O conselheiro Francisco Araújo Lima apresentou nesta segunda-feira, 4, um relato sobre o PL 3.832/2019, de autoria do senador Vanderlan Cardoso (PP-GO), que propõe fim à propriedade cruzada na Lei do SeAC (Lei 12.485/2011), ao Conselho de Comunicação Social (CCS). O relato apresentado pelo conselheiro não significou um voto ou um parecer de um projeto por ele relatado. Isto porque a reunião desta segunda-feira foi a última deste colegiado, que agora passará por um processo de escolha ou recondução dos seus integrantes, o que impossibilita o pedido de vista de qualquer outro conselheiro sobre o texto apresentado. Além disso, o projeto não estava na pauta ou tinha um relator escolhido. Assim, o relato de Araújo Lima apenas constará na ata da reunião não como uma posição do Conselho, mas sim como um informe do estado atual do projeto de Vanderlan Cardoso. Confira a íntegra da análise feita por Francisco Araújo clicando aqui.
No seu relato, Francisco Araújo não só relatou a situação atual do projeto, como opinou que o CCS deveria recomendar a aprovação do PL 3.832/2019 conforme o último parecer apresentado pelo seu relator, senador Arolde de Oliveira (PSD-RJ). No decorrer da tramitação do projeto, Oliveira produziu três pareces e duas complementações de votos, sendo que no último parecer, defendeu a aprovação do PL 3.832/2019 e a alteração no art. 1º da lei dizendo que ela não se aplica a conteúdos audiovisuais distribuídos em aplicações de Internet, sejam elas quais forem. Araujo Lima representa empresas de TV no CCS e é consultor do Grupo Globo, que defende a exclusão das empresas de Internet do escopo da Lei do SeAC.
O representante das empresas de televisão diz ainda no seu relato que a revogação dos arts. 5º e 6º da Lei do SeAC e a regulação que será aplicada ao streaming linear são assuntos correlacionados e que devem, sim, ser tratados a um só tempo. Esse raciocínio vai de encontro a um possível acordo que estava sendo desenhando pelos senadores dentro da CCT, de que pontos controversos, como a regulação de streaming, fossem tratados em um PL em separado, no caso, o PLS 57/2018, citado durante umas das reuniões da comissão.
"A dúvida sobre o enquadramento regulatório do 'streaming linear' acaba por criar elevadíssima barreira ao desenvolvimento dessa modalidade de negócio em nosso País, inclusive pelos grupos de mídia nacionais, uma vez que nenhum deles suportaria explorar tal atividade sob as obrigações e os ônus previstos na Lei do SeAC, totalmente incompatíveis com a disponibilização de conteúdo na Internet, seja do ponto de vista técnico ou econômico", diz Araújo no seu relato.
Deixar incertezas sobre o serviço de streaming linear, na visão do conselheiro Francisco Araújo, cria uma barreira de ordem legal para a atividade. "Sendo assim, manter a incerteza em torno do serviço de streaming linear é compactuar, em verdade, com a criação de uma barreira, de ordem legal, a essa atividade. Por isso, defende que os debates de revogação dos art.s 5º e 6º da Lei do SeAC, devem ser conjugados com o fim da segurança jurídica sobre o serviço de streaming linear, que na sua visão, é o que pretende Arolde de Oliveira em seu último relatório", diz Araújo.
O ponto da tributação também é apontado por Araújo. Ele diz que aqueles que defendem a postergação do debate regulatório do streaming a partir do aspecto tributário, afirmando que a TV por assinatura pagará uma carga mais onerosa do que os serviços de streaming, falham nos argumentos. Isso porque, diz ele, TV por assinatura, como um serviço de telecomunicações, está sujeito à incidência do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS), enquanto o streaming é um serviço de valor adicionado (SVA), que na definição do art. 61 da Lei Geral de Telecomunicações "não constitui serviço de telecomunicações, classificando-se seu provedor como usuário do serviço de telecomunicações que lhe dá suporte", sujeitando-lhe à incidência do Imposto sobre Prestação de Serviços (ISS). E, por lei, não tem como compará-los.
Debate
Terminada a leitura do relato pelo conselheiro Francisco Araújo, o conselheiro Fabio Andrade, representante da sociedade civil no colegiado e VP da operadora Claro, disse que o tema é polêmico. Alegou que, atualmente, há um pedido de informações direcionado ao Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) e à Senacon (Secretaria Nacional do Consumidor do Ministério da Justiça) sobre os impactos na concorrência e na relação de consumo decorrentes de eventual aprovação do PL 3.832/2019 e propôs que o debate sobre este projeto fosse feito em outro momento.
João Camilo, representante das empresas de rádio no CCS, apontou que apenas mexer nos art. 5º e 6º da lei não resolve o problema, pois era preciso também mexer em aspectos que garantissem a isonomia nos preços entre distribuidoras e programadoras (argumento bastante defendido por grupos como Record e SBT). Por isso, defendeu as alterações nos art. 8º e 32 da Lei do SeAC, nos termos do que existe hoje na emenda 10, apresentada pelo senador Eduardo Gomes (MDB-TO), ao projeto de Vanderlan Cardoso. João Camilo chamou a atenção para a proliferação de tantos projetos de lei tratando do mesmo tema, inclusive com os "mesmos textos", e fez uma pergunta ao plenário: "afinal o que o Brasil ganha com a queda do arts. 5º e 6º da lei do SeAC?".
Camilo também criticou a estratégia de colocar os pontos divergentes em torno do projeto 3.832/2019 em um outro PL e disse que as retiradas dos artigos atendem a setores internacionais e que, por isso, é preciso ter garantias para as empresas brasileiras que atuam no mercado. Ressaltou ainda que não existe nenhuma análise de impacto regulatório sobre essas mudanças propostas no projeto de Vanderlan Cardoso. "Queremos tempo para discutir esse projeto. E caso ele seja aprovado, precisamos de uma cláusula de reciprocidade. Não podemos receber aqui espelhinho e dar em troca ouro", disse, fazendo uma alusão à época dos colonizadores europeus quando chegaram no Brasil.