A Lupa Filmes é uma produtora carioca voltada para histórias originais e que transita entre diversos gêneros cinematográficos. Em 2013, lançou a comédia romântica “Mato Sem Cachorro”, seu primeiro longa-metragem, atingindo mais de um milhão de espectadores nos cinemas, e recebeu três indicações ao Grande Prêmio do Cinema Brasileiro (hoje chamado de Prêmio Grande Otelo). Este ano, ela lança a comédia dramática “A Vilã das Nove”, dirigida por Teodoro Poppovic, com estreia no Festival do Rio, e que entrou em cartaz nos cinemas nesta última quinta-feira, dia 31 de outubro, com distribuição da Disney, e o longa de terror “Abraço de Mãe”, dirigido pelo argentino Cristian Ponce. O filme foi selecionado para festivais de cinema como o Sitges Beyond Fest, em Los Angeles – o mais importante evento para filmes de gênero -, e o Festival do Rio, e estreou na Netflix em 23 de outubro. Todos os projetos foram criados pelo produtor e roteirista André Pereira e a produtora Mariana Muniz, que são sócios na produtora.
“A Vilã das Nove” apresenta Roberta (Karine Teles), que está na melhor fase de sua vida. Recentemente divorciada, ela vive com sua filha Nara em uma liberdade que ela não sente há muito tempo, até descobrir que alguém transformou seu maior segredo no enredo de uma novela – onde ela é a vilã. O elenco conta ainda com Alice Wegmann, Camila Márdila, Laura Pessoa, Negro Leo e Antônio Pitanga e o filme é uma produção da Lupa em coprodução com a Star Original Productions. Os roteiros são assinados por Teodoro Poppovic, André Pereira, Maíra Bühler e Gabriela Capello e Poppovic assina a direção.
Já em “Abraço de Mãe”, em fevereiro de 1996, durante um dos temporais mais impiedosos que atingiu a cidade do Rio de Janeiro, uma equipe dos bombeiros recebe um chamado para evacuar um asilo com risco de desabamento. Ana (Marjorie Estiano), uma jovem bombeira afastada após sofrer um ataque de pânico em uma operação, se vê retornando à sua antiga equipe de resgate. Ao chegarem ao local, os bombeiros descobrem que os misteriosos moradores do asilo têm outros planos com a chegada da chuva. Ana terá que enfrentar seu próprio passado para sobreviver e salvar os outros antes que seja tarde demais. O elenco traz também nomes como Chandelly Braz, Javier Drolas, Reynaldo Machado e Val Perré. Os roteiros são de André Pereira, Gabriela Capello e Cristian Ponce, que também assina a direção.
Ambos os títulos passaram por grandes festivais, como o Festival do Rio, antes de chegaram ao grande público. Para o produtor e roteirista André Pereira, a estreia nesses eventos foi uma vitrine fundamental para os lançamentos, validando a trajetória desses projetos e ampliando sua visibilidade. “Neste momento em que estamos trabalhando para reconquistar o público dos filmes brasileiros, o circuito de festivais tem sido essencial para impulsionar o interesse por nossas produções”, comentou Pereira em entrevista exclusiva para TELA VIVA. Falando de “Abraço de Mãe”, ele destacou o Festival de Sitges, importante para o cinema fantástico, e o Beyond Fest, de LA, promovido pela Cinemateca Americana. “Essa exposição posicionou o filme como um representante do terror brasileiro com potencial internacional”, apontou. Já o lançamento de “A Vilã das Nove” no Festival do Rio e na Mostra de São Paulo reforçou a proposta do filme de equilibrar apelo comercial e valor artístico, gerando expectativa para a estreia nos cinemas, segundo o produtor.
A produtora Mariana Muniz completa: “Com a velocidade da informação e a dificuldade de atrair a atenção do espectador diante da concorrência de oferta de entretenimento, a ideia de estrear nos festivais e conseguir lançar comercialmente é crucial para atrair o público às salas de cinema. Os festivais no Brasil são marcos do nosso calendário cultural e têm um papel cada vez mais importante na formação de público e na promoção da experiência coletiva da sala de cinema. Essa estratégia permite que o filme já chegue aos cinemas com uma base de interesse criada pelas exibições e pela repercussão nesses eventos”.
Estreia simultânea, estratégias diferentes
As produções estrearam praticamente juntas – uma no streaming e a outra no cinema. Para Pereira, as janelas de exibição, apesar de serem diferentes, podem estimular o público a transitar entre elas. “Os filmes foram desenvolvidos com modelos de distribuição distintos, alinhados com o perfil de cada projeto”, ressaltou. “Abraço de Mãe” foi direto para o streaming após passar por festivais – o que faz parte de uma estratégia de formação de público para um gênero ainda pouco explorado no cinema brasileiro, segundo contou o produtor. “Nossa experiência anterior com ‘O Rastro’ (2017), que chegou a bater recordes de público para um filme nacional de terror na Retomada, mostrou que ainda precisamos superar a resistência de um público que consome muito o gênero em filmes estrangeiros, mas ainda não está tão familiarizado com as nossas produções nacionais”. Muniz enfatizou que o lançamento simultâneo na América Latina pela Netflix permite que a obra alcance espectadores que passam a apostar em um terror brasileiro. “A repercussão nas redes sociais tem sido incrível, com vídeos e discussões sobre as interpretações do filme, o que reforça a construção de um público para o gênero no Brasil”, celebrou.
Sobre “A Vilã das Nove”, a produtora observou: “Com distribuição da Disney nos cinemas, ele combina comédia e drama – gêneros que funcionam muito bem para a experiência coletiva na sala de cinema. As sessões no Festival do Rio e na Mostra de São Paulo foram maravilhosas, com salas lotadas e uma recepção muito legal do público”. Muniz ainda destacou que ambos os filmes representam o que a Lupa Filmes mais busca: abordar questões complexas por meio de gêneros cinematográficos distintos e aliar entretenimento com ousadia narrativa. “Enquanto ‘Abraço de Mãe’ instiga o público com o suspense e mistério do terror, ‘A Vilã das Nove’ provoca reflexão ao abordar temas universais e brinca com a linguagem popular das novelas”, analisou.
Não é tão comum que uma produtora lance dois grandes projetos de longas-metragens tão próximos um do outro – mas essa “estreia dupla” aconteceu por acaso. O percurso de “A Vilã das Nove” pelos festivais, passando pelo Festival do Rio e pela Mostra de São Paulo, seguido pelo lançamento nas salas de cinemas, foi pensado para atrair esse público adulto para um filme que equilibra entretenimento e reflexão. Por outro lado, o lançamento de “Abraço de Mãe” foi pensado no streaming como um representante do terror brasileiro na temporada de Halloween. “Embora essa seja uma festa americana, o mês de outubro tem ganhado cada vez mais relevância mundial para lançamentos de filmes de terror. Assim, a estreia no streaming permite que o filme alcance um público interessado no gênero, ampliando seu alcance na América Latina”, revelou Pereira. Para Muniz, a “estreia dupla” fortalece a identidade da Lupa como uma produtora que explora gêneros cinematográficos diversos e acredita em expandir o alcance do que as pessoas esperam do cinema nacional.
Animação em coprodução com a França
Em paralelo, a Lupa já trabalha em outros projetos. Um deles, “O Reino dos Pássaros”, é uma animação em coprodução com a França. “É nosso primeiro projeto de animação e marca a estreia em longas do Wesley Rodrigues, um dos animadores mais premiados do país. Estamos desenvolvendo este filme com muito cuidado há alguns anos e, mesmo ainda na fase de desenvolvimento, já estamos muito orgulhosos da repercussão que ele teve nos mercados internacionais”, disse o produtor. Ele contou que o projeto tem cumprido um caminho de residências de animação – o filme foi, por exemplo, o primeiro brasileiro na NEF, uma residência artística tradicional na França, e o primeiro projeto sul-americano selecionado para a Residência de Annecy, o maior festival de animação do mundo.
Mariana Muniz também comemora o momento: “Sempre sonhamos com a possibilidade de criar esse filme com alcance internacional, então buscar a coprodução foi um passo natural. A aproximação com a Sacrebleu, uma das produtoras francesas de animação mais premiadas, foi uma combinação perfeita. Admiramos muito o trabalho deles. E é fantástico ver ‘O Reino dos Pássaros’ já nascer com uma dimensão internacional porque isso amplia as possibilidades do projeto. Mas sabemos que fazer animação no Brasil e coordenar uma coprodução traz muitos desafios e exige cuidado”.
Nesse sentido, Pereira salientou que o tempo da animação é outro. Atualmente, “O Reino dos Pássaros” está em fase de financiamento – tanto no Brasil quanto na França. “É um projeto lindo e muito especial, que demanda uma estrutura de produção complexa. Ao longo dos últimos anos, construímos uma base sólida com um desenvolvimento cuidadoso, o que tem sido fundamental para chegarmos a essa etapa. O apoio dos mercados internacionais, especialmente do Festival de Annecy, nos dão confiança de que estamos no caminho certo para iniciar a produção em breve”, avaliou.
Novo projeto de cinema fantástico
Ainda entre os próximos planos, está mais um projeto de cinema fantástico, após “Abraço de Mãe”: é “Carniça”, uma adaptação do quadrinho do brasileiro Shiko. “A ideia de fazer um filme de gênero com base em uma história de vingança feminina é algo muito especial pra gente. Desde então, temos desenvolvido esse projeto com a Renata Pinheiro, uma das nossas diretoras prediletas, com uma voz que dialoga com o realismo fantástico latino-americano”, adiantou Muniz.
A Lupa apresentou o projeto nos principais mercados de cinema fantástico da Ásia (BIFAN), América Latina (Ventana Sur) e Europa (Sitges) e, agora, a equipe se diz empolgada para enfrentar os desafios de produção desse roteiro.
“O projeto envolve grandes cenas de ação e o trabalho com uma criatura, o que eleva ainda mais a complexidade em relação a ‘Abraço de Mãe’. Além disso, a produção será realizada no sertão, o que traz outros desafios. Para nós, enfrentar esses desafios começa sempre com um planejamento detalhado. Como produtores criativos, nosso processo é fundamentado na criação entre roteiro e desenho de produção, permitindo que ambos sejam desenvolvidos em conjunto. Essa abordagem nos permite planejar e pensar nas melhores ferramentas para criar filmes que buscam a inovação e nos desafiam. Essa é a essência da Lupa, com a nossa vontade de explorar gêneros no cinema, e desafiar convenções”, concluiu Pereira.