Distribuição de conteúdo por diferentes meios demanda consolidação e formatação dos modelos de negócio

A TV por assinatura não está mais apenas nas plataformas tradicionais e cabo e DTH. Hoje, o consumidor chega aos serviços por diferentes meios, como portais de Internet, agregadores de conteúdo, TVs e caixas conectadas e marketplaces, entre outros. O momento atual é marcado pelo surgimento de novos personagens para consolidar e organizar esses conteúdos e apresenta-los ao público. São novos atores de distribuição entrando em um cenário que, há pouco tempo, era protagonizado por poucos players. No mercado de TV paga, estão todos os agentes fora de suas zonas de conforto e buscando evoluir. 

Para Adriana Naves, head de distribuição de conteúdo Latam da Roku, o momento é positivo e marcado por uma mudança muito grande, baseada primeiramente na experiência do consumidor – que hoje tem muito mais poder de escolher o que quer ver, da maneira que quer ver. "Nesse sentido, a Roku se apresenta como agregadora. Conseguimos trabalhar esse ecossistema de forma bem complexa, mixando serviços gratuitos e pagos. Os modelos de negócio estão marcados por essa complexidade, por isso não dá para dizer que o modelo está consolidado. O mercado está em evolução, o vemos claramente como híbrido. SVOD, TVOD… Muita coisa mudou e continua mudando. No Brasil, o consumo de conteúdo é muito ativo e engajado. Temos um mercado que é early adopter e nos permite trabalhar modelos novos", disse Naves nesta segunda-feira, 9 de agosto, durante painel no primeiro dia do Pay-TV Forum 2021, evento virtual organizado pelas publicações TELETIME e TELA VIVA. 

Surgimento de novos agregadores 

Como a Roku, há outros agentes que atuam como agregadores, oferecendo essa vitrine de conteúdos para os consumidores. Sendo assim, o cenário não seria de extrema concorrência entre eles? Para Naves, não necessariamente. "Fora do Brasil temos parceiros como a Claro Vídeo, por exemplo. É outro braço de distribuição para a própria operadora. A vantagem é do consumidor, que pode escolher. Quanto mais opção, pra ele, melhor". A head de distribuição revelou, inclusive, que uma parceria com a WatchTV já está nos planos a curto prazo da Roku. 

A Roku, segundo Naves, parte da premissa básica de que tudo interessa – dentro desse princípio, a empresa embarca e convida todo tipo de conteúdo a estar na plataforma. "O consumidor tem que ter opção. Quando um novo app chega, fazemos questão de comunicar o público – como faremos logo mais com a Watch. O principal problema é o grande custo do desenvolvimento – falta esse papel do desenvolvedor. Cada plataforma tem seu desenvolvimento específico, por isso é importante criar parcerias. Queremos embarcar o maior número de parceiros e os mais relevantes. O objetivo é desenvolver os conteúdos para a plataforma visando a mesma boa experiência para cada". 

Maurício Almeida, cofundador da Watch Brasil, apresenta um produto relativamente novo no mercado – um marketplace de conteúdo agregado com aplicativos diferentes – e afirma que a aceitação tem sido positiva. "Os canais lineares ainda têm uma força grande e nos surpreendemos positivamente com essa demanda por parte dos clientes. Vemos provedores querendo colocar canais locais, por exemplo. Nunca apostamos nessa questão de que uma coisa vai matar a outra. Eu acredito que os serviços conviverão juntos". No entanto, Almeida ressalta que o processo não foi fácil: "Foi um trabalho enorme – muita coisa e muita gente envolvida. Só conseguimos fazer isso funcionar a partir do momento em que o compartilhamento foi aceito pelos programadores. Conversamos com todos os programadores, explicamos como funciona nossa solução. Há uma nova nomenclatura. Fizemos frente a tudo isso para entregar a melhor qualidade. Isso envolve um grande arcabouço tecnológico". 

Outros agentes dessa cadeia 

Para além dessas figuras que surgiram no mercado já atuando como agregadoras, há outras empresas também incorporando conteúdos por assinatura ao seu portfólio de ofertas – como a Tim, que não é um player de Pay TV. "O investimento para ser TV por assinatura é diferente do necessário para distribuir – a começar pela infraestrutura. Decidimos não fazer por complexidade e por visão de futuro. Hoje, não temos que lidar com a TV em queda, e sim com esse novo modelo de distribuição de conteúdo", comenta João Stricker, CMO da Tim. "Do nosso ponto de vista, hoje abre-se essa porta de novas formas de distribuição e possibilidade de distribuir por meio de OTTs e mecanismos que, antes, eram muito mais complexos. Temos uma maneira simples e efetiva de ofertar conteúdos aos nossos clientes. Sem dúvida hoje o usuário demanda mais esse tipo de conteúdo – as pessoas acessam muito conteúdo no móvel, a gente mede isso – seja no WiFi ou no 4G. Fora isso, tem a nova geração de consumo de conteúdo, que vive no streaming o tempo todo. São dois elementos – o novo mercado consumidor e o fato da própria tecnologia ter evoluído. Dentro dessa estratégia, se encaixa a oferta de conteúdo de vídeo". 

Stricker destaca algumas vantagens das operadoras nesse cenário. "Nosso papel é facilitar a contratação desse mundo todo de serviços", define. "Operadoras têm assets importantes, como a relação de billing com o cliente. Podemos agregar a experiência de compra em um único lugar, com gestão simplificada de acesso – esse é um elemento fundamental", diz o CMO, lembrando que muitos brasileiros não têm cartão de crédito e que possibilitar a eles a cobrança dos serviços via fatura ou recarga potencializa seu acesso. Além disso, há a escala de negociação que as operadoras possuem para uma base grande de clientes, podendo oferecer a ela serviços de forma integrada e/ou com descontos. "A experiência é um pouco diferente daquela oferecida pelos agregadores, que focam no uso. A nossa é sobre contratação e acesso", detalha. O executivo complementa: "Os modelos têm que ser pensados de forma diferente – o cliente tradicional de pós-pago tem a recorrência; o de pré-pago quer ter a flexibilidade de num momento ter o serviço e, no outro, não. O que temos trabalhado com parceiros é a elaboração de modelos flexíveis de contratação. Sendo assim, vamos empacotar tudo o que fizer sentido – produtividade, educação, saúde… Tudo isso vem para perto do móvel e vamos trabalhar nesse universo. Temos essa potência de chegar nas pessoas e rapidamente divulgar". 

Gerente de soluções e vendas de produtos digitais da Globo, Ranira Camelo viu mudanças acontecerem no Grupo a partir dessas oportunidades de distribuição infinitas da atualidade. "Quando a gente sai do cenário de TV por assinatura e vai para a distribuição do produto digital, vemos uma grande pulverização. É um mar de possibilidades. Nós fazíamos a distribuição dos conteúdos Globo para operadoras de TV por assinatura. Temos nosso produto digital, o Globoplay, mas veio a necessidade de ampliar esse escopo. As telcos continuam sendo nossas parceiras, mas temos também as TVs conectadas, os agregadores e o próprio mercado de ISPs. Há o desafio tecnológico de integração, que não é simples. Agora temos um leque muito grande e isso vai alavancar e capitalizar a distribuição de produtos digitais", analisa.

Para Camelo, no caso da Globo, o que facilitou foi ter a oferta de canais lineares dentro do mesmo produto: "A plataforma foi evoluindo bastante – em 2019, começamos a nos posicionar como OTT, comprando conteúdos internacionais, por exemplo. Já no ano passado, quando trouxemos os canais pagos, foi dentro dessa mesma plataforma – que o consumidor já entendia. Aí o que fizemos foi um empacotamento mesmo. Tem a questão de educação, claro, de explicar pro consumidor. Mas ter implementado essa estratégia onde já havia conteúdo facilitou essa oferta". 

Desafios e perspectivas para o futuro 

"O gargalo principal está na capacidade de operacionalizar tudo isso, isto é, uma capacidade técnica. Não só do lado das operadoras, mas dos parceiros também. Existe essa dificuldade, as negociações seguem certo padrão. O ponto é conseguir de fato integrar. Queremos dar uma experiência excelente ao cliente. Para uma entrega rápida e de qualidade, precisa de uma integração robusta. Tem sido com qualidade, mas não tão rápida", aponta Stricker. 

Para Camelo, por sua vez, ainda estamos num processo. "É tudo muito novo quando se fala em distribuição por meio de plataformas digitais", afirma. "Inclusive, nossa busca é por essa ampliação de parcerias. Vamos aproveitar a capilaridade das operadoras, telcos, pontos de contato com os consumidores. E tem essa questão financeira – do bolso limitado e dos meios de pagamento – que pesa bastante. Precisamos também aproveitar o potencial dos varejistas – aí sim começamos a alavancar e capitalizar de fato a distribuição dos conteúdos". Como desafios, a executiva da Globo ainda aponta as esteiras técnicas para o desenvolvimento, bem como a elaboração e formatação desses novos modelos. "Combos com parceiros funcionam bem na TV por assinatura, mas precisamos pensar nessas parcerias dentro da distribuição digital. É um cenário que ainda vai se consolidar. Daqui a um ano teremos um pouco mais de clareza", aposta. 

Já Adriana Naves menciona uma tendência ao falar sobre o futuro: modelos híbridos, que permitem a experimentação por parte do consumidor. "Acredito muito nos formatos em que o consumidor tem diferentes acessos, pode testar o serviço. Como o Globoplay, que tem planos básicos, por meio de canais gratuitos. Acho importante para ajudar na disseminação da experiência do streaming no país. O cliente entra em um serviço gratuito, consegue consumir e, aí, busca mais conteúdos". Para a executiva da Roku, o mercado brasileiro está estudando formatos. "Há muita coisa para aprender. Estamos longe de ter clareza desse cenário. Temos referências de coisas que deram certo lá fora e, ao mesmo tempo, descobrimos coisas novas aqui dentro. Temos espaço para crescer e utilizar o que vem de fora do nosso jeito, trabalhando e experimentando". 

Por fim, Almeida reflete acerca do cenário atual e olha com otimismo para o futuro. "Não tem como a gente fazer uma conta que feche com SeAC no modelo tradicional. A pressão foi tão grande que não haveria outro jeito de fazer isso funcionar, a não ser flexibilizando essa legislação. Falamos muito do SeAC, mas ainda temos uma discussão com as programadoras, que têm um negócio muito engessado. Fizemos uma manobra enorme para ter pacote SVA. Como tudo é muito novo, tenho certeza que muita água ainda vai rolar. Porém, temos uma grande novidade: todo mundo está aberto a discutir e encontrar novos modelos. Estamos em discussão o tempo inteiro. Mas, pela primeira vez, vemos o mercado todo imbuído para resolver essa questão", celebra. "Estou otimista. A pandemia acelerou fortemente nosso mercado. São vários aspectos, como a barreira tecnológica e as questões contratuais. Ao mesmo tempo, o mercado consumidor está aí, mudando e cada vez mais exigente. Mas nossos números são positivos, estamos à frente do que nós mesmos tínhamos projetado. Agora é ajustar esses pontos e fazer com que tudo ande com harmonia", conclui.

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