Nesta terça-feira, dia 11 de outubro, a Head of Content Development and VP de Kids, Young Adults e Family da Disney para a América Latina, Cecília Mendonça, comandou um talk no RioMarket, braço de negócios do Festival do Rio, falando do trabalho da plataforma Disney+ com a produção local. Para ela, o principal pilar do conteúdo original local é que ele tenha condições de viajar para outros países – e isso se dá principalmente por meio da conexão emocional da história. "A barreira do idioma está cada vez menor. Consumimos conteúdos de outros lugares, principalmente Estados Unidos e Europa, a vida inteira, e sempre nos relacionamos e nos conectamos com eles. Temos que pensar que isso pode acontecer ao contrário também, isto é, com outros públicos se conectando com as nossas histórias. Precisamos gerar essa conexão fora daqui", apontou.
Mas nesse sentido, ela reconhece que o desafio é muito grande, especialmente dentro do próprio Brasil, uma vez que, segundo a diretora, ainda não foi possível gerar aqui um interesse sobre as nossas próprias séries locais: "O desafio começa com a gente mesmo. Eu quero muito fazer a produção local nacional viajar. Mas ainda estamos aprendendo como fazer isso. A plataforma é nova, temos muita coisa pra entender. Eu sou brasileira, mas também cuido dos conteúdos de Argentina e México, e ainda não conseguimos ocupar o mesmo lugar que eles conhecem. Ouço muito pessoas falando que entram na Disney+ e já vão direto pra Marvel. Mas nós mesmos temos que assistir nossas produções. Se a história for sucesso no Brasil, já é considerada uma história de sucesso. Se ela não funciona em casa, fica mais difícil".
Para Cecília, um fator importante nesse contexto é o fato de que, no Brasil, até pouco tempo não havia um interesse em produzir histórias que pudessem viajar. "Esse processo foi muito influenciado pra Globo, por exemplo, que sempre produzir localmente para o público daqui e sempre foi bem. Muito por conta do desconhecimento de tudo o que a gente poderia realizar por aqui, acabamos sempre fazendo pra dentro mesmo. Diferente do México, que fez pra fora. E isso vale para a nossa maneira de escrever, produzir e dirigir", opinou. "Temos que ter mais profissionais qualificados. Como debatemos ontem, no próprio evento, essa é uma questão atual. O Brasil é o segundo mercado do mundo. Todas as plataformas querem crescer aqui. Mas como faremos isso sem valorizar o conteúdo local? O primeiro que tem que assistir é o consumidor brasileiro. Tem que assistir, reconhecer que é bem feito, comparável com o que eles consomem de outros países. O marketing não é suficiente e a competição é enorme, por isso é tão importante. E os profissionais também precisam ter em mente que não basta produzir pra cá, pra bolha. Todo o mundo tem que assistir também. Temos que valorizar o nosso conteúdo", reforçou.
Inovar mantendo os valores
A diretora contou que, hoje, a Disney busca "abrir mais o leque", no sentido de produzir focando um público um pouco mais velho do que o infantil, que sempre foi a prioridade: "Tentamos inovar dentro de um mesmo formato que sabemos que funciona. A ideia é trabalhar nessa elasticidade da marca. Tem valores que nunca deixaremos de lado – somos uma marca otimista e nossas histórias sempre passam uma mensagem, têm uma moral – mas precisamos abrir esse leque para atingir novos e diferentes públicos".
Sobre a questão do algoritmo, Cecília diz que ele ainda não é usado na companhia no sentido de ditar coisas que funcionam. "Acho que o algoritmo é mais legal para indicar tendências e dar sugestões ao público sobre o que assistir", comentou. Os direcionamentos do que eles vão produzir vem mais de pesquisas sobre o que o público está assistindo, além desse caminho dos formatos "clássicos" da Disney: "Música, por exemplo, é algo que teremos sempre, tem muito disso na nossa identidade. Mas estamos de olho nos 'white spaces', isto é, o que as pessoas estão procurando e que nós ainda não estamos oferecendo. Podemos arriscar e ver se funciona".
Projetos de não-ficção, por exemplo, não estão entre os principais interesses do Disney+. "Acredito que as plataformas não são tão amigáveis para o non-script, que é um conteúdo que fala muito do que está acontecendo no momento, é atual, e até estar pronto para estrear, leva de seis meses a um ano. Aí pode acabar perdendo a relevância. Nesse sentido, os projetos precisam ser bem atemporais. É um desafio enorme – mas quando funciona, funciona muito bem. Estamos começando a explorar isso, com reality e documentários. Mas a estrela da plataforma segue sendo a ficção", enfatizou.
Estratégia
A Disney+ já tem um pipeline de projetos originais nacionais com estreias próximas. É o caso de "Mila no Multiverso", uma produção em parceria com a Boutique Filmes, com lançamento previsto para dezembro deste ano. É um projeto de sci-fi voltado ao público na faixa dos 10-12 anos de idade. Outra aposta é em "Tá Tudo Certo", uma comédia romântica em quatro capítulos escrita por Raphael Montes e que traz um elenco formado por artistas da música, como o duo Anavitória e o cantor Vitão. E entre os originais nacionais já disponíveis na plataforma, estão "Tudo Igual…SQN", que foi o primeiro projeto brasileiro do Disney+, cuja segunda temporada já está confirmada, e "O Coro – Sucesso Aqui Vou Eu", série que faz uma homenagem ao teatro musical e à música popular brasileira e que foi criada, escrita e dirigida por Miguel Falabella.
"Meu feeling é de que precisamos valorizar esse conjunto de projetos nacionais para passar essa mensagem de que somos produtores locais também, gerar essa cadência. Estamos com, em média, um lançamento brasileiro a cada dois ou três meses. O público daqui vai começar a entender que produzimos no Brasil também. Acho que quando descobrem uma quarta série original nacional lançada pela plataforma, desperta o interesse em voltar e conferir a primeira. A valorização precisa acontecer mais por aqui", finalizou.