Regulação do VOD deve considerar cotas para conteúdo nacional com proeminência e participação do direito patrimonial

*Mauro Garcia é presidente da Bravi. (Foto: Divulgação)

Já faz anos que o tema da regulação do VoD está em pauta no setor audiovisual nacional. As mudanças no governo, os debates e as análises de propostas vêm de uma longa caminhada. "Lá atrás, em 2018, houve uma análise de mercado, ainda com o Manoel Rangel na Ancine. A amostragem apresentava ainda como isso estava acontecendo na Europa. Durante um tempo, se falou que esse mercado ainda não estava maduro no Brasil. Mas hoje, ele está mais do que maduro, já passou dessa fase. Quantas versões da diretiva europeia já foram feitas. Não dá mais para falar em esperar o mercado ficar maduro", pontuou Mauro Garcia, presidente executivo da BRAVI e diretor executivo do ICAB, em entrevista exclusiva para TELA VIVA. 

Garcia ressaltou que, conforme o tempo passa, o audiovisual como um todo e, principalmente o streaming, sofre uma série de modificações, e a regulação se torna cada vez mais necessária: "Alguns serviços de streaming hoje viraram TV aberta. Estamos vendo com o futebol, por exemplo, grandes nomes saindo das emissoras, como a Globo, e indo para as plataformas. Hoje, não sabemos mais o que é o que. O Brasil faz muito isso: demora a criar as leis, parece que espera, de propósito, o resto do mundo fazer para pegar esses modelos já resolvidos e só aí criar o seu. Claro que a realidade brasileira é diferente, mas a gente agora já tem um mercado maduro, já sabemos o que esperar". 

Em 2018, com o governo Temer e Sérgio Sá Leitão como Ministro da Cultura, o tema já estava em pauta, mas passou por um conflito. Garcia relembra: "Tentaram aprovar um modelo que envolvia apenas cobrança de Condecine, o que não ficaria de pé. O Conselho Superior de Cinema não permitiu, não ia dar certo. Hoje, eu diria que, conversando com representantes de entidades e até mesmo de plataformas, essa questão de cobrança por faturamento já passou, todo mundo aceita. E não é faturamento sobre toda a empresa, óbvio, e sim da parte que diz respeito ao VoD. Falava-se ainda em deixar o AVoD de fora, mas hoje também já é consenso que devemos incluir. É claro que o faturamento de publicidade é separado. Não é sobre o YouTube inteiro, por exemplo, e sim sobre a parte que distribui conteúdos audiovisuais sob demanda". 

Modelo de cotas 

O que ainda está em aberto é a questão da cotas de conteúdo brasileiro nas plataformas. Não sobre a necessidade, que é clara, e sim sobre o modelo. "Queremos cotas ligadas a investimento, e não no catálogo. Isto é: cotas não para ter o conteúdo brasileiro na plataforma, mas escondido. É uma cota combinada com proeminência. Assim fugimos também da discussão do algoritmo. Obras que saíssem do dinheiro público teriam proeminência, esse é o ponto. Não sei se vai ser assim, mas para nós é óbvio que tem que ter essa proeminência. Mas nós não queremos uma categoria exclusiva para os conteúdos brasileiros nas plataformas, de modo a gerar um preconceito, entre aspas. Parece que somos 'coitadinhos', reunidos numa gaiola. Queremos nossas obras misturadas às outras, em diferentes categorias, comédia, terror, drama…", defende Garcia. 

"A proposta de alguns de nós, como a BRAVI e o SICAV, é uma destinação da condecine híbrida, não só para investimento direto, se não se sobrepõem meia dúzia de produtores e os outros ficam excluídos. Pensamos que o melhor modelo é híbrido – uma parte para o FSA, para alimentar políticas públicas e abrir espaço para mais gente, e a outra parte para investimento direto, mais ou menos como o Artigo 39. Isso permitiria diversidade de aplicação do dinheiro para produtoras de diferentes níveis e atuações. É o modelo que continuamos defendendo", explica. 

Participação do direito patrimonial

Para Garcia, é essencial que esse tema também esteja envolvido nas discussões sobre a regulação do VoD. "Não estamos falando exatamente como é feito no SEAC, que é uma porcentagem de 51% para ter a maior parte da participação no direito patrimonial. As negociações podem ser flexíveis. Mas é importante não misturar – como ocorre na Lei do Audiovisual – produção com direito de exibição. Cada direito é um. O que não pode é não falarmos nesses direitos. Já temos maturidade o suficiente para discutir com as plataformas a participação patrimonial, para que as produtoras se capitalizem e também sejam players importantes no mercado, como acontece nos Estados Unidos, por exemplo. Temos que sair do modelo de remuneração apenas na produção", enfatiza. 

Expectativas

De modo geral, as expectativas para o desdobramento desse debate são positivas. Garcia acredita que tudo está se movimentando nesse sentido e que, ainda este ano, teremos um projeto de lei. "Não dá para afirmar que ele será votado e entrará em vigor ainda em 2023, mas não tenho dúvidas de que este PL virá", aposta. 

Evento 

"Regulação do VOD: Como ampliar a presença do conteúdo brasileiro" é o tema de um painel que acontece durante a agenda do Rio2C 2023. A mesa está marcada para terça-feira, dia 12 de abril, e reunirá, além de Mauro Garcia, Joelma Oliveira Gonzaga, secretária do audiovisual do MinC; Tiago Mafra, advogado e diretor da Ancine; Paula Vergueiro, advogada na área de cultura, mídia e entretenimento; e Leonardo Edde, sócio-fundador da Urca Filmes, presidente do SICAV e vice-presidente da Firjan. A moderação será de Rosana Alcântara, advogada especializada em regulação do audiovisual.

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