782 projetos selecionados em editais desde 2016 ainda não fecharam contratos com a Ancine

Na audiência pública da Comissão de Cultura que aconteceu nesta segunda-feira, 5, o procurador da República Sergio Suiama disse que existem 782 projetos aprovados em editais de fomento da Ancine entre 2016 e 2018 e que ainda não foram contratados. O membro do MPF do Rio de Janeiro lembrou que apresentou em dezembro de 2020 uma Ação Civil Pública (ACP), com pedido de liminar, solicitando urgência da agência reguladora na análise e contratação dos projetos selecionados.

Suiama mostrou dados enviados pela Ancine ao MPF que mostram que em 2020, apenas 100 projetos desse contingente foram contratados.  "Em 2020 o número não passou de 100 contratações. Ou seja: isso é ínfimo perto do passivo de 780 que temos e que precisam ser contratados. Nesses passos, vamos levar uma média 5 anos para resolver o problema desse passivo", disse o procurador.

Um outro dado trazido pelo membro do MPF é que na Justiça Federal do Rio de Janeiro existem atualmente cerca de 200 Mandados de Segurança contra Ancine, de autoria de produtores que pedem urgência na liberação dos seus recursos. "Na Justiça Federal do RJ temos mais de 200 mandados de segurança impetrados contra a Ancine, por produtores que estão prejudicados por conta dessas paralisações".

Efeito dominó

Segundo Mauro Garcia, representante da Brasil Audiovisual Independente (BRAVI), a paralisação da Ancine não prejudica apenas produtores do audiovisual brasileiro, mas atinge também os canais e programadoras. "Hoje já temos algumas empresas programadoras que não estão cumprindo a cota de tela. Veja que esse mecanismo, o seu funcionamento e também a sua paralização atinge uma série de empresas privadas, fazendo com que outras obrigações não sejam cumpridas", disse o produtor.

Suiama também destacou que a ação deliberada do governo em suspender a contratação desses projetos atingiu também outros entes da federação, no caso, as agências municipais e estaduais de fomento à cultura. "Essas agências sofrem com o atraso do repasse desses recursos. E isso deixa muitos projetos também inacabados. Essa paralisação gera um problema em cadeia para outros entes federativos", afirmou Suiama.

Cíntia Domit Bittar, representante da Associação das Produtoras Independentes do Audiovisual Brasileiro (API), lembrou que a situação de paralisia da Ancine está trazendo insegurança jurídica para os produtores e trabalhadores da cadeia do audiovisual, especialmente por conta dos prazos de execução dos projetos. "Quero destacar os problemas dos prazos. Hoje, não sabemos qual é o prazo de execução dos nossos projetos. A Nota Técnica assinada pelos parlamentares explica que a prorrogação de um ano é a partir da data de cada projeto. Já a Ancine diz que o prazo é o da promulgação da lei Aldir Blanc", disse Bittar.

Diego Medeiros, advogado da Associação dos Produtores de Audiovisual do Nordeste, destacou que é preciso prorrogar os prazos para a execução dos projetos. "Muitos projetos precisam ser prorrogados porque não é razoável fazer filmagens nesses tempos de pandemia. O mínimo seria de 12 meses, dos atuais prazos em curso. Isso dará segurança jurídica para os produtores", afirmou. Medeiros lembrou que as orientações do TCU não determinaram as paralisações de projetos pela Ancine. Por isso, na avaliação dele e de outros participantes do debate, a decisão da agência em atrasar o pagamento dos projetos foi uma medida deliberada.

2 COMENTÁRIOS

  1. No vídeo disponível no Youtube sobre a reunião da Comissão de Cultura é possível ver as duras críticas dos parlamentares e outros participantes em relação ao diretor presidente da ANCINE, Alex Braga, que optou por não ir, justificando que responde a processos sobre o assunto e não desejava por isso estar presente.

    Os presentes lembraram que se isso fosse aceitável, nenhum dirigente governamental participaria das reuniões, pois vários são processados, e que o seu dever era estar presente, tal e qual o secretário especial de cultura Mário Frias, igualmente sob processos, esteve.

    O diretor Alex Braga chegou ao ponto, em sua justificativa aos deputados, de dizer que acatava as ordens do secretário Mário Frias, revelando não ter consciência da autonomia da ANCINE, submetendo-se e subordinando-se como se não fosse um dirigente de uma autarquia especial, uma agência reguladora, com mandato estável via aprovação no Senado, conforme determina a lei.

    O atual ocupante da presidência da ANCINE também parece desconhecer que a lei aplicável o obriga a prestar contas da sua gestão ao Congresso, especialmente considerando a nova lei das agências, e que as casas parlamentares exercem poder de fiscalização e a prestação de informações é essencial. Com tal atitude, ou desconhece rudimentos de gestão pública contemporânea, especialmente aqueles voltados ao accountability, ou não tem o que dizer. Efetivamente, desconhece que uma agência reguladora é um espaço propositalmente poroso, no qual a interface com a sociedade e seus representantes deveria se dar de maneira intensa, com transparência ativa de informações, realização constante de audiência e consultas públicas, sem falar de diretores corajosos e que possam ter mínimas condições de enfrentar um debate público sempre que convocados. Ser dirigente de uma agência reguladora é diferente de ser coordenador ou chefe de divisão de uma unidade burocrática qualquer.

    Um dirigente de agência não pode ter medo de ser criticado publicamente pelas suas práticas como gestor e tem o dever de prestar informações.

    Por conta disso, a deputada Lídice da Matta propôs uma moção de protesto contra ele. Merece aplausos. O deputado Marcelo Calero havia protestado pelo mesmo fato na reunião anterior.

    Como podemos observar no vídeo da reunião, o quadro traçado pelo Mauro Garcia e pelo procurador da República é assustador. Segundo o procurador, houve ordem da ANCINE para não se contratar e por isso os diretores Alex Braga, Vinicius Clay, Edilásio Barra e o procurador geral da agência sofreram uma ação de improbidade.

    O que se denota desta reunião e de outras que já ocorreram, somados ao repertório de notícias, é que a ANCINE não consegue fomentar, não tem capacidade para regular ou fiscalizar. A situação exposta no TCU em relação as prestações de contas é assustadora, demonstrando a existência de uma caixa de Pandora da má gestão.

    Existem outras situações bizarras, como a IN de 2012 da ANCINE que institui tributo sobre o VoD. Se ela é legal, por qual motivo a agência não cobrou a CONDECINE sobre as operações da Netflix, Amazon etc, abastecendo o FSA de recursos? Se ela é ilegal, como parece, existe o problema de quem pagou e pode ter direito a repetição de indébito. Neste sentido, a ausência de um monitoramento e estudos da agência sobre o mercado de streaming é deprimente.

    Os problemas de processamento e fiscalização dos mecanismos de fomento direto do art. 39, X; art. 1 e 1º-A e art. 3º e 3º-A, que constam em relatórios de auditoria e de gestão, atualmente em apuração pelo TCU, demonstram grave risco de evasão fiscal, se efetivamente confirmados, com gestão leniente e consequências devastadoras.

    Do ponto de vista do fomento, exceto pelas (sempre) ações voltadas ao mercado de infraestrutura de exibição, houve de 2019 pra cá a completa destruição dos instrumentos de apoio ao mercado. Tivemos a descontinuidade dos programas de apoio a participação em monstras e festivais internacionais ou a exportação/internacionalização do nosso conteúdo, com os cortes da ANCINE e APEX.

    Não se fala mais em editais de concurso ou abertura de chamadas de fluxo contínuo do FSA, praticamente sem lançamento desde 2018.

    A contratação do FSA passou a ser um caso de improbidade administrativa, pela deliberada (quase) paralisação, no dizer do MPF.

    Houve uma descontinuidade dos editais e ações de regionalização (arranjos regionais), com provável prejuízo aos demais entes federativos, em razão das contrapartidas empenhadas. Seria razoável que os entes federados processassem a União para reaver prejuízos e forçassem uma tutela para a retomadas das ações. É extremamente relevante destacar que a lei 11.437 obriga que, no mínimo, 30% da receita da CONDECINE TELE sejam destinados a produtoras brasileiras estabelecidas nas regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste e 10% destinadas ao fomento da produção de conteúdo audiovisual independente veiculado primeiramente nos canais comunitários, universitários e de programadoras brasileiras independentes. Vejam: não é 30% e 10% do destinado a produção do Plano Anual de Investimentos; é 30% e 10% da RECEITA DA CONDECINE TELE arrecadada no(s) exercício(s) anteriores. Na programação orçamentária é preciso deparar o joio do trigo, segregando as outras receitas do FSA do arrecadado na CONDENCINE TELE. Logo, os entes federativos podem e devem acionar a União judicialmente para que isso seja cumprido.

    No tocante a dramática situação da COVID, mesmo sentada em cima de um fundo público, a atuação emergencial da ANCINE durante a pandemia foi pífia, com algum privilégio residual de ações favoráveis aos grandes grupos exibidores com capacidade de tomada de empréstimos.

    A ausência de ações voltadas aos trabalhadores e trabalhadoras do audiovisual (equipes técnicas, a parte mais frágil, afetada e empobrecida do setor), aos criadores intelectuais (roteiristas, diretores), pequenos produtores ou empresas de infraestrutura de produção ou pós-produção demonstra uma profunda insensibilidade burocrática e alienação do quadro.

    Para justificar a paralisação, atrelou-se o fluxo de contratação a incapacidade gerencial da agência para analisar prestações de contas. Revelou-se que os produtores passaram quase 20 anos (!) entregando prestações de contas que não eram sequer analisadas e que, agora, começam a ser analisadas sob as regras atuais e não aplicáveis à época.

    Sobre paralisações e ideologia, não podemos esquecer que a diretoria atual da ANCINE também parece ter sido submissa em relação à intervenção governamental no edital de diversidade do FSA com a EBC, no caso que levou o ex-ministro Osmar Terra e a ANCINE figurarem no pólo passivo de uma ação de improbidade administrativa movida pelo MPF.

    Para finalizar, a agência vive em um rodízio de diretores substitutos precários, numa interpretação heterodoxa da lei das agências, visto que a estrutura da ANCINE é diversa da diretoria da ANVISA, por exemplo. Na ANCINE os diretores não respondem por áreas específicas, é um colegiado generalista, e o rodízio se deu interpares e não na função segregada. Criou-se uma situação bisonha no qual o presidente Alex Braga fez as nomeações necessárias para interferir na cadeia de indicáveis; e assim determinou o seu colegiado, sem permitir que outros ocupem as vagas após o ciclo de 180 dias. O resultado é um rodízio de cartas marcadas no qual o garçom traz sempre a mesma carne, alterando só a posição no espeto. Violou-se com isso qualquer elemento referente a não coincidência de mandato ou o princípio de diversidade no colegiado, que não é autônomo e sim uma composição biônica do próprio diretor presidente. Em contrapartida, parece ser cômodo ao Presidente da República não indicar nomes efetivos, pois parece ser bom ter uma agência submissa para a sua guerra cultural.

  2. É completamente incompreensível como se pode achar plausível a realização de uma audiência pública sobre políticas públicas de um setor na qual os atores que realizam as políticas públicas se ausentam!!

    É como se eu fosse realizar uma entrevista com o capitão da seleção brasileira que acabara de vencer o título mundial e conversasse com o terceiro goleiro reserva…

    É decepcionante!

    Como se não bastasse a falta de transparência e de respeito com a coisa pública e com a sociedade civil, a justificativa do presidente substituto Alex Muniz para o não comparecimento à audiência é justamente o fato de estar respondendo a um processo decorrente da má gestão das políticas públicas de fomento!

    Ora, senhores, isso é um paradoxo. Pois se utiliza da própria incompetência para se justificar a falta de transparência.

    E assim continua "tudo como d'antes no quartel d'abrantes".

    E pra finalizar, ainda tem direito a diretoria Fake News comandada pelo presidente substituto de mandato vencido (que briga pra continuar no poder, mas usa e abusa da substituição pra se esquivar da responsabilidade) e os demais diretores neobolsonaristas, ex lulistas e futuros "o que vier pela frente" porque basta um carguinho para comprar a dignidade!

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