Para canais pagos, linha do digital na publicidade já foi cruzada

Discovery, Globosat e Snack discutem publicidade no PAYTV Forum

No segundo dia do PAYTV Forum 2019, evento organizado pelas publicações TELETIME e TELA VIVA, o debate sobre publicidade em TV paga mostrou que hoje a fronteira entre a plataforma tradicional e o digital já deixou de fazer sentido para as programadoras. Para Guido Sarti, head de convergência da Globosat, o termo "digital" está ultrapassado: "O digital já é natural para o consumidor, não existe mais essa linha de divisão. Se você existe, se você está no mercado, você é digital. Não é uma escolha.". Para ele, o segredo para resolver essa equação no que diz respeito aos anunciantes é ver cada oportunidade – programa no linear, canal no YouTube, evento ao vivo – como se fosse um mercado individual, oferecendo aos anunciantes entregas a qualquer momento e para suprir qualquer necessidade.

Roberto (Naná) Nascimento, vice-presidente de publicidade da Discovery, concorda: "Se hoje a atitude das pessoas é mais fluida, não podemos restringir nossa capacidade de pensar conteúdos em uma única plataforma, e isso vale também para as entregas comerciais. Mas não dá para fazer isso se não tivermos direitos sobre o nosso conteúdo. Falando no lado comercial, isso é fundamental para pensarmos em planejamentos e projetos de forma integrada. E apesar disso, vale ressaltar que o excesso de ofertas e de oportunidades gera um grande risco, que é o da desconexão. Se a gente não se conectar com a essência das pessoas e gerar valor efetivo, vamos perder o engajamento. Precisamos que as pessoas se apaixonem pelo que estamos contando, e isso inclui a publicidade.".

Mas os anunciantes também perceberam o valor de ir direto às plataformas digitais e estão seguindo este caminho, inclusive com produção própria de conteúdo. A agência de social vídeo Snack tem focado sua atuação neste modelo, em que o conteúdo é desenvolvido a partir de uma linha editorial que dialogue com a marca patrocinadora. Produzindo atualmente 200 vídeos por mês, gerenciando 25 canais originais e de marcas e somando cerca de 100 milhões de views mensais, a Snack trabalha com o que define como "conteúdo da nova geração", ou seja, criação, produção e direção de canais de YouTube, programas de IGTV, projetos de Facebook entre outros. "Nossa principal missão é fazer a marca pensar e agir como um creator na era do skip ad.", traduz Nelson Botega Jr, sócio da agência. Entre os clientes com os quais eles trabalham estão a Pampili, que já é detentora do maior canal de marca da América Latina, o "Mundo de Menina", e que já fez 180 milhões de dólares só no YouTube nos últimos cinco anos, monetizando e pagando, assim, sua produção; O Boticário; Magazine Luiza; Ri Happy; Malwee e; o case mais recente, Guaraná Antarctica, para quem eles desenvolveram o canal do Youtube "Coisa Nossa". "Esse canal é um exemplo de como as marcas estão basicamente virando TV e criando sua própria programação.", explica.

Princípios

Com base na sua experiência na Snack, Botega revela tópicos importantes para se ter em mente ao criar especificamente para o meio digital. O primeiro deles é a definição da linha editorial – como era feito antigamente no processo de criação de revistas – que deve ser bastante específica a fim de atrair uma comunidade em torno daquele canal, e não uma audiência qualquer. "O YouTube é muito focado nessa linha de social video de nicho. Primeiro, define-se qual será o nicho para, a partir daí, começar a criar conteúdo. O público tem que entender de cara o que vai encontrar ali.", afirma. Ele reforça ainda que cada meio tem seu gênero – enquanto as comédias românticas e os filmes de terror ganharam os cinemas, por exemplo, os programas de auditório e o reality show ganharam a TV. Por isso, ao se produzir para YouTube, deve-se respeitar os gêneros que nasceram na plataforma como vlogs, listas, tutoriais, tags, entre outros. Por fim, está a questão dos resultados. "Hoje, a taxa de influência é o que analisamos. Isso vai além de dados de alcance ou engajamento e é muito diferente da métrica de audiência tradicional.", pontua.

A criação para o YouTube é uma realidade dentro das programadoras de TV. "Quase todo o conteúdo Globosat está disponível online. É um material altamente monetizável para o nosso lado e um espaço de construção de conteúdo para marcas e parceiros.", diz Sarti. "Fazemos um controle pesado em cima do que temos nesse ambiente online. Do mesmo jeito que fazemos na TV, também zelamos pelos nossos canais digitais. Eles podem ser menos rentáveis, mas o cuidado é o mesmo", garante. Como bem pontuado por Sarti, a escala de valor é diferente dependendo do ambiente, especialmente nessa comparação entre ações pontuais no digital e publicidade tradicional na pay TV. Diante dessa questão, Naná, da Discovery, analisa: "Temos discussões constantes acerca da utilidade e valor de cada coisa que criamos. Não podemos nos acomodar nos modelos de negócio que já funcionam, e sim entender o valor e a importância de cada um. O pecado está em achar que o volume de resultados de novos negócios é irrelevante diante do que fazemos de principal. Quem aposta nisso, fica pra trás.".

Marcas além da plataforma

Nesse caminho de investimento em novos negócios comerciais, a Discovery tem desenvolvido experiências variadas. "Queremos trabalhar com a força das nossas marcas e fazer com que elas ganhem vida para além das plataformas, com licenciamento, encontros, shows. Hoje, pensamos em eventos em cima das propriedades que construímos, como o 'Dino Experience', que já está indo para o seu terceiro ano, e a vinda dos 'Irmãos à Obra' para o Brasil agora no segundo semestre. Por meio de ações assim, geramos engajamento e alcance para trazer mais gente para consumir o produto na TV. É uma mudança de posicionamento e postura comercial.", declara o executivo. "O pensamento comercial não pode seguir de forma binária, tem que acompanhar o conteúdo, que está cada vez mais fluido.", completa.

Em relação aos formatos comerciais, Naná explica que o grupo saiu de uma posição que acreditava que o branded content era o diferencial da pay TV. "Ele segue sendo relevante, mas sozinho não basta. O que a gente vem fazendo nos últimos dois anos é buscar novas oportunidades olhando para o negócio da TV por assinatura, de forma a gerar eficiência, alcance adequado e mudando inclusive os formatos de entrega de métrica, nos aproximando da mensuração das plataformas digitais.", adianta. Sobre essa análise de resultados, Nelson Botega comenta: "Já houve uma disrupção em torno de quem analisa esses dados. Na Snack, criamos videomakers que se especializam em data. O editor tem que saber sobre análise de audiência e interpretar todos os dados possíveis. Não é sobre ter os dados, e sim saber o que fazer com eles e o que eles significam.".

Inserções on-demand

O executivo da Discovery contou ainda que os canais vêm testando, em parceria com o Now, da Net, a possibilidade de inserção de comerciais em plataformas de VoD, e os resultados têm sido positivos. "Precisamos entender o quanto o comercial interfere no conteúdo nesse sentido. Preservar nossa linha editorial ainda é uma premissa. Nada acontece no comercial se o editorial não estiver de acordo. Senão, vira publicidade sem valor nem sentido. Temos a preocupação de não ser uma mídia invasiva e, por isso, acredito que todos tenham que criar juntos: operadores, programadoras e anunciantes. O meio da pay TV sempre trabalhou com base nas informações vindas dos institutos de pesquisa. Agora, temos que nos debruçar em cima disso, entendendo o comportamento do consumidor minuto a minuto.", pontua. Naná afirma: "O principal aprendizado tem sido revisitar o que aprendemos sem nenhum tipo de trava, e aprender como se relacionar com as marcas dando transparência, alinhando expectativas de resultado e formatos de mensuração.". E ele reflete: É normal que marcas venham nos procurar com conteúdos que poderiam ser conteúdos originais dos nossos canais. É uma prática que veio para ficar. Teremos mente aberta para isso, mas sem corromper nosso negócio. É um limite tênue.".

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