Alex Braga fala no fim da cota de tela em 2021 e defende revisão de fomentos com base em "ingressos e audiências"

O diretor-presidente da Ancine, Alex Braga, participou do primeiro dia de programação da Expocine 2020 – nesta edição, em formato totalmente virtual – falando sobre os desafios da reformulação e da modernização da política pública para o audiovisual brasileiro. Braga abriu sua mesa afirmando que o início de sua gestão foi um período de atuação solitário, no qual ele respondeu pessoalmente por toda a agência e encarou esse momento de transição como uma oportunidade de mudança. "Preservamos e ponderamos o desenvolvimento para manter nosso propósito de reformular e modernizar o desempenho dessas funções da Ancine. Nesse meio tempo, entrou em vigor a Lei Geral das Agências, que trouxe consigo desafios e oportunidades. Houve uma ênfase nas decisões colegiadas e uma potencialização dessa troca de informações, experiências e opiniões entre os diretores, resultando em uma melhor condição na direção para que nós pudéssemos alcançar da nossos propósitos e premissas", declarou o diretor em sua fala inicial.

Braga ressaltou por diversas vezes que desde o início de sua gestão zelou pela transparência, especialmente no processo de divulgação de informações – "esse é o ponto de partida para a ampliação do debate e para a coleta de contribuições, impressões e críticas para o aperfeiçoamento das funções institucionais da Agência", pontuou. Segundo ele, essa atual direção da Ancine busca também, em paralelo, uma ação articulada e integrada no sentido de fortalecer e de consolidar o modelo de governança da política audiovisual – parte deste trabalho também em linha com a Lei Geral das Agências, entendendo a importância do Conselho Superior de Cinema como espaço de debate; do Comitê Gestor do FSA como ambiente de centralização de decisões e definições de metas e resultados e diretrizes específicas das políticas de financiamento além do papel fundamental da Secretaria do Audiovisual e da Secretaria Especial da Cultura.

"Muito se tem dito a respeito de que a reestruturação desse modelo de governança daria conta da reversão do cenário de hipertrofia administrativa da Agência, em que ela por contar naturalmente com uma estrutura organizada e permanente acabou reunindo um número muito grande de atribuições e competências que tem hoje. Uma forma de enfrentar esse cenário é dar ênfase a essa postura de uma nova articulação institucional da Agência com a integração operacional com outros órgãos públicos", defendeu.

Cenário atual de regulação e fomento

O diretor da Ancine define que existe uma busca pela harmonização possível para o momento, que é marcado pela "mudança de paradigma provocada por características próprias da atividade audiovisual", como desenvolvimento tecnológico, novos modelos de negócio e chegada de novos entrantes. "É preciso que se faça a atualização possível diante da realidade atual para que nos preparemos para criar um ambiente de debate futuro, que traz desafios no sentido de evitar desequilíbrios e atrasos", analisou. "Nesse ponto, a Ancine tem se dedicado a processos de organização, simplificação de procedimentos e avaliação de excessos regulatórios, sempre se dividindo nas suas atribuições de regulação e de fomento", completou.

É claro que a atual situação dos projetos audiovisuais parados na Agência também foi comentada por Braga: "Desde o início adotamos medidas para recuperar a capacidade operacional no fomento. É uma realidade impactante a existência de dez mil projetos audiovisuais. É uma Agência que tem como premissa o estímulo à produção audiovisual mas que tem tido dificuldade de dar conta desse número tão expressivo de projetos. É um passivo de prestação de contas muito expressivo – e apesar das medidas adotadas pela Agência, esse passivo segue em curva de crescimento". O diretor garantiu que sua gestão continua dedicando esforços, tempo e muito da capacidade da Agência de discussão e avaliação de possibilidades e alternativas – mas, nesse sentido, gerou polêmica ao afirmar que é importante – "até por ocasião do plano de diretrizes e metas do audiovisual brasileiro" – que se faça uma avaliação sobre quais seriam as metas desejadas para a atividade em termos de audiência, ingresso e ocupação de espaço. "É muito importante nesse sentido um processo de remodelagem da política publica do audiovisual para que a gente dê conta de uma perspectiva de um horizonte virtuoso", declarou, dando a entender que sua visão prevê uma política baseada em métricas e resultados.

Ainda dentro da temática da regulação, Braga reforçou a necessidade de criação de um ambiente de concorrência de serviços que seja ainda favorável à vinda de novos entrantes, estimulando novos modelos de negócio uma vez que isso se reverta em "bem-estar para a sociedade". O diretor relembrou que a Ancine contribuiu recentemente com uma proposta para uma futura regulamentação do VoD e debateu sobre canais lineares na internet – "em ambas as oportunidades a Agência não fugiu do enfrentamento da questão. Estamos sempre discutindo e debatendo novos modelos", defendeu.

A pandemia e o cinema como principal prejudicado

O setor audiovisual foi um dos mais afetados pela chegada do novo coronavírus ao Brasil, e preservar as atividades do setor foi um dos grandes desafios. Braga ressaltou que a Agência prontamente propôs ao Comitê Gestor um pacote de medidas de enfrentamento, com abertura de linha de crédito emergencial. "O cenário não é simples. Houve especialmente dificuldade no parque exibidor, além das atividades de produção, que foram interrompidas ou adequadas às novas formas de trabalho. Do ponto de vista dos pequenos exibidores, tivemos um cuidado e uma preocupação de que logo no lançamento do programa houvesse um auxílio financeiro específico a eles. Agora, se inicia a reabertura, em uma retomada que será segura, mas ainda gradual", avaliou.

O diretor salientou que a visão da diretoria é de é que preciso zelar pela ampliação e expansão do parque exibidor brasileiro, uma vez que a importância da atividade cinematográfica para toda a economia e para a cadeia do audiovisual como um todo é clara. "Especialmente por conta da iminência de término da cota de tela* no próximo ano", alertou, "é preciso zelar pela manutenção do parque exibidor enquanto espaço de entretenimento, de desenvolvimento social e econômico e também enquanto canal de distribuição de obras brasileiras". Braga continuou: "A sustentação tão logo possível a retomada do parque exibidor é um desafio para a Agência assim como o financiamento e o estímulo à produção audiovisual independente que dê conta de um marketshare significativo nesse mercado", seguindo seu raciocínio anterior que fala em uma política que versa sobre resultados.

Para ele, as mudanças que ocorrem no sentido de aumento de possibilidades de veiculação e comercialização de obras apresentam um cenário "que parece próspero para a ocupação de espaços mesmo sem a cota de tela" e a experiência internacional mostra "quão relevante é essa presença consistente e significativa de conteúdo audiovisual brasileiro de qualidade nesse segmento". Braga define um futuro no qual o cinema está totalmente integrado com os diversos outros segmentos de mercado: "Buscamos constante harmonização com as novas tecnologias, a internet, os novos modelos e suas possibilidades, as mudanças de comportamento do consumidor… Tudo isso vem sendo levado em conta pela Agência para que esse aumento de possibilidades venha acompanhado de desenvolvimento do setor e de uma concorrência equilibrada".

Voltando a falar em fomento, o diretor disse que a Ancine tem em curso avaliações para contribuir com um diagnóstico de novos passos nesse âmbito – mas que é preciso dedicar tempo e esforço num processo constante e gradual: "Nós trabalhamos na reestruturação da gestão interna e das áreas de fomento, na reorganização das funções da Secretaria de Recursos de Financiamento e etc. Havia registro de sobreposição de funções e perda de eficiência, e consequentemente de conflitos no desempenho de atividades. Fizemos um processo de reestruturação dedicado à capacidade operacional da Agência".

Próximos passos

"Esse momento de transição também é um momento de harmonização entre o velho e o novo. Tenho muita responsabilidade na condução desse processo e acredito em uma transição que olhe para frente. Não dá pra fazer política audiovisual olhando pelo retrovisor", declarou Braga, acrescentando que a reestruturação interna da Agência faz uma preparação para esse momento. "O próximo passo é transformar a Secretaria Executiva em uma Secretaria de Políticas Regulatórias, justamente para dar conta dos novos modelos de negócio e desafios que as novas tecnologias nos trazem. É um ambiente em constante avaliação e estamos em permanente reflexão sobre o melhor caminho a se seguir. Buscar consenso é muito do que se trata a nossa função atual", destacou.

Por fim, o diretor voltou a falar que o objetivo é o desenvolvimento do setor e a competição saudável, e repetiu que o que está em perspectiva é o ingresso de sala de cinema e a audiência em diversas outras telas que "se multiplicam e se somam". E concluiu: "A nós, cabe estimular e favorecer essas possibilidades, ocupando todos os espaços e usufruindo do que a tecnologia traz ao audiovisual e, a partir disso, gerar emprego, renda e desenvolvimento sócio-econômico para a sociedade brasileira".

*Embora a prorrogação da cota de tela esteja em discussão no Congresso Nacional e conte com o apoio da bancada ligada à Cultura, seu término segue legalmente previsto para 2021. Está no Artigo 55 da MP 2.228/01, que criou a Ancine: "Por um prazo de vinte anos, contados a partir de 5 de setembro de 2001, as empresas proprietárias, locatárias ou arrendatárias de salas, espaços ou locais de exibição pública comercial exibirão obras cinematográficas brasileiras de longa metragem, por um número de dias fixado, anualmente, por decreto, ouvidas as entidades representativas dos produtores, distribuidores e exibidores".

1 COMENTÁRIO

  1. Esse sujeito não é o que precisamos na Ancine, sua postura, a sua fala vazia ontem na palestra da Expocine refletem o que vemos nesse Coverno. O discurso diz que o governo reconhece a importância do setor, na prática é uma horda coveiros. Acabar com a cota de tela é só um indício, manter a Ancine e os mecanismos de fomento paralisados é a prática latente.

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