta. "Na primeira reunião com todo o elenco, antes de começarem as filmagens, foi uma choradeira, todo mundo estava muito grato de estar lá, de poder exercer sua função. Isso tudo foi muito lindo. Essa série tem essa vibração de amor – de toda forma de amor – que esteve presente durante todas as filmagens. A gente terminou de rodar mês passado e já estamos muito felizes com o resultado. Além disso, a Liniker é uma estrela, uma força da natureza. É realmente impressionante o magnetismo que ela tem na tela. Estou muito grata por ela ter aceitado o convite e embarcado nessa com a gente", completa. 

"Preciso também agradecer aos nossos parceiros. A Viacom e a Dueto, que estiveram conosco no '5x Comédia'; a Conspiração, em 'DOM'; e a 'O2', em 'Manhãs de Setembro'. Precisamos de muita parceria para realizar tudo isso e todas essas trocas foram muito felizes", enfatiza. 

Crescimento do streaming na pandemia 

"É uma alegria ver nosso crescimento e de todos os nossos colegas do streaming porque, nesse cenário, quem ganha é o consumidor", aponta Miranda. "A gente tem visto que, durante a pandemia, existem certos tipos que são a 'comfort food' do público, o abraço que você quer no final do dia depois das suas obrigações – sejam as crianças e os adolescentes, com as aulas online, ou os adultos, trabalhando o dia inteiro. Todo mundo quer um descanso. Isso acaba apontando um tipo de conteúdo muito específico também. De celebração, alegria, conforto. Continuamos fazendo conteúdos inovadores e que nos fazem pensar – isso sempre vamos fazer – mas eu acho que também estamos olhando muito para esse tipo de conteúdo que celebra o que é ser humano, viver em comunidade". 

Apesar do crescimento do streaming, é claro que o período da pandemia foi e tem sido bem duro para o mercado como um todo. "Em fevereiro e março do ano passado, a gente estava começando a lançar nossos primeiros conteúdos, que eram de não-ficção, porque é o que sai mais rápido do forno, e acabamos atrasando o lançamento de nossos primeiros conteúdos de ficção. Eu venho da produção, então isso ajudou para que a gente começasse a entender o que conseguiríamos fazer dentro do cenário pandêmico – e conseguimos encontrar algumas maneiras", conta. "De fato, esses momentos adversos acabam exigindo mais inovação da gente, então tivemos que pensar fora da caixinha para conseguir realizar nossas filmagens. Tivemos muita mudança de cronograma e foi um desafio para todo mundo, em todos os países". 

No entanto, Miranda elogia a união do setor durante o período: "Foi bacana ver vários colegas nossos abrindo fundos, nós mesmos abrimos o nosso. Fazer essa troca com os nossos parceiros de produção é essencial. É fundamental mostrarmos como somos gratos a eles e que enxergamos que a indústria está passando por muitas dificuldades nesse momento tão desafiador. Eu vi muitos movimentos de ajuda dentro do setor – desde grupos pequenos até grandes – e acho que temos muito o que nos orgulhar nesse sentido. Entre nós, fomos muito parceiros". 

Com essa entrevista, TELA VIVA encerra o especial Mês da Mulher, no qual homenageamos personalidades femininas de destaque no cenário audiovisual nacional. Confira no site as entrevistas anteriores.

1 COMENTÁRIO

  1. Um alento esse artigo. Os dias difíceis viraram meses, estamos há um ano metidos nesse terror pandêmico e, nesse Armagedom. Eu decidi manter a rota, o foco na criação e os outros pratinhos em equilíbrio.

    Tenho amigos que trabalharam no projeto "Manhãs de Setembro", vi essa vibração neles, no trailer, e desmaiei de inveja.

    Que bom ouvir e perceber esse teor na fala da Malu Miranda, deu esperança e água nos olhos.

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