Projetos integrados renovam a pay-TV como mídia publicitária

A despeito da queda de base de assinantes da TV por assinatura convencional, a participação do setor no bolo nacional de publicidade mantém certa estabilidade e até registra crescimento.

Os valores se referem a R$ 1,2 bilhão e R$ 844 milhões, investidos respectivamente em 2021 e em 2020. Tal crescimento, da ordem de 49%, é superior ao registrado pelo mercado como um todo. O bolo subiu 38,8%, atingindo R$ 19,7 bilhões, ante os R$ 14,2 bilhões do volume total investido no primeiro ano da pandemia da Covid-19. Os dados são do Cenp-Meios.
Como o ano passado já é encarado como um período de recuperação ante o atípico ano de paralisação das atividades que foi 2020, cabe destacar que apenas os meios Internet e TV paga tiveram crescimento em termos de participação de um ano para o outro.

Pelo lado das programadoras de TV por assinatura, os números são vistos com certa naturalidade, pois há o entendimento de que os grupos ampliaram suas ofertas no digital e o guarda-chuva pay-TV já não corresponde mais somente à televisão por assinatura como era antes.

Raul Costa Jr., gerente geral A+E Networks Brasil. Foto: Divulgação.

As programadoras de canais se atualizaram na oferta de projetos integrados ao mercado anunciante, envolvendo não apenas os canais em si distribuídos para as grandes operadoras, mas todo seu conjunto de meios digitais capazes de envolver e empacotar determinado conteúdo.

Conforme conta Raul Costa Jr., gerente geral A+E Networks Brasil, as mudanças que acontecem dentro do universo publicitário, com novas definições e atuações dos diferentes meios de comunicação, têm levado a adaptações e a novas maneiras de se trabalhar.

No caso da própria empresa, ele diz que o grupo não deve mais ser visto como de canais de televisão por assinatura, mas sim como um grupo global de entretenimento, com marcas fortes e confiáveis, que entregam conteúdos de qualidade e relevância, adaptados para todas as plataformas em que atua, seja como televisão linear ou canal digital, plataformas de vídeos ou redes sociais, em formatos curtos ou longos.

"Só para ter uma ideia da força desta estrutura, hoje disponibilizamos ao mercado brasileiro mais de 170 milhões de impressões mensalmente. No último ano tivemos mais de um bilhão de vídeo views nas redes e plataformas digitais. E este é o universo de possibilidades que conseguimos entregar para nossos parceiros comerciais", afirma Costa Jr.

Na Newco, programadora de canais de TV paga do Grupo Bandeirantes, o olhar tem sido para a produção de conteúdo junto às marcas, o que, de acordo com o diretor comercial, Alexandre Barsotti, vai muito além do merchandising: "Temos olhado de uma forma diferente, fugindo da mídia tradicional de ficar apenas no comercial de 30 segundos. É sentar com o cliente e produzir conteúdo".

Alexandre Barsotti, diretor comercial da Newco Pay TV, programadora do Grupo Bandeirantes. Foto: Kelly Fuzaro/Disvulgação.

Na programadora, os eventos ao vivo e atrações exclusivas são encarados como diferencial e um bom exemplo é a modalidade de esportes, com a aposta da casa no pilar do automobilismo, como as corridas da Nascar e, claro, a F-1, exibida em divisão com a TV aberta do grupo.

Barsotti credita essa estratégia, aliada à criação de novos canais, ao crescimento de receitas na casa em dois dígitos/ano nos últimos três anos. No período, a Newco também ampliou seu portfólio de canais 100% nacionais, com a chegada do Agro+ (hardnews do agronegócio) e o Sabor & Arte, para gastronomia. Este último tem merecido projetos especiais, com o envolvimento de marcas e parceiros.

Aguarda-se a chegada de mais dois canais do grupo, que estão para ser lançados. Alexandre Barsotti não dá ainda mais detalhes, mas é sabido que os gêneros se referem a um canal dedicado ao empreendedorismo e a outro esportivo, voltado para o streaming.

Ecossistema

Marcelo Pacheco, VP de vendas publicitárias e inovação da Warner Bros. Discovery até o começo de maio. Foto: Divulgação.

Marcelo Pacheco, VP de vendas de publicidade e inovação da antiga WarnerMedia, destaca que a janela de consumo do público não é mais estanque e que o meio TV por assinatura atua nas diversas janelas de consumo de conteúdo, com ofertas para todas as plataformas. Ele vê os números do mercado como reflexo de um novo ecossistema expandido, que continua tendo a TV paga como relevante na sua vocação de sempre sair na frente quando se trata de inserção de marcas. "Muito do que temos feito é impulsionado pelos eventos ao vivo", destaca Pacheco.

O executivo, vale destacar, deu entrevista ainda como VP no grupo, agora denominado Warner Bros. Discovery, mas está de saída da empresa para assumir, nas próximas semanas, cargo na Eletromídia.

Os canais de variedades têm uma oferta de premiações e há o esporte, com eventos como o Campeonato Paulista, a UEFA, Champions League. Há ainda NBA no canal no YouTube e, claro, o serviço de streaming com o HBO Max.

Segundo Pacheco, a busca é sempre pela oportunidade, onde exista uma janela de conteúdo, seja no canal linear, no digital, no streaming, nas redes sociais. O trabalho desenvolvido atualmente tem base em quatro pilares: esportes, premiações, música e games, e a empresa faz uso de ferramental de mídia programática.

Roberto Nascimento, VP de vendas publicitárias da Warner Bros. Discovery. Foto: Divulgação.

Roberto Nascimento, VP de vendas publicitárias da Warner Bros. Discovery, encara os dados de investimentos publicitários do setor como balizadores do mercado e indicadores da acomodação dos números.

Ele chama atenção ao fator de impacto no meio em 2021, que foi o retorno do esporte ao vivo, com a volta das competições. "O esporte ao vivo, os live events, são geradores de interesse de marca e atraem possibilidade de negócios". Esse tipo de atração, lembra Nascimento, tinha sofrido interrupção no primeiro ano da pandemia.

De qualquer forma, para o executivo, o montante destinado ao setor corresponde a verba pertencente ao próprio meio da TV paga, que voltou a partir de 2021 a certa normalidade. Ele também destaca mudanças internas do mercado, já que antigamente havia um grande concentrador dos eventos, que agora estão mais distribuídos.

"O nosso resultado, sem tais eventos, correspondeu a um esforço muito maior de briga por share, com o realizado muito próximo do que acontece com a indústria", afirma Roberto Nascimento, em referência ao desempenho do então grupo de canais da Discovery no ano passado. Em sua opinião, a indústria passa por um período de muita acomodação e, em consequência da pandemia, o mercado ficou dependente de determinados formatos de compra.

A questão, de acordo com Nascimento, passa a ser como se reconstroem as relações comerciais – a indústria da comunicação se fortalece muito nos encontros, algo que ficou muito limitado e que agora deve ser reconquistado. "Temos de retomar modelos híbridos de negociação, porque há plataformas novas, o que traz muitas novidades de conteúdos", propõe Roberto Nascimento.

Segundo o VP de vendas de publicidade da Warner Bros. Discovery, o período foi de mudanças também do lado das agências e "todo mundo precisa reforçar a necessidade de reconstruir de uma maneira conjunta essa indústria. Precisamos olhar como se faz pra retomar a indústria da comunicação no Brasil". Os motivos apontados têm a ver com perda de efetivos das agências, troca de gerações de profissionais e pela maior importância das plataformas em detrimento dos conteúdos. A partir da realidade do grupo pós-fusão, também se vislumbra um novo quadro, uma vez que os eventos ao vivo agora estarão incorporados sob uma mesma marca.

Na empresa, plataformas lineares e não lineares são vistas como marcas de comunicação de uma forma geral: "Tem de tentar sempre encontrar uma capacidade melhor de alcance", diz Roberto Nascimento.

No intrincado universo das sociedades e parcerias multinacionais, a unidade de vendas de publicidade da Discovery já detinha desde 2020 também no seu portfólio os canais Sony e AXN pra o mercado anunciante do Brasil, México, e pan-regional a partir da Flórida/EUA, assim como suas plataformas digitais.

Alexandre Barsotti, da Newco, também pondera que a indústria de agências sofreu bastante nos últimos anos, em virtude das transformações do mercado e do advento das plataformas digitais. No fim do dia, todos sabem, a busca geral é pelo resultado e todos estão em busca de visibilidade e performance: "Estamos juntos e buscamos olhar muito para a empresa, com a solução para o cliente que dê mais visibilidade para o negócio".

Novas marcas

Como a busca pelos "eye balls" (a atenção da audiência em si) é constante, Marcelo Pacheco dá especial destaque para a marca TNT Sports no digital – trata-se da plataforma que derivou do antigo TV Esporte Interativo.

A TV aberta – líder em share de publicidade no Cenp-Meios com 45,4% dos investimentos (ou R$ 8,96 bilhões) em 2021- também tem sido muitas vezes aliada nessa convergência das mídias por meio de parceiras com as programadoras de TV por assinatura. No caso do HBO Max, por exemplo, a protagonista de sua próxima telenovela será escolhida dentro do programa do Faustão, atração de um canal da TV aberta, a Band.

Os canais do guarda-chuva Discovery já desenvolviam ampla parceira com emissoras abertas, tendo um histórico em série de reality shows feitos em conjunto com as redes Band, SBT e Record. Nesta semana, por exemplo, o SBT lançou a nova temporada de "Cozinhe Se Puder -Mestres da Sabotagem", que estará na plataforma Discovery+.

Especificamente no caso de esportes, a HBO Max experimentou neste ano uma novidade com o campeonato Paulista de Futebol, numa estratégia que considera vencedora e que segue nos próximos anos (até 2025), em pacote que inclui a exibição das partidas do Paulista Feminino, Paulista A2 e Sub-20.

A vertente dos games é outra das linhas de atuação inerentes à Warner, com histórico de distribuição de mídia física de jogos no mercado. Assim, a escalada dos e-sports também chega com tudo ao grupo, com eventos de peso do segmento como a final da Liga Brasileira de Free Fire 6 e os torneios da Koel (liga de futebol virtual) tendo sido transmitidos nos últimos tempos.

Perspectivas

Para a Newco, a expectativa é de um crescimento de dois dígitos para este ano. Na visão do diretor comercial, os desafios estão em pontos de atenção do período de eleições, quando há as restrições de gastos de governos e as inseguranças típicas no mercado com possibilidades de mudanças políticas. Para Alexandre Barsotti, fatos recentes como os impactos econômicos do atual conflito na Europa e o cenário de alta de juros nos Estados Unidos de alguma forma podem interferir nos humores por aqui.

"O grande desafio é o mercado entender que não se trata mais de uma empresa como era antigamente. Não é mais só Pay-TV", reitera Marcelo Pacheco. Ele acredita que, com todas as perspectivas, a projeção para 2022 é de um crescimento em vendas comerciais em dois dígitos, apontando que o primeiro trimestre deste ano já foi muito bom, em comparação ao mesmo período de 2021.

No que tange à junção das empresas – Warner e Discovery – a busca é por integração, sinergia e a complementariedade das gigantes em seus respectivos nichos, com ganhos e robustez, já que ambas as empresas somam públicos em todas as faixas etárias e seus diversos canais.

Roberto Nascimento acredita que 2022 será um ano de ajuste: "E ainda com Copa do Mundo". Lembra também que, historicamente, a programadora vem num ritmo de crescimento grande e com ganho de share.

O rol das tendências a ser trabalhada nos canais do cardápio Discovery este ano é: Saúde Mental & Física, Casa & Decoração, Turismo, Alimentação & Gastronomia, Diversidade, Empreendedorismo & Economia Colaborativa. É neste guarda-chuva que serão reunidos o conteúdo para conversas, as propriedades e franquias dentro da programação relacionada. "O nosso mundo não se define mais só pelo linear", resume Roberto Nascimento.

"Podemos dizer que as perspectivas são muito positivas para este ano e os próximos, pois junto com as modificações de mercado estão chegando as nossas mudanças de forma a entregar cada vez mais qualidade e resultado", afirma Raul Costa Jr., do A+E.

Branded Content

Na Newco, dentre as ações diferenciadas apontadas, além de programas especiais em formato de branded content, estão fóruns (nas áreas de saúde, mercado imobiliário, entre outras) e as lives. "Para o canal Arte 1, por exemplo, trouxemos um programa de vendas de leilões", conta Alexandre Barsotti.

Como vantagem competitiva, os canais contam ainda com as demais mídias do grupo Band de Comunicação. Assim, para um anunciante como a TIM, a programadora desenvolveu pílulas de conteúdo para seu canais que também foram veiculadas nas rádios e na Band TV.

Neste aspecto, a imensa maioria dos projetos – o diretor comercial fala em 90% — é feita com as agências já pensando na integração das mídias. "Sempre sentamos para fazer o negócio como um todo; a parceira é muito grande", assinala.

Aula- show Talk & Taste, do canal Sabor & Arte, com o Le Cordon Bleu. Foto: Divulgação.

Exemplos não faltam, como o evento Talk & Taste desenvolvido com o banco BRB feito na plataforma Le Cordon Bleu para o canal Sabor & Arte e que envolveu dez patrocinadores, gerando experiência dos patrocinadores, degustação à marca, com produção de conteúdo e entrega de mídia. "É o que a empresa mais quer: desenvolver um projeto e ao final ter uma entrega", diz Barsotti.

Outro exemplo é o novo programa do apresentador Ronnie Von, o "Além do Vinho", que já nasceu com patrocinadores. Casos assim são típicos projetos que os indicadores de mercado existentes não conseguem mensurar.

Roberto Nascimento destaca que as ações para conteúdo de marca dentro da programação dos canais do grupo têm especial relevância e se estendem para o mundo não linear, onde se beneficiam fortalezas da sua marca de canais como o grande interesse do público feminino e a liderança no gênero de aventura.

No caso do A+E Networks, Raul Costa Jr. afirma que a inovação tem se dado por meio do uso da capacidade criativa e de produção para projetos especiais, nas ofertas comerciais, em formato e tecnologia, considerando em primeiro lugar a eficiência do plano de comunicação.

"E exatamente para podermos avaliar isto com mais precisão, lançamos no mercado no final do ano passado a ferramenta de pesquisa Total Audience Plus, que consegue unificar em métricas únicas todos os esforços de comunicação feitos no ecossistema do Grupo A+E, incluindo o benefício de extrapolação da performance de TV para território nacional e não limitado aos 15 mercados".

Ele explica que, com esta ferramenta, os anunciantes conseguem saber ao vivo como está a performance das campanhas e, caso necessário, pode-se tomar providencias de imediato para ajustes ou correção de rotas.

São vários os casos de conteúdos patrocinados entre as várias plataformas e janelas ligadas à marca da Warner.

A TNT Sports, por exemplo, tem uma parceria de longo prazo com a NBA e a Budweiser para transmissão de jogos da maior liga de basquete do mundo no YouTube.

"The Cut": programa apresentado por Alessandra Ambrósio, case de branded content com o anunciante Wella. Foto: Divulgação.

Primeiro reality show brasileiro da HBO Max, "The Cut" teve oferecimento do anunciante Wella. A transmissão do Paulistão no serviço contou com patrocínio inédito, contabilizando com a BetNacional e Rei do Pitaco o primeiro acordo comercial vinculado a esportes na plataforma de streaming.

A transmissão do Oscar no canal TNT neste ao teve Amazon Prime Video, Jeep, Natura, Rolex, Samsung e TikTok como anunciantes da transmissão multitelas do prêmio.

A Warner Bros. Discovery já anunciou a estreia do game show "Jogada Certa", parceria entre a TNT Sports, marca de conteúdo esportivo da companhia, e a Sportsbet.io.

Relacionamento

Roberto Nascimento reitera haver uma nova geração de profissionais de mídia que tem outra forma de se relacionar com os veículos, já talhada a comprar via plataforma. Com vistas a estreitar esse relacionamento, a empresa inaugurou recentemente a quinta edição do projeto Blink – que começou em 2018 e que convida 45 jovens profissionais de mídia indicados pelas agências de publicidade para conversas com os novos talentos da indústria. Neste ano, serão dez encontros/workshops mensais presenciais.

"Vamos reconstruir conexões", declara o VP de vendas de publicidade a Warner Bros. Discovery. Trata-se de um formato que a programadora encontrou para ter uma nova interlocução e entender a conversa com a nova geração de mídia. "Chamamos para conversar para despertar o conhecimento pela curiosidade, pela criatividade".

Algumas atrações em branded content do grupo de canais são: "Detona" (Discovery H&H e Discovery+), "Rota da Gastronomia" (Food Network e Discovery+), "Onde Vive Você" (Discovery H&H e HGTV); "Cartas Marcadas" (Discovery+ e Discovery), "Vai dar Sabor" (Discovery+ e Discovery H&H).

Há ainda as atrações nacionais dos canais Sony e AXN, que geram conversas localmente: "Shark Tank Brasil" (Sony Channel), "Me Poupe" (Sony Channel), "Em nome da Justiça" (AXN); "Self Made Brasil" (Sony Channel); "Branded Content: Shaking The Bar" (Sony Channel).

Na foto de abertura, edição de abril do Blink, programa de relacionamento com jovens profissionais de mídia dos então canais da Discovery, agora Warner Bros. Discovery. Foto: Divulgação

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