Entidades pedem inclusão de crimes contra direitos autorais na reforma do Código Penal

Entidades representativas do setor fonográfico e audiovisual publicaram carta aberta aos parlamentares brasileiros solicitando maior punição contra crimes contra a propriedade intelectual na reforma do Código Penal Brasileiro (PLS 236/2012).

No documento, as entidades pedem a inclusão de emendas propostas pelo setor, a propósito da Reforma do Código Penal, cujo relatório final será votado nesta quarta, dia 10, na Comissão de Constituição e Justiça do Senado Federal. O relatório do senador Vital do Rêgo deixou de considerar as propostas.

As emendas propostas pelo setor solicitam a persecução penal dos crimes de pirataria de obras mediante ação penal pública incondicionada e não mediante queixa crime, a criação de uma norma penal em branco para violação de direitos autorais e a criação de novo tipo penal para punir a captura de obras audiovisuais ou de sua trilha sonora em salas de cinema.

Para as entidades, a necessidade da inclusão justifica-se pela crescente prática de delitos contra a propriedade. Segundo elas, a reforma do Código Penal é o instrumento propício para contemplar as sugestões.

Assinam conjuntamente a carta: MPA (Motion Picture Association), ABTA (Associação Brasileira de Televisão por Assinatura), ABPD (Associação Brasileira de Produtores de Discos), UBV&G (União Brasileira de Vídeo e Games), Abert (Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão), SICAV (Sindicato Interestadual da Indústria Audiovisual), ABPI (Associação Brasileira da Propriedade Intelectual), FNCP (Fórum Nacional contra a Pirataria e Ilegalidade), e ETCO (Instituto Brasileiro de Ética Concorrencial).

Confira o documento na íntegra:

Excelentíssimo Senhor Senador
Senado Federal
Brasília, DF

Ref.: PLS 236/2012, que reforma o Código Penal Brasileiro

Prezado Senador,

Na qualidade de representantes das entidades signatárias, gostaríamos de primeiramente parabenizar a iniciativa do Senado Federal em propor uma reforma ao atual Código Penal, abordando matérias controversas e polêmicas, sem dúvida importantes para a sociedade brasileira.

Por outro lado, vimos à presença de V.Exa. expressar nossa preocupação com alguns aspectos do PL 236/2012, especificamente no que tange aos crimes cometidos contra direitos autorais, que inclui a pratica de pirataria.
De acordo com o CNCP – Conselho Nacional de Combate à Pirataria, nos últimos 8 anos, a pirataria e a falsificação de produtos gerou um prejuízo de R$ 8,5 bilhões. Este valor foi calculado com base nos produtos piratas e falsificados apreendidos.

Contudo, treze setores produtivos, reunidos no FNCP – Fórum Nacional Contra a Pirataria e Ilegalidade apontam perdas de mais de R$ 24 bilhões, com evasão fiscal decorrente da pirataria e falsificação estimada em R$ 10 bilhões ao ano.
Imbuídos da certeza da necessidade de se punir efetivamente os crimes contra direitos autorais, as entidades signatárias vêm a V.Exa. expressar a sua preocupação com o Titulo III –Dos Crimes Contra a Propriedade Imaterial do PLS 236/2012, vez que representa um retrocesso na proteção aos direitos dos autores brasileiros e estrangeiros.

Depois de análise profunda às alterações propostas pelo PLS 236/2012 gostaríamos de ver consagradas alterações que visem efetivamente proteger os direitos dos autores e demais titulares de direitos autorias e conexos, conforme detalhes mais adiante:

1. A persecução penal dos crimes de pirataria de obras deveria ser mediante ação penal pública incondicionada e não mediante queixa crime, como prevê o PLS 236/2012 (art. 184 do Relatório);

2. Criação de norma penal em branco para violação de Direitos Autorais;

3. Criação de novo tipo penal para punir a captura/gravação de obras audiovisuais e/ou de
sua trilha sonora em salas de cinema.

1. Art. 184 (do Relatório) – Ação Penal

O PLS 236/2012 altera a regra do atual Código Penal para dispor que os crimes contra direitos autorais serão perseguidos mediante ação privada mediante queixa. A Comissão de Juristas justificou esta alteração na “hermenêutica constitucional, que expressa uma tendência em restringir as hipóteses de ação penal privada no ordenamento jurídico brasileiro, admitindo-a, desde que concorrente com a pública condicionada à representação, quando a ofensa ao bem jurídico penal diga respeito aos direitos da personalidade, especialmente à honra das pessoas.”

Todavia, a Comissão deixou de atentar para o fato de que a natureza juridica dos direitos autorais é diversa da natureza de outros direitos de propriedade intelectual. Os doutrinadores e extensa jurisprudência sobre este assunto entendem que os diretios autorais são um direito sui generis, pois é composto por dois elementos: econômicos e morais.

Portanto, a manutenção do status quo em relação à natureza da ação penal é muito importante para a correta e eficiente dissuação de infrações contra direitos autorais e conexos na esfera criminal.

Além disso, os direitos autorais referem-se à proteção da expressão de toda a sociedade e a sua protecão, por consequência, beneficia a todos. Este é mais um argumento que justifica claramente a necessidade de atuação do Ministério Público, como fiscal da lei, em nome da sociedade como um todo, o que não seria possível se a ação fosse de natureza privada em todos os casos.

Carlos Alberto Bittar, um dos mais respeitados especialistas brasileiros em direitos autorais, afirma o seguinte quando escreve sobre a tutela penal dos Direitos de Autor: “Com efeito, esses delitos, há que se ressaltar, de um lado, a proteção da personalidade do autor realizada por meio dos direitos morais, e, de outro, a da obra em si, como entidade autônoma e  integrante do acervo da coletividade, daí o tratamento especial recebido na esfera penal, pois, criação, como anotamos. É que a violação a direitos autorais transcende aos limites meramente pessoais, para atingir a própria sociedade como um conjunto, na proteção dos valores maiores de sua expressão artística, literal ou científica” (Carlos Alberto Bittar, in Direito de Autor, 4ª Edição, 2002, p. 145, Ed. Forense Universitária).

É claro, portanto, que o Código Penal atual é bastante adequado particularmente no que toca a natureza dos crimes contra os direitos autorais. Deste modo, as entidades signatárias acreditam que o texto atual do Código Penal deva prevalecer.

2. Criação de norma penal em branco para violação de Direitos Autorais

O PLS 236/2012 não adotou a norma prevista no caput do artigo 184 do atual Código Penal, que prevê a norma penal em branco para a violação de direitos autorais e conexos, o que certamente terá efeitos negativos sobre a capacidade dos autores, artistas e titulares de direitos autorais e conexos de exercer plenamente o seu direito de ingressar com ações judiciais criminais. Em um mundo digital em constante mudança é muito difícil para os legisladores estabelecer uma lista completa de condutas típicas, e, a adoção de um artigo de lei amplo que permita o uso de legislação complementar para a sua regulamentação, seria essencial para evitar a criatividade dos infratores em encontrar novas maneiras de cometer crimes, que não estão no escopo da legislação, agindo completamente fora da lei.

Acresce, que não há razão no nosso entendimento para que os direitos relacionados ao software sejam de tal forma diferentes dos direitos de autor a ponto de o primeiro admitir a norma penal em branco e o segundo não.

É a própria lei de programas de computador que equipara os direitos relativos a eles aos direitos autorais (artigo 2º, da Lei 9.609/98). Sendo assim, resta claro que suas naturezas são semelhantes e, portanto, merecem proteções equivalentes.

Ora, o que se pretende tanto no que tange aos softwares quanto aos direitos autorais é penalizar as violações dos respectivos direitos. As formas de violação de ambos os direitos, atualmente, são extremamente semelhantes (e.g. pirataria de software e pirataria de filmes). Por essa razão, uma vez que os crimes de violação de programas de computador prescindem de tipificação “completa”, admitindo a regulamentação posterior, não há porque limitar a proteção na esfera penal dos direitos autorais.

Cumpre-nos mencionar que, conforme histórico desta discussão dentre autores e titulares de direitos autorais, a vantagem da norma penal em branco é que se mantenha certa generalidade do tipo penal de modo que ele possa englobar quaisquer condutas possíveis de serem praticadas atual ou futuramente, não importando os meios/formas, uma vez que a tecnologia está em constante evolução e torna-se impossível a previsão de todas as formas de violação de direitos autorais.

Portanto, as entidades signatárias acreditam que trazer de volta o caput do artigo atual 184 do Código Penal será um passo importante para evitar que o novo Código Penal se torne ultrapassado desde sua promulgação.

3. Gravação de ilegal de filmes em salas de cinema

Atualmente, 90% dos filmes recém lançados em cinema são disponibilizados ilegalmente na Internet, e são provenientes de gravações ilegais em salas de cinema. A gravação de obras audiovisuais e/ou trilha sonora em cinemas é uma nova forma de pirataria e uma das mais danosas, vez que possibilita que a cópia pirata esteja disponível nos mercados negros e camelôs no dia seguinte de sua estreia no cinema.

Para o cinema nacional, os resultados dessa prática são devastadores, pois as produções brasileiras devem recuperar os investimentos em nosso próprio território.

Por constituir uma das principais fontes que resultam na divulgação indevida de filmes na Internet e nos mercados negros, a captação de imagens e/ou sons de obras audiovisuais em salas de cinema deve ser combatida de todas as formas.

Com a finalidade de punir aqueles que captam obras audiovisuais e/ou suas trilhas sonoras em salas cinema, as entidades signatárias sugerem a adoção do artigo abaixo. Apenas a captura e a gravação de obras audiovisuais e/ou de suas trilhas sonoras em salas de cinema é que serão criminalizadas.

“Art. 178 (versão do relatório).

§___. Violar direitos autorais por meio da captura, total ou parcial, por qualquer meio, sem o consentimento do titular dos direitos autorais, de obra audiovisual e/ou de sua trilha sonora que tenha sido lançada para exibição cinematográfica. Pena – prisão, de dois a cinco anos.”

Com a adoção das alterações sugeridas, as entidades signatárias entendem que as obras de autores brasileiros e estrangeiros estarão efetivamente protegidas e que o novo Código Penal adotará normas modernas e eficazes de combate à pirataria, que traduz a crescente importância do Brasil no cenário internacional.

Agradecemos a sua atenção e ficamos à disposição para fornecer quaisquer informações adicionais.

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