Canais da TV aberta encontram no ambiente digital novas formas de monetização 

Julio Cargnino, presidente do Canal Rural (moderador); Cristianna Sant’Anna, do +SBT; Luciana Cardoso, da Band; Alessandro Malerba, da Record; e Daniel Martins, da Dolby

Um painel realizado durante a programação do Nextv Series Brasil, que aconteceu nesta terça-feira, dia 3 de dezembro, em São Paulo, reuniu executivos de canais da TV aberta para debaterem o novo papel digital dessas emissoras. É consenso que a televisão segue tendo uma relevância enorme, mas passa por importantes transformações ligadas especialmente às novas tecnologias. Os canais, hoje, buscam novos caminhos de distribuição e também de monetização de seus conteúdos. 

Cristianna Sant'Anna é coordenadora de estratégia e operação de conteúdo do +SBT – lançado em agosto deste ano, o serviço foi justamente o maior passo do canal nesse sentido de transformação digital. "Já éramos muito fortes no YouTube, mas entendemos que poderíamos agregar valor no streaming principalmente pela parte de dados, isto é, por poder assim conhecer mais afundo a audiência – ter dados direto na fonte, e não somente de pesquisas ou materiais externos. Esse foi um dos principais motivos do nascimento da plataforma, além é claro de trazer a transformação digital para dentro de casa. E, apesar de ambos serem gratuitos, o canal aberto não concorre com o streaming", contou. "Estamos também começando a entender o mundo do FAST – já temos dez canais dentro da plataforma, que é um ambiente seguro para fazermos experiências e melhorarmos cada vez mais, tanto para a parte comercial quanto para a audiência", completou. 

A Band, por sua vez, é uma emissora aberta que já está se aventurando no ambiente digital há mais tempo – o BandPlay tem cerca de quatro anos de mercado – mas foi em 2024 que a empresa decidiu investir de forma mais robusta na plataforma, participando com a marca de eventos, intensificando a divulgação e levando mais conteúdos para o serviço. "Acreditamos na diversificação de plataformas, e temos que estar onde o público está. Hoje, vemos o BandPlay como nosso super app. É um modelo que oferece o conteúdo da Band sob demanda e também agrega conteúdos de parceiros. Olhamos para o conteúdo de forma mais ampla e, do outro lado, pensamos ainda em como monetizar melhor o usuário", afirmou Luciana Assis Cardoso, Head de Product & Data da Vibra Digital

Foi a partir dessa mentalidade que a Band passou a investir, dentro do seu app, em diferentes estratégias, e criou o Band Shop, uma loja que comercializa produtos variados, como smartphones, eletrodomésticos, móveis, jogos, eletroportáteis e etc, e a BandBet – o Grupo Bandeirantes foi, inclusive, a primeira emissora a obter licença para operar uma casa de apostas no país. "Usamos nossa inteligência para pensar em outros canais de monetização. Não podemos ficar na dependência exclusiva da publicidade, e a produção de conteúdo também é cara. Por isso precisamos diversificar", justificou. 

Outro canal que já está bem familiarizado às plataformas e ao digital é a Record, que lançou sua área multiplataforma há 15 anos, inicialmente com o portal R7 e, posteriormente, com o seu serviço de streaming, o PlayPlus. "Entendemos a necessidade de uma distribuição mais ampla do que a limitação do linear. Acreditamos que esse seja o futuro para o conteúdo audiovisual do grupo", explicou Alessandro Malerba, Diretor de Operações Digitais da Record. Nesse sentido, a estratégia deles é relativamente simples: todos os conteúdos na íntegra vão para o PlayPlus e todos os trechos e cortes são disponibilizados em múltiplas plataformas, como o próprio R7, redes sociais e YouTube, entre outras. "Para cada uma delas temos uma forma de monetizar e de enxergar valor. Essas ferramentas funcionam como complementares. Existe uma lógica de estratégia de construção e de distribuição de conteúdo. Temos um cuidado muito grande para não colocar conteúdos que não tenham monetização suficiente – afinal, produzir é muito caro, ainda mais no padrão de TV. Para todo e qualquer produto construído temos uma estratégia específica. Não basta pegar um conteúdo que foi produzido para a TV e colocar no digital. É importante entender as diferentes audiências. A audiência do PlayPlus, por exemplo, é mais jovem do que a da Record linear". 

Dado é ouro 

Os dados – agora próprios e em grande quantidade – se revelaram uma novidade muito importante para essas empresas que até pouco tempo atrás estavam acostumadas a trabalhar apenas com as informações de audiência de seus canais de TV aberta. Na Band, a construção de um "data lake" foi prioridade desde os primórdios dessa trajetória no digital. "Temos dados de usuários em qualquer uma das nossas plataformas. É necessário um cadastro único para poder usar, e pedimos esse cadastro desde o momento de entrada. Acreditamos que está aí o ouro do negócio. Inclusive tentamos crescer esses dados em cada elo que temos com o público, sempre procurando facilitar o processo – o cadastro é fácil, é possível realizar o login via outras plataformas, como as redes sociais. Cruzamos esses dados para usar na parte de conteúdo, comercial e também nas nossas newsletters, que ajudam a reengajar esse público. É essencial para a estratégia. A equipe de dados é uma das maiores que temos, e estamos sempre em busca de trazer ainda mais informações da audiência", disse Cardoso. 

Na Record, funciona de maneira parecida. Todos os produtos digitais do canal estão conectados com o que eles chamam de "Record ID". Independente do caminho por onde o usuário chega, é possível analisar toda a sua jornada. "Especialmente no PlayPlus, isso é importante para analisarmos a questão do churn. Hoje em dia ninguém tem amor à plataforma, e sim ao conteúdo. Por isso precisamos saber como tratar essa base para ter uma menor perda depois que acaba um conteúdo 'hero'. Ano que vem teremos o Brasileirão, e esporte especificamente é um momento bom para pedir esses dados para o usuário", observou Malerba. Outro momento oportuno é a votação dos reality shows, como "A Fazenda", onde o público consegue participar do conteúdo de alguma forma. "É aí que devemos atacar. É nessa hora que ele está mais disposto a compartilhar dados. Não podemos perder oportunidades de coletar dados e precisamos manter essa análise sempre viva. O dado é ouro". 

No SBT, essa questão ainda não está totalmente resolvida. Para usar o +SBT não é necessário efetuar um cadastro – o dado é solicitado apenas quando a pessoa quer assistir a um conteúdo cuja classificação indicativa não seja livre. "Mas temos outras estratégias para conseguir esse dado – e temos um planejamento para progredir essa comunicação com o usuário. Depois de um tempo assistindo, por exemplo, vamos sugerir um cadastro, mostrando benefícios, como voltar à plataforma e ter a opção de 'continuar assistindo' e receber indicações mais precisas de conteúdo. Não é para o dado ser uma barreira, e sim mostrar que, se o usuário compartilhar seus dados, terá benefícios. É desafiador. Mas hoje já conseguimos fazer uma segmentação com os dados que temos", garantiu Sant'Anna. 

Monetização e relação com as marcas 

Nesse cenário, surgem novas formas de monetização e diferentes possibilidades junto às marcas. O + SBT, por exemplo, já nasceu com cotas fundadoras vendidas e, dentro da plataforma, cada patrocinador tem um canal "para chamar de seu". Há ainda a venda direta no FAST e no catálogo, e a empresa segue pensando em formas criativas de continuar vendendo. "Estamos abertos a diferentes tipos de negociação. A criatividade também nos ajuda na parte comercial. A gente não se limita. Se algum patrocinador tem uma nova forma de fazer, a gente conversa e tenta entender o que podemos fazer. Temos catálogo, FAST, simulcast… São muitas opções para bolar novas formas", ressaltou a executiva. 

Já o BandPlay surgiu inicialmente sem publicidade e, depois, passou a inseri-la, mas ainda em quantidades muito pequenas. O que está prestes a mudar. "Temos a intenção de, a partir do ano que vem, monetizar um pouco mais, especialmente conteúdos ao vivo. Além disso, temos também a implementação do DAI prevista para o próximo ano. O resultado é interessante, vimos pela experiência da Globo e da Record. E, por fim, a monetização através de produtos e serviços. Acreditamos no crescimento desse ecossistema como um todo. E isso acontece a partir dos dados, pensando em como oferecer mais coisas para esse público que já tenho e como monetizar ainda mais", assinalou Cardoso. 

Malerba confirmou que a Record está feliz com a entrega publicitária no formato DAI: "Ele traz facilidade e o mercado entende que é uma venda de break comercial. Não precisamos explicar muito. Esse ano, conseguimos vender para Coca-Cola, P&G e inúmeras bets. E, além disso, temos os formatos tradicionais também, que podem entrar numa composição. Nossa aposta para o ano que vem segue no DAI, enquanto os concorrentes não chegam". 

Empresas de tecnologia como parceiras  

Outro agente importante nesse novo cenário é a tecnologia. A Dolby, por exemplo, é uma empresa que está no mercado de streaming desde o surgimento das primeiras plataformas, que foram lançadas já contando com as tecnologias que ela oferece – que são principalmente Dolby Atmos, Audio e Vision. "O que fornecemos como proposta de valor aos canais e plataformas é pegar aquilo que eles produziram e entregar a melhor experiência para o usuário. O Globoplay, por exemplo, é uma plataforma muito próxima da gente. Para cada tipo de experiência do usuário na plataforma – como novelas, Rock in Rio, Olimpíadas – temos um tipo de tecnologia envolvida. É assim que criamos valor. Hoje, temos focado em empresas nacionais", afirmou Daniel Martins, Business Manager Cone Sul da Dolby

A empresa também consegue ajudar os players a evitarem o churn. "Deixamos a experiência do usuário consistente. E nossas tecnologias têm de ser de fácil implementação para eles. Não pode gerar fricção na hora de implementar. São coisas que discutimos diariamente", contou. 

E, em relação às novas formas de monetização, Martins também acredita que a Dolby pode colaborar. "Algumas plataformas só disponibilizam conteúdo em 4K ou Dolby Atmos em alguns tipos de planos de assinatura. São funcionalidades que não farão com que a pessoa mude sua assinatura, mas são parte da proposta de valor. Oferecer essas tecnologias ajuda os canais a, inclusive, pulverizar seus custos de produção. Cada empresa usa nossas tecnologias de forma diferente ou para melhorar a parte de custo de distribuição e operação ou para criar uma proposta de melhor valor para o usuário final", concluiu. 

 

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