O momento atual do segmento de canais FAST foi debatido no segundo painel do Nextv Series Brasil, realizado em São Paulo nesta terça-feira, dia 3 de dezembro. Se nos primeiros passos desse mercado ele ainda era visto como um ambiente de conteúdos de acervo dos canais, e as marcas tinham certo receio de apostar nessa janela, hoje pode-se dizer que o FAST está consolidado no Brasil e segue uma curva de crescimento.
Uma das empresas pioneiras é a Samsung, que tem sua plataforma gratuita, a Samsung TV Plus, já em funcionamento na América Latina há quatro anos. Felipe Gagliardi, Content Senior Manager, atua essencialmente com o objetivo de desenvolver parcerias de conteúdo relevantes para a audiência da marca. Ele detalhou: "Não são necessariamente canais de massa. Podem ser canais que representem um nicho específico, mas que conversem muito bem com uma comunidade. A correlação com a receita não é de número de usuários, e sim de tempo assistido. Por isso é importante para nós achar canais que engajem". E em relação às marcas, o caminho passa pela exploração dos dados. "Tem muito dado dentro de uma TV conectada. Temos de achar formas de usar esses dados para fazer vendas mais efetivas para os anunciantes. São muitos recortes possíveis – contextuais e demográficos, por exemplo – que permitem que a gente alimente o anunciante com essa riqueza de informações. A partir daí, ele pode fazer uma campanha muito cirúrgica – e evita a dispersão da verba publicitária. Usar nossos dados proprietários é a principal chave do negócio", declarou.
E pensando nessa consolidação do FAST como inventário premium, Adriano Hayashi, diretor de receita publicitária LATAM da Paramount, justifica esse posicionamento: "Podemos falar em inventário premium primeiramente pela qualidade da plataforma, usabilidade e facilidade de experiência do usuário. Além disso, está a qualidade do conteúdo. No nosso caso, temos um time de curadoria dedicado". O grupo de mídia tem seu próprio serviço FAST, a Pluto TV, disponível no Brasil há quase cinco anos (globalmente, são dez anos de história), e adota para ela uma estratégia que se divide em alguns pontos essenciais. "Estar presente onde o consumidor quer assistir hoje é fundamental. A maior parte do nosso consumo atualmente acontece em CTVs, mas estamos em todas as plataformas. Pensar a distribuição é muito importante. E, falando de entretenimento, a Paramount possui assets únicos no mercado – como produtos de cinema, TV, licenciamento, experiências físicas e etc – e podemos usar todo esse ecossistema para promover o streaming. Por fim, está a qualidade e a curadoria do nosso conteúdo, que inclui canais de massa, que geram engajamento, e também passam por um olhar criterioso para os nossos próprios IPs, como 'Bob Esponja'. Pensamos em conteúdo de massa mas também olhamos para os nichos. Ainda existem muitos nichos não atendidos, e nosso time é especialista nisso, isto é, em olhar para pequenas oportunidades – que talvez em volume de usuários não pareça muito grande, mas que na soma dos canais constrói uma massa significativa. A estratégia olha para distribuição, conteúdo e divulgação", resumiu.
Um agente que cresceu muito com a chegada dos canais FAST foi a Tastemade, empresa de produção de conteúdos de gastronomia em vídeo que nasceu em 2012 e chegou na América Latina em meados de 2015/2016. A marca está no FAST desde os primeiros momentos do segmento no país – na Samsung TV Plus, por exemplo, eles estão presentes desde o dia um. "Nossa especialidade é vídeo desde o início, por isso acredito que a transição para o FAST foi tranquila. Quando surge o FAST e ele começa a crescer, vimos uma oportunidade de criarmos ainda mais vídeos, agora em formato mais longo, e especialmente num período em que a monetização nas redes sociais vinha caindo. É um inventário nosso, e que podemos monetizar. Essa é a grande vantagem", disse Bruno Gomes, Head of Sales e Brand Partnerships para Latin America da Tastemade.
Gomes defende que essas denominações acabam sendo mais importante para a própria indústria do que para o usuário final: "Para ele, não importa se é FAST, VoD, TV. Às vezes ele nem sabe onde está assistindo. Mas, para crescer, precisa de conteúdo relevante, como relevância cultural principalmente. O próximo passo da Tastemade é investir nisso. Hoje, o FAST tem muitos canais de IPs, e que funcionam muito bem. Mas até quando isso vai? Até quando seguirá sendo relevante para as pessoas? E falo disso porque as marcas querem relevância, no fim do dia. Elas estão no 'Big Brother' há 20 anos porque ele tem relevância cultural, as pessoas falam sobre o programa. Quando o FAST começar a investir em IPs e produções próprias, terá ainda mais relevância".
Esse contato com as marcas é muito próximo por parte da Tastemade, que tem a maior fatia da sua receita em branded content. "Criamos programas para as marcas – e que são conteúdos relevantes", destacou. A empresa também entende de forma muito clara as vantagens do FAST para os anunciantes. "A retenção das campanhas é muito alta, cerca de 90%. Estamos crescendo, e crescemos o ticket médio das campanhas de venda direta para o FAST. As marcas entendem que, até na comparação com a TV aberta, vale apostar no FAST porque você sabe quantas pessoas viram, por quanto tempo, são muitos dados. É um híbrido de TV aberta com digital. E o conteúdo vem para ajudar ainda mais nessa retenção", afirmou o executivo.
Praticamente uma nova entrante nesse mercado, a NxTV, que tem cerca de quatro anos de história, nasceu a princípio para trabalhar com provedores de internet, e há mais ou menos 15 meses lançou sua plataforma FAST. Primeiramente, via B2C; e mais recentemente, ainda em fase de teste, para provedores de Internet. "Entendemos que o público é diferente", explicou Sergio Mancera, CEO da NxTV.
A plataforma gratuita da empresa, a Só Play, já tem seis milhões de usuários – e é recente. "Temos o desafio da receita. Por isso que estamos trabalhando em outras frentes, entendendo que a receita não é tão rápida quanto esperávamos. Já estamos conectados, gerando um rate em torno de 20%. O que é bom, mas pouco perto do inventário todo. Ainda tem bastante inventário desperdiçado. Nossa estratégia é mirar nos provedores para fazer venda direta", revelou. "Nosso foco é o provedor. Em cidade pequena, hoje, temos nove concorrentes. A briga é pelo preço – e qualquer real faz diferença para o provedor. Entendemos que, nesse contexto, o FAST encaixa perfeitamente. Entregamos o FAST para toda a base inicial sem custo e o provedor pode trabalhar na sua região de atuação, inclusive com uma plataforma customizada. Com isso, fomentamos ainda venda de internet. Nossa ferramenta ajuda o provedor a fazer mais vendas", completou.
Tendências: IA, eventos ao vivo e novos anunciantes
Gagliardi, da Samsung, acredita que o FAST continuará crescendo muito por conta da questão da gratuidade. "Existe muito valor no gratuito, principalmente no Brasil. Somos uma bolha aqui, mas as famílias do brasileiro médio não têm dinheiro para assinar dois, três serviços de streaming, por isso o gratuito sempre vai ter espaço no consumo de entretenimento dessa família", ressaltou. "O desafio é que será um mercado cada vez mais competitivo daqui em diante. Veremos operadores de TV paga indo para o FAST – o que já acontece nos EUA e deve vir pra cá também – além de novos fabricantes de TV entrando no mercado também. São desafios, mas que ajudam o mercado a se desenvolver".
E, pensando em tendências para o futuro, ele ainda enxerga direitos esportivos cada vez mais indo para o FAST. A própria Samsung TV Plus neste ano exibiu competições como Olimpíadas e Eurocopas, via CazéTV, que é um dos principais canais da plataforma – e, segundo o executivo, o resultado foi bastante expressivo, se tornando até um case global da empresa. "Acredito que cada vez mais os direitos esportivos e as ligas migrarão para uma relação D2C, não querendo ter um canal intermediário, e o FAST ajuda nesse sentido. Isso já está acontecendo lá fora – com a UFC, por exemplo. Esse tipo de iniciativa vai começar a pipocar com as ligas. No começo não com as maiores, e sim com aquelas que desejam construir suas marcas. O FAST é muito vantajoso para elas". Por fim, Gagliardi vê também a IA começando a quebrar a barreira da localização do conteúdo, que ainda é um gargalo nesse mercado. Ele explica: "O brasileiro prefere ver conteúdo dublado. Os canais localizados vão muito bem. Mas a dublagem ainda é muito cara e leva muito tempo. À medida em que as soluções de IA forem avançando, essa barreira vai caindo. Para legenda já funciona muito bem. A dublagem por IA ainda não está 100%, mas tem melhorado. E a IA pode ajudar também na recomendação e descoberta de conteúdo ou personalização da interface".
Hayashi, da Paramount, por sua vez, pontua que o mercado está em plena transformação, por isso não dá pra cravar para onde a indústria vai. Mas ele concorda que os eventos ao vivo no FAST é um movimento significativo. "Trazer esses eventos, e não só de esportes, é uma mudança brutal, e algo que já está crescendo muito. Gera um engajamento muito grande. O conteúdo vai fortalecer as plataformas FAST, mas elas não substituirão outras janelas", apostou.
Já Mancera destaca no FAST uma oportunidade para anunciantes que não tinham espaço na TV, e não conseguiam anunciar nos canais tradicionais por conta dos valores altos. "As marcas acostumadas a investir no digital têm uma tendência muito grande de começar a investir na CTV. E isso com a verba que elas já têm. Veremos curvas de novos anunciantes dentro do FAST nos próximos anos", prevê o executivo.