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A TV por Assinatura não morreu e tem muito a ensinar ao streaming!

(Foto: Pexels)

A TV por assinatura não morreu; pelo contrário, está se transformando. Seu papel na curadoria de conteúdos que refletem a riqueza sociocultural do Brasil é essencial para dar visibilidade às narrativas conhecidas como “diversos Brasis”. Com uma programação que inclui curtas, médias, longas, séries de ficção, documentários e animação, a televisão atende a todas as faixas etárias e acolhe propostas de produtores de diferentes níveis e perfis. Essa abordagem deve ser adaptada e replicada no ambiente de streaming, garantindo que as ricas histórias e vozes brasileiras continuem a ser ouvidas e reconhecidas.

Para impulsionar essa transição, estão sendo realizadas conversas entre a ANCINE, os Canais Brasileiros de Espaço Qualificado (CABEQ) Superbrasileiros — que veiculam pelo menos 12 horas diárias de conteúdo audiovisual brasileiro produzido por produtoras independentes — e alguns produtores, como Alfredo Manevy e Vanessa de Araújo Souza. Esses profissionais reconhecem a importância dos Superbrasileiros não apenas na seleção de projetos, mas também no suporte ao desenvolvimento e na visibilidade das obras produzidas.

A TV por assinatura, ao contrário do que alguns afirmam, possui uma audiência significativa. De acordo com o artigo Carta Aberta ao Conselho Superior de Cinema e ao Comitê Gestor do FSA em defesa do Prodav, a Claro, maior operadora de TV por assinatura do Brasil, que atende a mais de cinco milhões de lares, divulgou dados sobre o tempo total assistido mensalmente por seus clientes em um seleto grupo de canais de programação com foco cultural. Esses canais incluem TV Cultura, Canal Brasil, Canal Curta!, Arte1, Canal Futura, Prime Box e TV Ratimbum, e, juntos, acumulam uma audiência média mensal de 345.392.007 minutos apenas na operadora, que representa quase metade do mercado de TV por assinatura no Brasil. Para fins de comparação, ao dividir essa audiência total mensal em blocos de 90 minutos — o tempo médio de uma sessão de Cinema — obtemos uma equivalência de 3.837.689 espectadores mensais. Projetando esse número para um ano, resulta em mais de 46 milhões de espectadores. Além disso, a televisão pode ser assistida de forma coletiva, então, se projetarmos uma média de 1,8 espectadores por lar, o total eleva-se significativamente.

Por outro lado, de acordo com informações do Observatório do Audiovisual da Ancine (OCA), em 2023 — ano considerado difícil para o cinema — foram vendidos apenas 3,71 milhões de ingressos para filmes brasileiros. Em 2024, o cenário mostra-se mais otimista com a venda de 7,07 milhões de ingressos nos primeiros seis meses. Se essa tendência continuar, é possível projetar que o total chegue a cerca de 15 milhões de espectadores até o final do ano. Ainda assim, fica evidente que os canais de TV com programação cultural alcançam um público maior em relação ao número de ingressos vendidos para o cinema nacional.

Isso se deve, principalmente, à limitada disponibilidade de espaços para exibição cinematográfica no Brasil, que conta com apenas 3.468 salas para 5.570 municípios. De acordo com o IBGE, quase 40% da população vive em localidades sem salas de cinema. Levando em consideração esse cenário, a TV desempenha um papel ainda mais importante, já que, por meio dela, 97% dos lares brasileiros possuem sua própria “sala de exibição”. Destes, segundo dados de 2023, 11,7 milhões são assinantes de TV paga e possuem à sua disposição 94 canais ativos, dos quais 34 brasileiros de espaço qualificado. Entre janeiro e dezembro de 2023, esse segmento exibiu 5.608 títulos brasileiros distintos, com a produção independente ocupando, em média, 12,10% do tempo de tela. Nos CABEQs Superbrasileiros, 74,9% do horário nobre foi composto por obras brasileiras independentes, superando a exigência legal de 50%.

Em paralelo, mesmo onde as salas estão disponíveis, a presença de produções brasileiras é limitada, resultando em 3.701.853 espectadores para filmes nacionais, o que representa apenas 3,25% do público total. Em relação a oferta de conteúdos, em 2023, foram lançados 161 títulos brasileiros em Cinema, mas apenas 27 alcançaram mais de 10 mil espectadores. Surpreendentemente, 89 desses filmes, o que equivale a mais da metade, obtiveram receita inferior a 15 mil reais, valor mínimo exigido para a licença do PRODAV para canais de TV. Os dados também apontam para uma escassa quantidade de documentários lançados no mesmo ano: apenas 57, dos quais somente 17 conseguiram atrair mais de mil espectadores. Em contraste, a televisão veiculou 634 conteúdos distintos, incluindo 153 documentários.

Vale acrescentar que a TV por assinatura também desempenha um papel crucial na formação de uma cadeia produtiva robusta, em que muitos conteúdos de longa-metragem, inicialmente criados para a televisão, ganham destaque nas telas do cinema em festivais nacionais e internacionais. Um exemplo recente é o documentário “Lupicínio Rodrigues – Confissões de um Sofredor”, de Alfredo Manevy, que fez carreira em festivais antes de ser exibido no canal Curta!, recebendo diversos prêmios e menções honrosas. Essa trajetória proporciona reconhecimento e visibilidade, promove a diversidade cultural e permite que as produções brasileiras sejam apreciadas em um cenário global. 

De forma complementar, outras obras são exibidas em seus canais de origem e, posteriormente, circulam em diversos meios, incluindo plataformas de streaming, em um modelo de cauda longa. Assim, a programação da TV por assinatura não apenas alcança uma audiência significativa, mas também alimenta um ecossistema mais amplo, assegurando que as histórias e vozes brasileiras sejam disseminadas de maneira eficaz.

No artigo “Os Diversos Brasis na TV: A Importância do PRODAV na Representação Cultural Brasileira”,  produtores defenderam a necessidade de equilibrar a distribuição dos recursos de produção, assegurando uma alocação equitativa no Fundo Setorial do Audiovisual (FSA) entre os setores televisivo (PRODAV) e Cinematográfico (PRODECINE). Aqui, trazemos propostas complementares que têm como objetivo apoiar o desenvolvimento da cadeia do audiovisual como um todo, partindo da premissa de que é igualmente importante a qualidade do conteúdo e a existência de espaços de exibição adequados, que permitam alcançar o público-alvo. Isso significa que é necessário apoiar o desenvolvimento de produtoras de diferentes localidades e níveis, assim como construir mais salas de cinema e incentivar a TV e as plataformas de VOD brasileiras independentes, que AINDA representam os principais meios de circulação das obras com o nosso DNA.

Nesse sentido, reconhecendo a importância dos canais Superbrasileiros e a crise financeira que enfrentam, uma medida importante seria incluir uma linha dentro do PROINFRA, que possui R$ 400 milhões previstos no Plano Anual de Investimentos (PAI) 2024, para revitalizar esses canais e fortalecer suas plataformas de vídeo sob demanda (streaming). Existe, inclusive, uma carta escrita pelos diretores do Canal Brasil, Canal Curta!, CinebrasilTV e Primebox remetida ao Conselho Superior de Cinema e ao Comitê Gestor do FSA, que inclui outras reivindicações, entre as quais destacamos abaixo as consideradas mais relevantes:

I – Chamadas para TV em Fluxo Contínuo

O modelo de concursos da Ancine onera a agência, gera insegurança no mercado e inflaciona os preços. Os exibidores necessitam de clareza e planejamento nos programas de investimento público. A estratégia atual de concursos recorrentes desperdiça recursos e pressiona a Ancine. Propõe-se um sistema de fluxo contínuo, que proporcionaria mais previsibilidade e segurança, evitando a repetição de análises documentais e equilibrando a pressão inflacionária.

II – Edital TV/VOD módulo Programadoras

Para o edital via Programadoras, os canais Superbrasileiros sugerem que os recursos sejam alocados de duas maneiras:

  • Primeiramente, viabilizando pré-licenças de obras audiovisuais cujas primeiras exibições comerciais sejam no segmento de TV paga e/ou VOD, a preço fixo da pré-licença como ocorre hoje; ou por pré-licenças para canais de TV pagas ao FSA com parte do espaço de veiculação de publicidade do canal; e/ou de forma alternativa, de acordo com a receita de publicidade obtida no horário de veiculação da obra, uma opção a ser aceita e negociada entre a empresa produtora e o canal, com anuência do FSA. Já as licenças de conteúdos em segunda janela para plataformas OTT poderiam ser pagas por divisão de receitas de assinaturas e/ou publicidade. 
  • Em segundo lugar, viabilizando longas-metragens cujas primeiras exibições comerciais sejam em salas de Cinema e as segundas janelas de exibição pública sejam no segmento de TV paga ou no de VOD de programadoras brasileiras. Nessa frente, propõe-se que até 80% do valor das licenças possa ser pago em espaços comerciais dos canais. Essa mídia/publicidade seria utilizada para o lançamento desses filmes em salas de cinema, potencializando o alcance comercial das obras e, consequentemente, a expectativa de receita do Fundo Setorial.

III – Suporte Financeiro Automático (SUAT)

Os Superbrasileiros também pedem o retorno do Suporte Automático (SUAT), que vigorou até 2018 através do PRODAV 06, com dotações orçamentárias do FSA para distribuição entre Programadoras conforme o volume de licenças pagas. As solicitações adicionais incluem:

  • Funcionamento do SUAT com recursos anuais em fluxo contínuo e calendário certo, garantindo previsibilidade e continuidade;
  • Distribuição de créditos baseada em dois critérios: investimento em licenças ou número de assinantes do canal, considerando um multiplicador para investimentos dos últimos três anos;
  • Permissão para viabilizar longas-metragens com primeiras exibições em Cinemas e segundas janelas na TV paga ou VOD, com até 80% do valor das pré-licenças pago em espaços de mídia/publicidade;
  • Investimento de até 35% dos créditos SUAT em itens de operação dos canais, como infraestrutura e tecnologia, com contrapartida de 35% da receita líquida de publicidade repassada ao FSA.

Os Superbrasileiros solicitaram, ainda, um reajuste no teto de orçamento por obra, permitindo que cada canal defina o limite de investimento conforme suas necessidades, com um aumento sugerido de R$ 5 milhões para R$ 10 milhões por projeto. A redução da taxa de cálculo das pré-licenças de 15% para 10%, assim como a manutenção ou ampliação dos seus descontos para 80%, e a isenção de taxas adicionais para a inclusão do segmento de VOD nos contratos. Além disso, considerando que as obras produzidas para TV/VOD podem ampliar seu alcance junto aos assinantes, sugere-se a criação de uma modalidade de investimento na promoção e divulgação dos projetos contemplados nas Chamadas Públicas, nos mesmos moldes dos utilizados pelas distribuidoras voltadas às salas de cinema.

Em adição a essa proposta, e pensando em estimular a participação de mais canais brasileiros no benefício indireto do PRODAV, a fim de multiplicar os recortes de curadoria e formatos dos projetos em concorrência, apresentamos algumas questões a seguir. Entendemos que os produtores precisam ter mais opções de espaço para ofertar seus conteúdos, portanto, sugerimos a revisão do “Regulamento de Pontuação: Cinema e TV”. A proposta é de atribuir pontuações extras nas chamadas a serem abertas, destinadas a canais que comprovadamente exibam conteúdos acima do mínimo legal exigido por sua classificação. Isso seria feito utilizando relatórios mensais enviados à ANCINE e vinculados aos CRTs. 

Ainda pensando no aumento do mercado de venda de licenças de obras audiovisuais, um ponto importante é a regulamentação dos serviços de streaming. Com mais de 40 milhões de assinaturas em 2023, o Brasil é o quarto maior mercado de streaming do mundo, demonstrando um enorme potencial de crescimento. Porém, ao contrário das indústrias de TV e cinema (via CONDECINE), as plataformas de streaming ainda não contribuem como financiamento da indústria audiovisual. Esse fato impede o acesso aos recursos do FSA, uma vez que não é justo usufruir de benefícios sem contribuir para sua manutenção. 

Nesse sentido, é interessante retomarmos a experiência da regulamentação do mercado de TV Paga, que, com a Lei nº 12.485, exemplifica como políticas legislativas podem fortalecer o setor audiovisual. Essa lei não apenas introduziu cotas para a exibição de conteúdo nacional, mas também aumentou significativamente a arrecadação do FSA, que passou de R$ 225 milhões em 2011 para R$ 1,2 bilhões em 2023. Agora, existe uma grande expectativa em torno da implementação da CONDECINE VoD, que promete transformar o mercado de streaming de maneira ainda mais profunda. A premissa é simples: as plataformas de streaming devem contribuir para o desenvolvimento do setor e, em troca, poderiam acessar os recursos dos editais do FSA como beneficiárias indiretas de suas produções. É claro que com valores de licenciamento das obras ajustados ao porte das empresas licenciantes e preservando a propriedade intelectual com o produtor independente.

Um outro ponto crucial que acrescenta a essa discussão, e que ainda é pouco falado, é o fato da TV por assinatura, em especial com os canais culturais citados no início do artigo, ter se consolidado como pilar na curadoria de conteúdos que retratam a diversidade sociocultural brasileira, constituindo-se, portanto, como um modelo valioso para o streaming. Por isso, consideramos tão importante que agentes como os canais Superbrasileiros encontrem espaço nesse segmento, mantendo sua identidade e curadoria, mas adaptando suas formas de distribuição. Além disso, o incentivo a plataformas de nicho, como as representadas pelo Fórum dos Streamings Independentes do Brasil, contribuirá para diversificar a oferta de conteúdo e garantir que as vozes e histórias nacionais continuem a alcançar seu público no ambiente digital. 

Esperamos ter esclarecido o porquê, mesmo diante das transformações do mercado, a TV por Assinatura não morreu. Na realidade, ela apenas mudou a forma como chega ao espectador, mas permanece vital e relevante para a cultura nacional. Precisamos do apoio do ecossistema audiovisual e da implementação de políticas públicas eficazes para permitir que produtores de norte a sul do Brasil contem suas histórias e sejam assistidos, também de ponta a ponta, seja nos festivais, em salas de cinema, na TV e no Streaming.

2 COMENTÁRIOS

  1. O cara que esvreveu isso aqui nao tem compromisso algum com a verdade. Esta apenas tentando ganhar dinheiro fácil dos pagadores de impostos (olhe a conversa mole dele, parece panfleto do pissol).

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