Lázaro Ramos e Elísio Lopes Jr. falam sobre o filme "Medida Provisória" em live de abertura do BrLab 2021

Na noite desta segunda-feira, 4 de outubro, foi realizada a live de abertura da 11ª edição do BrLab. Na ocasião, estiveram presentes Rafael Sampaio, diretor do BrLab; Viviane Ferreira, diretora-presidente da Spcine; Josephine Burgois, diretora executiva do Projeto Paradiso; Talita Arruda, curadora do Reach, um dos braços do evento; e Thiago Dottori, Maíra Oliveira e Gustavo Gontijo, membros da ABRA e curadores do BrPlot. 

"A Spcine é parceira do BrLab desde 2014 e enxergamos o evento como uma contribuição gigantesca para o audiovisual nacional e latino-americano. É muito bom poder apoiar e patrocinar eventos tão sólidos e comprometidos com o desenvolvimento do audiovisual do nosso país. Além disso, nunca é tarde e nunca é demais lembrar a importância da continuidade de políticas públicas direcionadas ao audiovisual", disse Viviane Ferreira. 

"O BrLab é uma inspiração e para nós é uma honra fazer parte dessa história. É muito especial estarmos juntos por mais um ano, renovando e reinventando essa parceria", afirmou Josephine Burgois. 

"Queremos muito agradecer todas as pessoas que apoiam e articulam esse evento. O BrLab traz pluralidade e diversos profissionais que nos ajudam a potencializar discussões urgentes e que são muito caras para nós. O evento será realizado nos próximos dias, de forma aberta ao público, com o objetivo de trocar e pensar em conjunto nossa audiência e a distribuição audiovisual", ressaltou Talita Arruda, que é curadora do Reach – Questões de Audiência, braço do BrLab que promove encontros ao longo desta semana. 

A programação completa pode ser conferida no site do evento

Lázaro Ramos e Elísio Lopes Jr. 

Lázaro Ramos, ator, apresentador, dublador, cineasta e escritor de literatura infantil, e Elísio Lopes Jr., dramaturgo, diretor teatral, produtor, escritor e roteirista baiano, já desenvolveram diversos projetos em parceria – entre eles, "Medida Provisória", que marca a estreia de Ramos na direção de longas-metragens. Lopes Jr. é um dos roteiristas do filme, que teve sua estreia adiada por mais de uma vez. Na live de abertura do BrLab, eles falaram, entre outros temas, sobre a produção. 

"Em 'Medida Provisória', buscamos explorar outros arquétipos de personagens negros, com características que ainda não foram apresentadas neles. A gente sempre pensou no que poderíamos explorar e que ainda não foi feito. É uma luta interna, pois há coisas que estão no senso comum. Eu mesmo já me peguei repetindo clichês que estão no que a gente assiste. Cotidianamente luto para sair desse lugar, que já foi muito explorado e, inclusive, cometeu algumas violências. Quero lutar contra essas violências. Uma história pode ser muito violenta se não trouxer um novo olhar. Acho que contar histórias é entreter mas, além disso, é fazer com que a sociedade avance. E explorar novos arquétipos é um ótimo caminho nesse sentido", analisou Ramos. 

"Eu entrei na equipe em 2015 e, em 2019, o projeto foi rodado. Nos transformamos numa equipe de quatro autores – eu, Lázaro, Lusa Silvestre e Aldri Anunciação. Juntos chegamos ao roteiro. É uma construção que parte de uma narrativa que já existia, uma peça de teatro, e vira um filme com uma grandiosidade narrativa e estrutural. Acompanhei as filmagens e vi a mobilização de gente e estrutura que o filme provocou. É um filme que vale muito a pena ser assistido", garantiu Lopes Jr. 

Sobre o processo de adaptar um texto teatral para um filme, Ramos contou: "Foi desapego para todos os lados. Cortamos muito do texto da peça. O primeiro roteiro era muito teatral. O processo demorou tanto tempo que fomos aprendendo como elaborar essa linguagem, fazer essa transição do teatro pra o cinema. Fomos entendendo o que iríamos trazer do teatro, o que podia ser transformado em imagem. Cada vez que a gente refazia e desapegava encontrávamos outras soluções. Tenho orgulho desse filme, que é um resultado desse aprendizado do desapego". 

Questão racial 

Os dois, que são negros, também falaram muito sobre a presença dos pretos no audiovisual. Dentro da temática, Lopes Jr. relembrou: "Muitas vezes eu me vi trabalhando e, quando olhei pro lado, tive a sensação de ser um bug, um erro do sistema. Se eu estou num espaço onde não me vejo representado, não me vejo espelhado nos meus colegas, a sensação que eu tenho é de que houve alguma falha no sistema e eu estou entrando nessa brecha, tentando fazer meu trabalho neste lugar. E essa sensação é muito ruim. A gente conhece desde pequeno essa sensação de estar sozinho em muitos lugares. E parece uma coisa estratégica para nos manter nesse lugar de isolamento. Mas temos que acreditar que podemos, que essas histórias podem ser contadas, que podemos ter outro olhar pelo que está posto". 

Já Ramos mencionou seu início de carreira, no teatro baiano. "Na época, os mecanismos de financiamento não eram muitos, mas tínhamos muito desejo de contar histórias. Foi isso que vi na minha adolescência, nos meus primeiros ídolos. No meu caminho, encontrei o Bando de Teatro Olodum, formado por pessoas que estavam ali, contando suas histórias, e das mais variadas. Tive o privilégio de nascer como artista, como contador de histórias. Quando saí de Salvador é que fui entender os 'nãos' que existiam no mercado", afirmou. "Mas aí eu já estava mal acostumado. Então fui arriscando. Foi assim que surgiu o projeto de 'Espelho', no Canal Brasil, há 17 anos. De uma vontade minha de estar ali, entrevistando pessoas e contando suas histórias. Até hoje o programa é sobre isso: desrespeitar regras e tentar colocar nossa voz – que só entendi depois que era represada em muitos aspectos. Foi uma coisa inovadora na TV brasileira para a época. Minha falta de consciência sobre o 'não' foi o que me possibilitou encontrar a voz nesse programa". 

Histórias para o futuro 

Ramos acredita que, para o futuro, o foco deva estar em contar histórias emancipadoras. "Isso vai revolucionar a dramaturgia", aponta. "Por que, por exemplo, a dramaturgia brasileira nunca contou a história de Elza Soares, que é tão rica e teria uma trilha sonora tão incrível? Isso é emancipar, perceber que existem histórias que precisam ser contadas. E isso que eu apenas falei de uma pessoa conhecida. Mas há muitas outras". 

Lopes Jr., por sua vez, comentou: "Tenho um universo amplo de desejos e cheio de utopias. Tenho muitos projetos, mas o principal é contar histórias novas. Não consigo visualizar qual o ganho de reproduzir dor. Estou com um desejo de contar histórias de famílias, das nossas famílias. Dizer como funciona a humanidade dentro do universo onde eu nasci. O aconchego de ser quem eu sou. São poucos momentos em que vemos o conforto preto. Então é isso, quero contar histórias pretas confortáveis". 

Como próximos projetos previstos, Lopes Jr. falou sobre um musical sobre o pagode dos anos 90, previsto para o próximo ano, e um roteiro já escrito sobre origens e a Ilha do Pati, de onde vem a família de Lázaro. "É uma história bonita e muito humana, diferente de tudo o que conhecemos sobre famílias negras no cinema brasileiro". O projeto ainda não tem data para sair do papel. 

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