O painel "Do OTT ao linear: os caminhos e prioridades na distribuição", realizado nesta terça-feira, dia 13 de agosto, no Pay TV Forum 2024, evento organizado pelas publicações TELA VIVA e TELETIME, reuniu canais e programadores para debaterem a definição de prioridades no cenário multiplataforma, onde existem inúmeros modelos de negócio e formatos possíveis para tentar encontrar o consumidor onde ele estiver. Num contexto em que produzir conteúdo ainda tem um custo alto, e que fica cada vez mais caro, é importante buscar modelos alternativos de distribuição e amplificar esses meios de entrega de forma a incrementar as receitas e pagar essa conta de produção.
Antigos personagens, novos negócios
As estratégias para o ambiente digital, onde essas possibilidades são mais flexíveis, foram o ponto inicial da conversa. Nesse sentido, o SBT está entrando agora no mercado das plataformas de streaming próprias – o que pode causar um certo estranhamento por conta desse timing. "O SBT sempre esteve presente no ambiente digital. A gente já está no streaming há muito tempo se você for pensar no YouTube como a maior plataforma disponível hoje. Temos mais de dez anos de parceria com eles, num modelo de negócio muito interessante, que trouxe uma rentabilidade importante e awareness para a nossa marca nesse contexto de mudança de comportamento. Mas isso acabou ficando limitado. Nessa trajetória, aprendemos muito, e entendemos que seguir só ali não seria o ideal", contextualizou Carolina Gazal, diretora de conteúdo multiplataforma do SBT.
A executiva adiantou que o +SBT, serviço de streaming do canal que reunirá, de forma gratuita, simulcast, catálogo VoD e canais FAST, e que será lançado oficialmente neste domingo, dia 18 de agosto, durante o programa "Silvio Santos" (ele já pode ser baixado, mas em versão beta), contará com o que ela chama de estratégia ousada. "Será uma forma muito democrática de distribuição e negócio. Estaremos em diversos meios. Com aplicativo próprio e na TV conectada – no lançamento já na Samsung e LG e, mais tarde, em outras plataformas, como a Roku", revelou a executiva. O produto é fruto de parcerias de tecnologias do SBT com várias empresas – mas, em termos de conteúdo, o canal já trabalha com parceiros há bastante tempo. Há acordos mais tradicionais, como o com a Warner Bros. Discovery, e outros mais recentes, como Prime Video e Disney+. "Temos uma mentalidade muito democrática para os nossos negócios. Entendemos que nosso conteúdo só será sustentável nessas relações de ganha-ganha. Mediante toda essa oferta, precisamos entender onde estão os melhores negócios", avaliou.
Um caso um pouco diferente é o da CNN que, no Brasil, ainda pode ser considerada uma nova entrante. A versão local do canal chegou em março de 2020, praticamente junto da pandemia de Covid-19, com inúmeros desafios e imersa em um ambiente já multiplataforma e marcado pela queda de assinantes da TV paga. "Já nascemos com essa mentalidade multiplataforma, presente em diferentes programadoras e ativos ainda no YouTube, com site próprio e perfis nas mídias sociais. Hoje, temos mais de 25 milhões de seguidores considerando todos os canais de mídias sociais. Mais recentemente, estreamos no Prime Video e na TV conectada. A estratégia não poderia ser diferente. Como um canal único, temos essa agilidade para chegar em todas as plataformas rapidamente. E sempre frisando nosso entendimento de complementaridade de plataformas, entregando o conteúdo que cada uma pede, na linguagem específica", explicou Fernanda Tomasoni, diretora executiva da CNN Brasil.
Multi-distribuição para pagar a conta do conteúdo
Saindo um pouco daqueles atores que partem de um canal único e central, como o SBT e a CNN, estão programadores que cuidam de diferentes marcas de forma simultânea – como a Newco, braço de canais pagos do Grupo Bandeirantes. A Band tem um streaming próximo, o Band Play, além de uma presença expressiva no YouTube. Mas a Newco especificamente, como produtora de conteúdo de diferentes canais, sentiu a necessidade de estar com seu produto dentro dos bundles daqueles que estão fora da tradicional TV paga e lançou recentemente, há pouco mais de um mês, o New Brasil Plus, que contempla conteúdos da Band e da Newco, assim como de outros parceiros, como Paramount. E, ainda antes disso, estreou o canal New Brasil, que vem na esteira da estratégia de ampliar o alcance dos conteúdos produzidos. Marcello Zeni, diretor de distribuição e growth na Newco, pontua que estar nas linhas de distribuição abertas como forma de cativar o público para ir ao pago faz parte dos interesses do grupo.
"Estamos sempre no caminho B2B para aumentar nossas parcerias. Temos um grande investimento em produção e uma gama de trabalho direcionado regionalmente – queremos, inclusive, trabalhar cada vez mais na estratégia regional com os players", disse. Por enquanto, ir direto ao consumidor não está nos planos. "Se o conteúdo é rei, a distribuição é rainha. Temos que olhar para onde está nossa frente de distribuição e fortalecer cada vez mais nossas parcerias", reforçou.
Um dos cases mais interessantes de distribuição "alternativa" da Newco é um acordo firmado com uma distribuidora de vinhos – que tem uma base de assinantes, publica uma revista sobre vinhos e, como tem um clube de clientes, também sofre com churn, precisa aumentar a base e fidelizar seu público. "Nosso trabalho de formiguinha passa por detectar diferentes frentes e setores de distribuição e varejo que trabalham com assinantes, enxergam valor no nosso conteúdo e querem agregar", resume.
Também do ponto de vista de uma empresa que opera um guarda-chuva de diferentes canais, Mauricio Alvarenga, managing partner e co-CEO da Stenna, considera que a estratégia de distribuição está cada vez mais complicada uma vez que, hoje, são inúmeras as formas de distribuir. Há 20 anos, por exemplo, era mais fácil rentabilizar o conteúdo porque a distribuição era mais concentrada, e o pagamento vinha da operadora ou da publicidade: "Hoje, a oferta de conteúdo cresceu muito, e o bolo da publicidade ou da venda desses conteúdos não acompanha esse crescimento. Por isso, a fatia que sobra dessa venda está cada vez menor. Queremos distribuir nosso conteúdo em todas as telas. Também enxergamos as audiências como complementares e buscamos estar onde o telespectador quer. Temos conteúdos e canais na Pay TV, no FAST e no VoD. Tentamos ganhar um pouco de receita em cada janela para conseguir pagar o custo da produção desse conteúdo, que é muito alto".
Alvarenga ainda menciona que o cenário é ingrato para os novos entrantes, que pegam esse mercado totalmente diferente, onde dificilmente um novo canal consegue receber das grandes operadoras. "Há um desequilíbrio da cadeia de custo da produção de conteúdo e receitas possíveis – até de forma injusta", afirmou. Para exemplificar seu ponto, ele cita o canal UOL, que será lançado na TV paga, operado pela Stenna, em outubro deste ano. "Tenho certeza que o canal tem relevância e qualidade maiores do que muitos canais da Pay TV, mas é difícil conseguir rentabilidade de assinantes".
O modelo FAST e a relação com as marcas em geral
Nesse sentido de diversificar a distribuição e encontrar novos caminhos ele cita o FAST – mas ressalta que, apesar de ser uma receita incremental, ainda não é o foco. "Os projetos audiovisuais são muito caros. Não dá pra fazer um produto exclusivo para o FAST. Na receita ali você tem um sócio – quem vende é a plataforma, aí ela te dá um pedaço. O FAST ainda não paga a conta e o mercado brasileiro não está maduro para pensar em produzir exclusivamente para esse segmento", declarou. No entanto, ele destaca que a programação dos canais que estão no linear e no FAST é diferente entre as janelas – é o caso do ZooMoo Kids, por exemplo, que apresenta grades diferentes de forma a valorizar quem paga cada conta.
Tomasoni, da CNN, vê o FAST de forma semelhante: "O bolo do investimento publicitário é único. Boa parte está no digital, é verdade, mas ainda não encaixamos o FAST. Não conseguimos reverter em valor de investimento de publicidade, ou alcance e audiência, com uma entrega de valor para as marcas". Comentando sobre as novas maneiras de trabalhar com publicidade, ela citou a plataforma de eventos da CNN Brasil – que, somente no primeiro semestre, realizou 12 encontros, sobre diferentes assuntos. "Estamos atrelados aos interesses das marcas e da audiência para fazer uma entrega 360. O canal linear é o carro-chefe, mas não entregamos apenas audiência. Temos credibilidade e jornalismo de qualidade, e as marcas querem estar próximas disso".
"Janelas são complementares, mas o dinheiro que está em jogo é o mesmo", analisa a diretora do SBT. "Aí entra a criatividade de negociar e criar modelos que sejam sustentáveis. Estamos trabalhando, neste momento, com muito conteúdo licenciado e original, mas também temos um acervo muito grande onde faz sentido envolver uma marca, fechar um projeto de publicidade", contou. Prestes a lançar o +SBT, ela comentou que, entre os canais criados para a plataforma, está o +Saudade, que trará uma grade de conteúdos dos anos 90-2000. "Existe uma febre de conteúdos nostálgicos e uma demanda por esse conforto que é assisti-los. Tivemos muito interesse das marcas na plataforma – vamos lançar o produto com as cinco cotas comercializadas – mas o primeiro canal onde fizemos essas vendas foi justamente o +Saudade, que negociamos com O Boticário. Já o canal +SilvioSantos, onde 'todo dia é domingo', terá parceria da Unilever. Ou seja: ainda podemos contar com o dinheiro da publicidade – mas temos que oferecer um produto interessante e, no nosso caso, que seja diferente do que oferecemos na TV aberta".
Futuro do jornalismo: regionalidade e nichos
Falando em jornalismo, os debatedores ainda vêm bastante espaço para o seu crescimento. Para Gazal, existem oportunidades tanto para conteúdo quanto para a forma como ele chega nas pessoas – seja via redes sociais, plataformas próprias ou parcerias. "As questões regionais ainda representam um universo que nós, como brasileiros, temos a missão de explorar. É fazer chegar a informação correta", pontuou.
Zeni concorda que regionalismo é a palavra-chave. "A estrutura da empresa está voltada para o regional. Temos cada vez mais ferramentas e formatos que nos permitem aparecer mais para o mercado brasileiro. A BandNews trafega pelo país inteiro em eventos", comentou. O executivo ainda traz para a conversa o conteúdo de nicho dentro do jornalismo – dentro da Newco, ele já se apresenta de forma dividida: há canais especializados em agronegócios, notícias de esportes e a própria BandNews, por exemplo. Alvarenga, por sua vez, complementa: "Além de pensar regionalmente, temos que pensar nesses nichos dentro do jornalismo que estão ocupando espaços pendentes. Nós operamos, por exemplo, o canal BM&C News, que é focado em mercado financeiro. O mercado brasileiro tem espaço para isso".
E, nesse cenário, a segurança da marca importa muito – como é o caso da CNN Brasil. "Claro que não comemoramos tragédias, mas nesses momentos vemos nitidamente a relevância e credibilidade do canal", observa Tomasoni, que também aponta caminhos para canais jornalísticos de nicho. "Temos projetos específicos e nichados para explorar em breve", adiantou.
Parcerias com os ISPs
Na última segunda, 12, um outro painel do evento abordou a importância do conteúdo nas ofertas dos ISPs, que hoje consideram que essas parcerias são fundamentais para agregar valor às suas ofertas de banda larga. Zeni, no entanto, não acredita que os ISPs já perceberam o valor do conteúdo da forma necessária. "Como nos últimos dez anos se apresentaram muitos formatos para entrega de conteúdo, o cenário deu uma desestabilizada. Agora que estamos entendendo melhor, até para combater pirataria. O trabalho dos ISPs já tem muitas variáveis – então atuar com ele de forma que ele perceba o valor do meu conteúdo e queira enaltece-lo é um desafio. Não adianta só falar em treinamento e comunicação. Tenho que mostrar meu valor, explicar como é essa conversa". Isso não significa que ele não atue junto desses operadores – só no último mês foram fechadas quatro parcerias nesse sentido. "Estamos sempre avaliando novas formas de distribuir", esclareceu.
Os ISPs são parceiros de suma importância para a Stenna, que percorreu o Brasil de ponta e ponta para firmar esses acordos e garantir sua presença no país como um todo. "Hoje, temos cerca de 150 a 160 ISPs que são clientes de pelo menos algum dos nossos canais, e esse número cresce a cada dia. E também buscamos sempre oferecer ofertas combinadas, para que eles queiram levar para suas operações todos os canais do grupo. Operadores virtuais também entram nessa equação", acrescentou.
Nesse contexto, Gazal sinaliza uma preocupação a respeito de como fica a cabeça do consumidor com tanto conteúdo, ferramentas, possibilidades de consumo e número de janelas: "Principalmente o público brasileiro. No SBT, estamos sempre pensando e brasileiro e procurando sair da nossa bolha de São Paulo e Rio de Janeiro. O país é muito maior do que a nossa bolha e precisamos estar atentos a isso para que possamos levar conteúdos relevantes a esse universo tão gigante".
É importante comunicar corretamente
Por fim, Zeni aponta um desafio na comunicação com o telespectador, que é um problema semelhante ao que a Pay TV enfrentou quando encontrava dificuldades para fazer o público entender todos os canais aos quais ele tinha acesso. "Hoje, aumentou demais a quantidade de lugar onde é possível assistir ao meu conteúdo. Mas se mesmo tendo um produto de qualidade eu não conseguir comunicar isso para as pessoas, não adianta estar no FAST, no YouTube ou o que for. Hoje, não vejo a gente se movimentando para isso, e precisávamos. Quem nos distribui tem outros pontos de interesse para além do conteúdo. Não adianta eu estar numa grande plataforma de streaming se ela esconde meu produto lá dentro. Não é por maldade, mas o universo é imenso. O desafio está em mostrar a qualidade que temos. O FAST tem números interessantes, às vezes até audiência maior do que a TV paga, o que significa que o público vê qualidade no conteúdo. Mas precisamos mostrar isso para mais pessoas".
Muito se fala em Parcerias, comunicação, mas eu vejo que a prática é bem diferente, as dificuldades impostas por Programadoras e distribuidoras de conteúdos faz aumentar muito mais a pirataria em determinados nichos, um exemplo disso é o nicho de hotelaria que vem tendo demanda mas quem está dentro das regras também sofre com a pirataria e falta de um modelo de negócio mais "negociável".