"É hora de aproveitar a credibilidade que o cinema brasileiro tem lá fora", diz secretária do programa Ibermedia

A primeira edição do Reach – Audiência, Conteúdo & Tecnologia acontece nos dias 7, 8 e 9 de outubro, segunda, terça e quarta-feira desta semana, no Espaço Itaú de Cinema Augusta, em São Paulo – o encontro é parte integrante da programação da nona edição do BrLab e é apresentado também pelo Projeto Paradiso. Entre os destaques do primeiro dia do evento, um painel que reuniu fundos e instituições que apoiam, financiam e participam do financiamento e desenvolvimento de projetos audiovisuais. A mesa foi composta por Elena Vilardell, secretária técnica e executiva do programa Ibermedia, da Espanha; Fay Breeman, do Hubbert Bals Fund, da Holanda; e Satu Elo, programme manager europe da European Audiovisual Entrepreneurs – EAVE, de Luxemburgo.

Satu Elo representa um programa de formação para produtores, um dos mais antigos da Europa, que já trabalhou com quase três mil graduados. "Partimos do propósito de fortalecer a indústria do cinema em geral, ajudando a fazer com que os produtores desenvolvam seus pensamentos estratégicos, e não só suas habilidades audiovisuais, pensando como verdadeiros empreendedores e players ativos. Eles já chegam com seus projetos, claro. Mas selecionamos produtores, e não projetos. Os projetos são ferramentas.", explica. Já o programa representado por Fay Breeman faz parte do Festival Internacional de Cinema de Roterdã. "Apoiamos os filmes no início, em suas primeiras etapas de desenvolvimento, com um financiamento de dez mil euros. A demanda é grande – no último ano, recebemos 800 inscrições, das quais 20 foram financiadas. Temos tanto financiamento para produção quanto para coprodução.", conta. Por fim, Elena Vilardell trabalha com um programa que não é voltado aos produtores, e sim à produção dos filmes. "Surgimos a partir da necessidade de reforçar a produção, colaborando com histórias que devem ser contadas. Apoiamos os filmes mais críticos o possível.", garante.

Considerando um cenário no qual financiamentos para o audiovisual estão constantemente ameaçados, especialmente no Brasil e no restante da América Latina, as porta-vozes dos programas foram logo questionadas sobre como proceder em períodos do tipo. "Precisamos ser adaptáveis. Temos de nos levantar, e não ficar pensando 'Onde está o meu financiamento?'. É claro que é fácil falar, mas é o primeiro passo. Existe muita coisa boa sendo feita com criatividade e pouco dinheiro. Pensar fora da caixa demora e dá trabalho – há insights que só teremos com o tempo, pensando muito a respeito.", opina Satu. "Por isso, nós forçamos nossos produtores a pensarem desse jeito desde o início. Trabalhamos muito em grupo, então ideias novas surgem o tempo todo. Uma vez, uma das equipes estava com dificuldades para desenvolver o projeto e, por isso, fizeram um breve exercício de marketing, a fim de estudar o público-alvo. Nesse processo, descobriram um tema paralelo ao script principal que era uma ferramente poderosa para o filme. O assunto acabou se tornando maior dentro daquele roteiro. Pensar no público final foi o que desbloqueou a dificuldade que eles vinham enfrentando.", exemplifica.

"Para mim, a resposta nesses momentos é: precisamos sobreviver.", brada Elena, da espanhola Ibermedia. "Os países estão enfrentando crises contínuas no audiovisual – Venezuela, Argentina, Brasil – e por isso temos de nos unir e pensar ainda mais nas coproduções como um caminho ideal. É nesse período que elas têm de funcionar ainda mais, tanto artisticamente quanto financeiramente. No Brasil, por exemplo, é hora de aproveitar a credibilidade que o país tem lá fora. O cinema brasileiro é muito bem visto, atrai interesse de fundos internacionais. Quando o próprio Estado não apoia, contar com ajuda externa é a melhor opção.", aponta.

Financiamento de projetos: como selecionar?

Fay conta que, no Hubbert Bals Fund, a escolha dos projetos que serão financiados passa por algumas perguntas-chave, que devem levar em consideração que os mesmos estão em fase embrionária, e que provavelmente serão concluídos dali algo como cinco a sete anos. "Focamos na história, na proposta visual, e de que forma eles conseguirão captar recursos no futuro.", cita. "Ali, não é o momento de focar em audiência. Mas há uma questão que sempre fazemos ao analisar uma obra, que é avaliar se mostraríamos um filme como aquele no Festival de Roterdã. É uma pergunta difícil de ser respondida no começo, mas ela sempre vem à tona e deve ser considerada.", acrescenta. Satu completa: "Nosso trabalho no começo é olhar para as tendências e treinar os jovens profissionais para que saibam lidar com elas. No programa, eles entram em contato com tutores fixos, normalmente que se formaram ali também, e com tutores convidados, que são escritores, produtores e agentes de marketing, por exemplo. Fazemos questão de promover sessões com especialistas para darmos aos participantes uma visão geral do que está acontecendo no mercado. Neste ano, por exemplo, abordamos muito o crescimento de volume de séries para televisão e a produção para plataformas emergentes.".

Distribuição e resultados

Em relação à medição de resultados, Satu analisa: "Nosso sucesso não é nada além do sucesso dos nossos estudantes. Promovendo eles, estamos promovendo a nós mesmos. Então acompanhamos o futuro de cada um. Só o fato deles continuarem produzindo e não terem desistido da carreira já é um bom sinal.". Com a brincadeira, ela completa: "Ficamos de olho em sucesso de indústria, isto é, prêmios e festivais, e também sucesso de público em seu país, com números de audiência e negociações de distribuição. Depende de cada filme.". Fay apresenta seu ponto de vista: "Apoiamos projetos em fase inicial, o que é um trabalho bastante arriscado, então é importante ficarmos a par de como ele está se desenvolvendo. Desde o ano passado, passamos a pedir para todos aqueles que receberam nosso financiamento e que estivessem com filme em circulação para nos enviarem dados de bilheteria, para que a gente possa avaliar para onde o filme viajou e também como ele performou em cada local. Também avaliamos se eles receberam prêmios. No geral, os resultados comprovam o que esperávamos de cada filme. Mas às vezes temos boas surpresas, como filmes de nicho tendo alcances enormes.".

Entretanto, Fay aproveita para fazer uma crítica. "Olhamos sempre para as estratégias de distribuição dos projetos e posso dizer que 80% delas são iguais, passando por procurar um agente de vendas, trabalhar com distribuição local, lançar o filme em alguma plataforma… Nada muito diferente disso. Quando vejo algo fora da curva, já dou uma estrelinha a mais para aquele projeto.", brinca. "O mais interessante é ter um plano diretamente conectado ao assunto do projeto, e não uma estratégia genérica. Mas isso é raro. Penso que os diretores estão um pouco no escuro em relação a essas estratégias. Eles contam com coisas que funcionariam há dez anos e que, hoje, provavelmente não funcionam mais.", pontua.

Elena, da Ibermedia, completa: "Todos os filmes têm um nicho, por mais abrangentes que sejam. A pergunta tem que ser 'Como chegamos até eles?'. A distribuição tem que pensar nisso – e fazer essa avaliação considerando a questão da rentabilidade, é claro.". 

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