OTTs brasileiras compartilharam suas estratégias no cenário atual da indústria do entretenimento durante um painel no Nextv Series Brasil promovido nesta terça-feira, dia 3 de dezembro, em São Paulo. Para além dos investimentos em conteúdo diferenciado, ficou claro que elas buscam de forma bastante ativa a ampliação de suas formas de distribuição.
Amanda Fernandes é gerente de produtos digitais do Looke, um serviço brasileiro de streaming que oferece filmes, séries e conteúdo infantil. A curadoria de conteúdo do Looke se volta especialmente à produção independente, de forma a sair da estratégia de produções originais ou de licenciamento de produtos de grandes estúdios – dois caminhos de custo bem alto – que é adotada pela maioria das grandes plataformas. "Conseguimos, dentro dessa imensidão de conteúdos, trabalhar em coisas que são nichadas, mas não tão segmentadas assim", explicou. A empresa atua com um olhar bem específico: ela analisa gêneros bastante consumidos, como ação e romance, buscando entender as vertentes que existem ali dentro. No romance, por exemplo, existem as vertentes de young adult, erótico e dorama, entre outras. "Enxergamos essa pluralidade que temos dentro do mercado e, usando o algoritmo, entregamos para esses pequenos nichos aquilo que eles procuram em termos de histórias. Ação é um gênero que corresponde a quase 40% do consumo na plataforma neste ano. Mas olhamos para a ação e enxergamos pequenos clusters para trabalhar. Dessa forma, não nos fechamos a estereótipos e nem limitamos os caminhos", contou.
No início, o Looke tinha um modelo híbrido, com conteúdos transacionais e a opção de assinatura. "Quando entendemos que isso causava uma confusão para o usuário, nos assumimos como uma plataforma de assinatura. Aí, tivemos uma virada. Isso aconteceu no período da pandemia, quando os estúdios deixaram seus conteúdos exclusivos dentro de suas próprias plataformas. Foi importante para aprendermos a negociar com o mercado global de produção independente. E é um mercado enorme. São produtos de muita qualidade e uma pluralidade de histórias que não encontram janelas para licenciamento. Alguns acabam nem tendo licenciamento comercial. Fomos buscar no mercado essas histórias diferentes para trabalhar numa janela de exclusividade também. Hoje, muita gente encontra o Looke a partir de um conteúdo específico que não encontra em nenhum outro lugar e que quer muito assistir", pontuou a executiva, que resumiu: "Amadurecer e olhar para esse mercado global de conteúdo independente para poder distribui-lo de maneira exclusiva e, assim, agregar um diferencial para o nosso usuário: essa foi a nossa estratégia".
UOL briga com churn e quer direitos esportivos
O UOL não é uma marca nativa do audiovisual, mas tem se aventurado na área e colhido bons frutos. A empresa desenvolveu o UOL Play, uma plataforma com conteúdos próprios e também de parceiros, e está buscando licenciamento de conteúdos diariamente, com foco especial em direitos esportivos – essa tem sido a prioridade do UOL no momento, pensando em compor com o material de esportes que ele já produz diariamente, como a cobertura jornalística. "O público do UOL Play não necessariamente abandonou os canais lineares, mas talvez tenha abandonado o lugar onde consumia esses canais, por conta de fatores como preço e praticidade", analisou Luís do Vale, diretor de produtos digitais do UOL. Hoje, o UOL Play conta com 23 canais lineares de parceiros, além dos próprios, e o consumo é muito alto não só para engajamento, mas também para aquisição de conteúdos, segundo o executivo, que garante que muitas pessoas assinam a plataforma para consumir esses conteúdos de canais lineares. "E vamos aprendendo com isso. Eventos ao vivo são sucesso absoluto. E o esporte tem se destacado – até por isso optamos por priorizar eventos esportivos. Temos hoje conteúdo esportivo dos nossos parceiros, como Paramount, Max e BandSports. E a gente vê o quanto esse tipo de conteúdo mexe o ponteiro pra nós. Agora, queremos colocar o pezinho na água e jogar esse jogo diretamente, e não só através de parceiros", reforçou o executivo, que acrescentou que séries e documentários também performam muito bem. "Isso nos surpreendeu. Conteúdo ao vivo já esperávamos. E também tem sido importante para nos direcionar".
O trato com o churn tem sido um dos maiores desafios para o UOL Play. Antes de entrar no streaming, a empresa já tinha outros produtos comercializados por assinatura, como a de conteúdos exclusivos do portal – ali, o churn é de menos de 3%. "Temos produtos com 1,6% de churn. Quando chegamos no streaming, tomamos um susto. O churn era de mais de dois dígitos", lembrou Do Vale. "Sabemos que não é um problema nosso, e sim uma característica do mercado esse churn alto. Mas mesmo assim foi muito desafiador. No começo, era enxugar gelo. Foi muito difícil. E então conseguimos dar um passo muito importante no último ano. Não por conteúdo, e sim pela plataforma – a evolução que tivemos na plataforma e ainda a entrada nas TVs conectadas, que foram duas coisas que mudaram nosso patamar. O churn ainda é desafiador, mas mais saudável", celebrou. "O próximo passo que queremos dar é no conteúdo. Temos conteúdos relevantes na plataforma, mas poucos exclusivos. Os melhores conteúdos que temos estão disponíveis em muitas outras plataformas. Queremos agora ter conteúdos com algum grau de exclusividade e, assim, reduzir ainda mais o churn. É um passo importante que daremos", adiantou.
Woohoo e a mudança de rota
O Woohoo, assim como o Looke, passou por algumas mudanças – que, nesse caso, envolveram um novo planejamento e a entrada de conteúdos diferentes. Com o slogan "da comunidade para a tela", o canal, que está no linear, no FAST e no VoD, foi amadurecendo a cultura do game dentro da sua marca. Anteriormente, os conteúdos eram voltados para esportes como surf e skate. "Sabíamos que sofreríamos um ataque negativo quando mudássemos. Tivemos uma queda de audiência por um certo período", assumiu Lucas Rima, head de conteúdo do Woohoo. "Migramos o surf para o ambiente do FAST – hoje, temos um canal exclusivo, que no próximo ano também terá skate, corrida e outras variáveis de esportes aquáticos – e, na Pay TV, 60% da grade é focada no público gamer, geek e de e-Sports, pensando especialmente em levar entretenimento para esse público. Algo que se conecte com ele dentro de sua cultura de dia a dia e seu lifestyle. É o mesmo tipo de conteúdo que o fã de esporte busca", conta.
"Mas a comunidade gamer não é fácil. Ela critica, exige. Uma das coisas que solucionou nossos problemas foi a transmissão de torneios de e-Sports. Em 2023, o Woohoo exibiu mais de 1300 horas de torneios, e esse ano já batemos 2000. Isso é muito legal porque gera interação entre a família. Principalmente falando em TV linear. O público infantil e pré-adolescente, que não estava no canal antes, chegou com essas mudanças", observou. Para o Woohoo, o principal desafio é estar sempre conectado com as comunidades onde atua. "Preciso entender como ela vai receber o conteúdo que estou propondo. Preciso observar o que outras empresas fazem, quais são as tendências. É um estudo diário", finalizou Rima.
Canais lineares ainda são relevantes
Especialista na operação de ponta a ponta de canais lineares, alguns próprios e outros de terceiros, o Grupo Stenna é responsável, por exemplo, pelo Canal UOL, lançado na Pay TV no último mês de novembro. "Isso mostra a força que o meio da TV ainda tem. O digital quer ampliar seu alcance e, por isso, busca a TV, o FAST e as novas tecnologias que estão lá", analisou Mauricio Alvarenga, Partner & co-CEO do grupo.
Para Alvarenga, o desafio está em todo o ecossistema, e não só na TV paga. Atinge os OTTs também. "Grandes players que priorizaram suas plataformas próprias ainda lutam para fechar o ano no azul", pontuou. "E temos que achar formas de tornar a operação dos canais mais barata. Como parcerias e novas tecnologias de distribuição. Não dá para um canal ter um custo de milhões por mês. Estamos trabalhando com formas diferenciadas de trazer essa operação de forma mais equilibrada. Usamos nossos próprios canais, como o ZooMoo Kids, como laboratório. Tentamos fugir do satélite, encontrar formas de monetização diferentes. Oferecemos isso para os parceiros também. A busca é por uma operação mais otimizada, enxuta e financeiramente vantajosa", resumiu.
O executivo ressaltou que, para o produtor de conteúdo, ainda faz sentido trabalhar janelas de exibição para monetizar ao máximos os seus produtos. "Afinal, conteúdo não é barato. Nesse mercado, alianças são favoráveis. Como as que a Claro fez, por exemplo, que buscou as plataformas para firmar parcerias. Elas são importantes para manter o mercado vivo e saudável e os produtos monetizando", concluiu.