Governo Federal quer reestatizar a Cinemateca, suspendendo suas atividades até o fim do ano

Público do segundo dia da Semana ABC, na Cinemateca Brasileira

O Governo Federal pretende fechar a Cinemateca Brasileira pelo menos até o final de 2020, retomando suas atividades somente após a reestatização da instituição, hoje sob a gestão da Associação de Comunicação Educativa Roquette Pinto (Acerp). A informação consta em ofício encaminhado pela diretoria da Acerp ao ministro do Turismo, Marcelo Álvaro Antônio; à secretária Especial da Cultura, Regina Duarte; e ao subsecretário do Audiovisual, Heber Trigueiro.

O documento ao qual este noticiário teve acesso registra o que foi discutido em reunião na última sexta, 29 de maio, na qual a Acerp foi comunicada verbalmente sobre o fechamento das atividades da Cinemateca Brasileira e sua reestatização e sobre a indefinição sobre a dívida no valor de R$ 11 milhões da Secretaria Especial de Cultura (Secult) com a Acerp. Ainda na sexta-feira, o colunista do Uol Ricardo Feltrin noticiou sobre a proposta do Governo Federal de rescindir o contrato com a Acerp e fechar a Cinemateca Brasileira. Com o documento, é possível ter mais informações sobre a reunião.

No encontro, de acordo com o documento, ficou sinalizado que as cerca de 150 solicitações à Cinemateca em andamento não seriam atendidas até a retomada da instituição, já reestatizada. As solicitações, em geral, são de material de arquivo para uso em produções em andamento, que ficariam prejudicadas pela paralisação. Também aponta que Trigueiro teria apresentado outras alternativas para o processo transitório durante a reestatização da Cinemateca, mas que a decisão teria sido tomada pela Secult. 

Dívida

A Cinemateca Brasileira está sem contrato de gestão desde que o Ministério da Educação encerrou, em dezembro, o contrato com a Acerp para gerir a TV Escola. Desde então, a associação vem mantendo a instituição sem receber repasses do Governo Federal.

Os salários dos trabalhadores da instituição estão atrasados há dois meses e sem previsão de regularização, pelo menos até que se regularize o pagamento pelas despesas referentes a 2019 e 2020. No ofício, a direção da Acerp aponta que os valores já teriam sido depositados na conta da Secretaria Especial da Cultura e os registros aprovados no Orçamento Geral da União.

Além dos salários, outros serviços estão com pagamentos atrasados, como serviços terceirizados de segurança e conta de luz elétrica. A ACerp alerta para o risco de incêndio na instituição caso o fornecimento de energia elétrica seja cortado, uma vez que muitos rolos de filme presentes no arquivo podem entrar em combustão caso não sejam devidamente refrigerados.

A direção da Acerp aponta ainda que não há definição sobre a rescisão dos contratos de trabalho – altamente especializados, vale notar. 

Na última quinta, 28 de maio, de acordo com matéria de O Globo, o Ministério Público Federal em São Paulo enviou ofício à Secretaria Especial da Cultura cobrando "informações a respeito da possível ausência de repasse orçamentário que vem prejudicando o funcionamento da Cinemateca Brasileira e causando danos a acervo audiovisual mantido pela citada entidade." Confirmada a falta de envio dos recursos, o Ministério Público poderá entrar com uma ação civil pública contra a pasta.

Debate

Recentemente, entidades e profissionais ligados ao audiovisual e à memória e preservação alertaram sobre o sucateamento da instituição, sobretudo após a rescisão do contrato com a Acerp em dezembro. Em carta aberta, pediam, evidentemente sem propor a suspensão das atividades da instituição, o fim do modelo de gestão com convênio com Organizações Sociais. "Tal forma não confere autonomia, mas dependência de contratos de fácil rompimento, além de ignorar os profissionais da área e um debate mais amplo com a comunidade cinematográfica", apontam na carta. "É urgente a compreensão das especificidades das instituições e a valorização dos profissionais que nelas atuam", finaliza o documento.

No ofício enviado pela Acerp nesta semana ao Ministério do Turismo, a entidade pede uma ampla discussão com o setor audiovisual e profissionais da memória, como museólogos e bibliotecários, antes que se tome qualquer decisão. "Não faz sentido tomar uma decisão sem ouvir os envolvidos numa instituição que nasceu da própria sociedade brasileira há quase 80 anos, que diz respeito fundamentalmente à memória nacional".

Definição

No ofício a Acerp cobra ainda um posicionamento oficial por parte do Ministério do Turismo, da Secult e da SAV sobre a dívida: os salários atrasados e o ressarcimento à Acerp pelos atrasados. Cobra ainda definição sobre os serviços da Cinemateca, se serão, de fato, encerrados até o final do ano e como será o contrato com a Acerp na transição.

A Acerp aponta ainda que seu conselho se reunirá para tomar providências cabíveis, inclusive judiciais.

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