Mais do que agregadores, operadores devem ser orquestradores de conteúdos

Os novos modelos de TV paga, como as operadoras virtuais (MVPD) e TV everywhere, foram tema de painel nesta segunda-feira, 9 de agosto, no primeiro dia do Pay-TV Forum 2021, evento virtual organizado pelas publicações TELETIME e TELA VIVA. Entre os participantes da mesa é unânime que os serviços devam funcionar como "orquestradores" de conteúdo – e não somente "agregadores", como era a aposta há pouco tempo. 

Omarson Costa, consultor da Accenture, explica: "O conceito de TV mudou – ela não é mais o aparelho que está na nossa sala de estar, e sim uma tela, seja ela do dispositivo que for. Por isso os operadores precisam pensar de uma maneira diferente. Atualmente, existem mais de 200 OTTs no mundo. Vivemos a era da abundância. Agora, precisamos entrar na era da orquestração, onde a experiência vem antes do conteúdo. Precisamos de figuras que reúnam, num mesmo lugar, filmes, séries, TV linear, jogos e música, entre outros conteúdos".

Como exemplo de uma possível demanda que o consumidor possa ter nesse momento, ele cita uma pessoa que acabou de assistir a um filme e quer baixar a trilha sonora. "Seria importante um botão na interface do serviço que faça isso, em vez de eu ter de migrar pra outra plataforma para fazer o download. É desse tipo de orquestração de serviços que estamos falando", pontua.

Costa ressalta a necessidade de essa "orquestração" ser feita de maneira integrada e invisível para o cliente. "Ninguém chegou lá ainda, mas é o caminho. Os três naturais candidatos a esse posto são os que dominam os sistemas operacionais – Google, Amazon e Apple. Eles têm os ingredientes necessários para essa experiência", sugere. O consultor conclui: "Não é só juntar conteúdo, e sim tornar tudo isso uma experiência agradável ao consumidor. Orquestração, e não agregação. É um jogo que está só começando e está aí a grande oportunidade". 

Gustavo Fonseca, presidente do DirecTV GO na América Latina, concorda. O serviço da empresa foi lançado no Brasil e na Argentina, simultaneamente, em dezembro passado – e segundo o executivo, os bons números comprovam que o conceito do serviço é fácil de entender – uma plataforma de streaming com programação nacional e internacional ao vivo e on demand, em um mesmo aplicativo, que pode ser acessado de diferentes devices. "A DirecTV GO funciona como um shopping. Por isso concordo que quem orquestrar melhor todos esses serviços, que são complementares uns aos outros, vai levar essa briga. Com a DirecTV GO, nós nascemos numa metodologia ágil. Há muitos caminhos possíveis, mas como a indústria muda muito rápido, precisamos estar sempre trabalhando para melhorar a experiência. Não é só fazer um produto e entregar. Um dos grandes desafios da indústria hoje é fazer com que essa orquestração aconteça em cima de serviços e plataformas que você não domina. Aprender a se adaptar a elas é nosso objetivo, mantendo a homogeneidade da experiência em todos os aparelhos e redes", aponta. 

TV tradicional e OTT: produtos complementares 

Os executivos acreditam que o modelo de TV tradicional e a distribuição OTT são complementares, ou seja, irão seguir coexistindo. "Acreditamos muito nessa complementaridade, e não numa substituição do modelo tradicional por OTT. Analisando friamente, canais de esporte, notícias e documentários, por exemplo, ainda têm sua maior audiência no tradicional, enquanto filmes, séries e infantis ganharam espaço no streaming", afirma Ricardo Falcão, diretor regional de operações da Unidade Residencial da Claro. Por isso é tão importante que haja essa figura do orquestrador. "Entendemos que há uma oportunidade grande de agregar tudo isso e o diferencial lá na frente tende a ser a melhor experiência para o cliente. Estamos trabalhando fortemente no último ano em estruturas tecnológicas para conseguir agrega tudo isso. O OTT está aí, é uma realidade, mas o tradicional segue presente – de qualquer forma, ele também tem que evoluir, tecnicamente e na experiência. E estamos atentos a isso", completa Falcão. 

Francisco Tecles, da Oi TV, também os enxerga como produtos complementares: "A Oi quer investir na sinergia entre os produtos. O OTT já é tão presente que é esperado pelos clientes. Nas Olimpíadas, por exemplo. Foi muito comum as pessoas começarem a assistir um jogo em casa, na TV grande, e continuar na rua, pelo celular. Já é uma demanda do mercado, o cliente espera isso. Agora, o objetivo é oferecer o melhor dos dois mundos, em uma plataforma estável, com boa usabilidade, processo de login fluido, sem atrasos. O mercado de OTT está definindo altos parâmetros de qualidade e, por isso, temos que entregar aos clientes a melhor experiência na forma de consumo que ele quiser". Nesse sentido, Tecles enfatiza: "Ao usar as plataformas de OTTs percebemos que eles estão trabalhando e evoluindo. A usabilidade muda a cada 15 dias, praticamente. As operadoras não podem ficar para trás e têm que entender essa urgência. Essa realidade demanda um novo cuidado. Temos que ser ágeis na hora de entregar isso. O grande desafio em termos de tecnologia é esse mercado de OTT definindo padrões de usabilidade com investimento absurdo e velocidade. Se a operadora quer oferecer o mesmo tipo de experiência, precisa ser rápida e estar atenta e investindo nesse tipo de coisa". 

Experiência supera o conteúdo 

Para Omarson Costa, o conteúdo exclusivo segue sendo diferencial, mas é vantagem temporária: "As pessoas têm acesso a uma oferta tão grande hoje em dia que os conteúdos se tornam perenes muito rápido. Não acredito que só o conteúdo vá atrair e manter a base de clientes – e sim essa experiência integrada". "O negócio de TV vai se tornar software e eu fico feliz de ver as operadoras se movendo dentro desse universo. É uma movimentação importante para toda a indústria", acrescenta.

Para o consultor, se as companhias não se adaptarem rápido a essa demanda pela experiência perfeita para o cliente, não conseguirão competir com os OTTs. "Não é só juntar canais – isso não atrairá os consumidores a longo prazo. O que atrai é a experiência integrada – jogos, audiovisual, música. Se não integrar tudo isso, estará apenas vendendo um monte de coisa separada. Agregar tudo num só lugar um monte de gente já faz. Isso não é mais diferencial. O que retém o consumidor é a experiência como um todo", reforça. 

Os operadores parecem estar conscientes dessa nova demanda. "É um novo contexto, totalmente diferente do que conhecíamos. Para o consumidor, é fácil assinar um serviço e depois cancelá-lo. Não tem fidelização ou multa. Por isso, o cliente está o tempo todo te testando – a cada uso, a cada play, você está em cheque. Se ele não gostar, vai embora. Por isso o contexto da experiência é muito mais desafiador", diz Tecles. 

Desafios do empacotamento 

Para Falcão, o empacotamento está, mesmo para os OTTs, muito semelhante ao modelo do SeAC: "A gente tem tido negociações e renovações de contrato com todos os programadores. Hoje, já se consegue uma certa flexibilidade. Mas é tudo ainda muito similar ao que é no SeAC. A questão do empacotamento e distribuição dos canais não é uma conversa simples. O cliente quer mais autonomia e flexibilidade – mas, do ponto de vista do programador, ele tem uma estrutura montada, e para ele o conteúdo é um grande diferencial; a exclusividade e originalidade do conteúdo faz diferença. Exige-se um capital intensivo de investimento para se manter nesse nível de inovação". Por isso, o executivo diz: "É necessário discutir se de fato esse é o momento de abrir os empacotamentos – e como abri-los. Nessa discussão, é importante ter cuidado para não criarmos outras assimetrias. Já vivemos uma, que é a questão regulatória e tributária. Tenho minhas preocupações – acho que devemos discutir o quanto a gente abre os empacotamentos para o mercado como um todo e para quem tem receitas fortes em cima do tradicional. O que garante a melhor experiência é um gerenciador de conteúdos capaz de fazer isso". 

Nesse debate, Fonseca assume: "Os canais têm que ter relevância. Todos eles. É difícil justificar o empacotamento tradicional da TV por assinatura para quem tem gostos muito específicos. Quando você fala com diversas pessoas de uma casa, de uma família, você volta a justificar a existência de diversos entretenimentos".

O executivo aponta mais um desafio: "A proliferação de marcas é um negócio difícil de sustentar. Hoje, é uma confusão. As pessoas não sabem onde ver o que. Por isso o uso de metadados para recomendação é muito importante. Temos acesso a uma série de dados e precisamos usá-los junto dos parceiros, os programadores. Isso é mais importante do que a questão de empacotar ou não". Ele explica que a DirecTV GO se posiciona como TV e streaming juntos porque a oferta de conteúdos é sempre atraente, tanto no linear quanto no não-linear. "Nós tentamos indicar os conteúdos quando a pessoa entra na plataforma. O desafio é indicar o certo. Estamos trabalhando nesse sentido, mas ainda há muito para fazer em termos de recomendação e inteligência de dados. Precisamos pensar em como resolver os problemas por meio da tecnologia – esse é o objetivo. Devemos nos tornar uma empresa tech", declara. 

Essa também é uma preocupação da Claro. "Buscamos essa melhor experiência para o cliente interagindo com ele, recomendando de forma assertiva e garantindo uma busca integrada independente de onde esteja o conteúdo. Uma das grandes dificuldades do consumidor hoje é saber da existência dos conteúdos no serviço. É nossa obrigação – e isso passa a ser um diferencial – fazê-lo acessar esse conteúdo. Estamos gastando energia em cima disso e podemos esperar uma grande transformação nesse sentido. Vamos colher os frutos em 2022", afirma Falcão. 

"Conteúdo em si, de uma certa maneira, não é tão difícil de fazer. Tecnologia, sim. Não existe no mundo do streaming isso de comprar uma plataforma pronta. As tecnologias se desenvolvem em casa, cada player desenvolve a sua. Aí precisamos de talentos para resolver – e isso é um traço essencialmente de uma companhia tech. Os dados devem ser a nova cultura", conclui Costa. 

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