Anatel se alinha às teles e defende tráfego gratuito na regulamentação da neutralidade

Um tema que certamente será alvo de grande debate no processo de regulamentação da neutralidade de rede será o acesso gratuito a determinadas aplicações da Internet. Embora a lei do Marco Civil da Internet imponha o tratamento de forma isonômica a todos os pacotes de dados, sem distinção por conteúdo, origem, destino, terminal ou aplicação, as operadoras acreditam que o acesso gratuito não está proibido.

O diretor do SindiTelebrasil, Alexsander Castro, explicou que no acesso gratuito a determinada aplicação, o pacote de dados recebe o mesmo tratamento que os demais, portanto, no entender das teles a neutralidade está preservada. "A única diferença é que o usuário não vai ser cobrado por isso, mas o pacote dele vai ter o mesmo tratamento que os outros. É uma questão comercial, mas que não fere a neutralidade de rede".

Outro argumento do sindicato é que o acesso gratuito ao Facebook, como é praticado hoje pelas teles móveis, é oferecido àqueles usuários que não têm planos de dados. Se eles não estão na Internet, não há que se falar em discriminação de tráfego.

O conselheiro Rodrigo Zerbone tem posição alinhada com as teles. Segundo ele, uma única operadora tem 14 milhões de clientes que se beneficiam com o acesso gratuito ao Facebook. "A gente tem que pensar o papel que as redes sociais têm na sociedade brasileira, tanto de inclusão digital quanto também o poder de mobilização dessas classes mais baixas. Quando a gente fala de retirar as redes sociais de 14 milhões de usuários, é obvio que pelo nível de renda a grande maioria dos usuários perderia acesso pelo telefone móvel", argumenta ele. "A pergunta é: que impacto teria impedir que a prestadora faça esse tipo de prática? Qual o benefício objetivo, porque o prejuízo objetivo acho que está muito claro", provocou ele.

Sua pergunta foi respondida pelo co-gestor do Centro de Sociedade e Tecnologia da FGV, Luiz Moncau. Para ele, permitir o acesso gratuito ao Facebook prejudica a inovação na Internet na medida em que se cria uma barreira de entrada e de desenvolvimento a novas aplicações disruptivas que possam ter o poder de desbancar o gigante das redes sociais.

"Às vezes a pergunta não é sobre o benefício do consumidor, mas, sim, para a economia, para a inovação; é mais amplo. E até para o consumidor, porque uma das políticas é preservar a liberdade de escolha do consumidor. No curto prazo, elas podem até ser benéficas, mas no longo prazo vai ser pior", diz ele.

O conselheiro Rodrigo Zerbone, contudo, não vê como um benefício a uma parcela pequena de usuários possa prejudicar a inovação. Para ele, esse controle deve ser feito pela autoridade antitruste, a posteriori, analisando os casos concretos.

"Mesmo que todas fizessem, é praticamente impossível que a autoridade antitruste ache que isso ia fechar o mercado de aplicações de redes sociais. É uma parcela pequena que não tem acesso, não tem poder de fechar o mercado, de diminuir a inovação. Eu entendo que, ao contrário, em alguns casos pode aumentar o bem estar do consumidor sem gerar qualquer tipo de fechamento do mercado. Lembrando que quando a gente generaliza a gente impede que aplicações do governo possam ser prestadas de forma gratuita", afirma.

Outros serviços

Outros temas que serão alvo de debate no processo de regulamentação da lei são os serviços fechados, como os serviços de vídeo on demand prestados pelo protocolo IP. Essa questão foi colocada pelo conselheiro Zerbone. Para ele não está claro se a neutralidade de rede se aplica aos serviços que são prestados dentro da rede da prestadora, mas que não estão abertos aos usuários em geral.

Alexsander Castro acrescentou ainda a questão dos serviços com QoS – Quality of Service – que precisam ser regulamentados, como teleconferência, telemedicina, VoIP etc. "Muitas aplicações precisam desses parâmetros, mas isso não quer dizer que eu vou oferecer acesso degradado para quem não pagar o QoS, até porque as resoluções da Anatel já definem os critérios de qualidade", disse ele.

Castro e Zerbone participaram do seminário "Acesso à Internet e Direitos do Consumidor", promovido pelo Idec nesta terça, 3, em Brasília.

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