"Beleza Fatal" resgata novelas clássicas e prova que gênero tem fôlego no streaming 

Lola (Camila Pitanga) em "Beleza Fatal" (Foto: Pivô Audiovisual)

A primeira novela Max Original, "Beleza Fatal", estreou na plataforma no dia 27 de janeiro. Com 40 capítulos, lançados em blocos de cinco por vez, a trama é uma criação de Raphael Montes e conta com a direção geral de Maria de Médicis, em uma produção da Coração da Selva para a Warner Bros. Discovery.

A novela se tornou o conteúdo mais assistido entre séries e filmes na plataforma no Brasil durante sua primeira semana de exibição. Além desse marco, a obra estabeleceu um novo recorde ao se tornar a produção local mais assistida da Max no país em sua primeira semana desde o lançamento do serviço de streaming, em fevereiro de 2024. E, no momento, "Beleza Fatal" segue no primeiro lugar do Top 10 de séries mais vistas da Max no Brasil.

Com o projeto, a WBD fez uma aposta global, uma vez que o produto estreou simultaneamente em países da Europa, como Portugal, além de Estados Unidos e América Latina. O grupo não revelou os valores investidos no marketing da novela, mas afirmou que estão na mesma casa de grandes produções internacionais como "A Casa do Dragão" e "Pinguim". "Beleza Fatal" também chegou ao topo de séries mais vistas em outros países, como Portugal.

O movimento de novelas originais do streaming começou em 2024. É claro que a Globo, por meio do Globoplay, já tinha aproveitado sua expertise no formato e lançado alguns produtos diretamente na sua plataforma, como "Verdades Secretas 2" (que, por acaso, conta com a mesma protagonista de "Beleza Fatal", Camila Queiroz) e "Todas as Flores", que posteriormente ganharam uma segunda janela de exibição na TV aberta. Mas a chegada das plataformas de streaming internacionais nessa onda se deu mesmo no ano passado, quando a Netflix estreou "Pedaço de Mim", no mês de julho. Vale observar que, na época, a plataforma refutou o rótulo de "novela" e divulgou a produção como seu "primeiro melodrama original nacional". O fato é que o projeto foi um sucesso e, recentemente, comprovou sua força – e seu potencial como novela: no Prêmio APCA 2024, "Pedaço de Mim" foi a primeira novela original para streaming a ganhar o prêmio de Melhor Novela pela Associação Paulista de Críticos de Arte. Os números de visualização também foram extremamente positivos. O produto brasileiro ocupou o Top 10 dos mais assistidos em mais de 20 países – com destaque para Argentina, Bolívia, Equador, México e Paraguai, além do Brasil.

Assim como fez a Globo, a WBD também prevê uma cauda longa para a sua novela do streaming: "Beleza Fatal" será exibida na TV aberta pela Band a partir do dia 10 de março, de segunda a sexta-feira, às 20h30. Anteriormente, no início de fevereiro, o conteúdo teve ainda uma degustação na programação dos canais TNT Novelas e TNT, com a exibição dos três primeiros episódios. Uma segunda novela já está engatada pela WBD: é "Dona Beja", cujas gravações já encerraram. A previsão de estreia é para o segundo semestre de 2025 ou o primeiro de 2026.

A fórmula

"Beleza Fatal" segue a fórmula tradicional das novelas, com capítulos de cerca de uma hora de duração; uma trama clássica, com direito à presença de uma mocinha vingativa, uma mãe guerreira e uma vilã cômica e carismática, cheia de bordões; abordagem de temas sociais e reviravoltas. Na comparação com a novela da Netflix, que teve 17 capítulos, ela é mais extensa, com 40. Ambas tiveram todos os episódios gravados antes da estreia – o que significa que, ao contrário das novelas clássicas da TV, que são "obras abertas", a trama não pode sofrer adaptações a partir de feedbacks do público. E, ainda nesse comparativo, enquanto a Netflix escolheu lançar todos os capítulos da trama de uma vez, a Max preferiu liberá-los em blocos de cinco, numa estratégia que tem se mostrado acertada à medida em que aguça a curiosidade do público pelos próximos acontecimentos, evita spoilers (ou pelo menos diminui o risco) e faz com que pessoas que não acompanharam desde a estreia e se interessaram pelo conteúdo depois consigam acompanhar a tempo.

A novela Max Original traz uma história de busca por vingança e justiça que se passa no agitado mundo da beleza, da cirurgia plástica e dos tratamentos estéticos. Sofia (Camila Queiroz) enfrenta uma desafiadora jornada após ver sua mãe ser presa injustamente por causa de sua prima Lola (Camila Pitanga). Sem rumo, Sofia é acolhida pela amorosa família Paixão, com a matriarca Elvira (Giovanna Antonelli), que lida com a tragédia de ter a filha Rebeca hospitalizada após uma cirurgia plástica malsucedida. É assim que Sofia e a família Paixão se unem na dor e na indignação contra os culpados em um desejo comum por vingança. Determinada a destruir Lola e todos os responsáveis por suas tragédias, Sofia mergulha em uma obsessiva busca por reparação. No entanto, ao reencontrar um amor de infância, ela começa a questionar suas escolhas e descobre que a justiça tem um preço mais alto do que imaginava. O elenco é encabeçado por um trio de atrizes já bastante conhecido pelo público da TV Globo – Camila Pitanga e Giovanna Antonelli, que estreiam nas produções para streaming, e Camila Queiroz, já veterana nas plataformas, com uma série de projetos para a Netflix e para a própria Max no currículo.

E, falando em nomes populares do gênero, "Beleza Fatal" foi criada pelo escritor Raphael Montes, que já trabalhou como roteirista de novelas anteriormente, mas ficou conhecido mesmo após o sucesso de "Bom Dia, Verônica", série da Netflix, e teve supervisão de Silvio de Abreu, autor que tem mais de 30 novelas no currículo, entre autoria principal, colaboração e supervisão de texto, como "Guerra dos Sexos" (1983) e "Rainha da Sucata" (1990). É uma combinação que representa o melhor dos dois mundos – a agilidade das séries para o streaming com a tradição das novelas da TV.

Embora dê uma série de "checks" na lista de coisas que fazem dela uma novela, "Beleza Fatal" não deixa o público esquecer que está assistindo a um produto original de streaming. Alguns traços reforçam essa ideia: o enredo não tem tantas tramas paralelas quanto as novelas tradicionais e menos "enrolação", isto é, cenas que não agregam especialmente muita coisa à história. Na própria coletiva de imprensa de lançamento os atores bateram bastante nessa tecla. "É uma novela que faz essa ponte com o folhetim tradicional que a gente ama, mas com 40 episódios, sem barriga. A trama vai pra frente e os personagens nos surpreendem o tempo todo", disse Camila Pitanga. "É uma narrativa envolvente, onde as coisas acontecem numa velocidade rápida, mas não tão rápida que perca a emoção. A novela tem um ritmo muito correto, cirúrgico, e uma qualidade fora de série. O tempo todo você é surpreendido pelas reviravoltas. Ela traz esse frescor, essa nova roupagem, uma outra abordagem", destacou Mônica Pimentel, vice-presidente de Conteúdo da WBD Brasil.

Bem-humorada, a trama também aposta em momentos de intertextualidade. Ela homenageia as novelas tradicionais ao mesmo tempo em que tira certo sarro delas. Logo no primeiro bloco de episódios, Camila Pitanga diz, durante o casamento de Lola, sua personagem, a frase "que boa ideia esse casamento primaveril em pleno outono" – que se tornou famosa na boca de Bebel, da novela "Paraíso Tropical", de 2007, interpretada por ela mesma. Lola e Bebel, aliás, têm diversas semelhanças. Em outros momentos, ainda no bloco inicial, Sofia (Camila Queiroz) vive momentos que relembram a trajetória da primeira personagem de sua carreira, a Angel, de "Verdades Secretas". É possível apontar ainda muitas afinidades entre os roteiros de "Beleza Fatal" e "Avenida Brasil", sucesso da TV Globo de 2012.

Em outra cena, em uma conversa com o marido, Lola (Pitanga) critica o sogro da seguinte maneira: "Eu estou no futuro. Eu sou o streaming, o seu pai é a TV aberta. A TV aberta está morrendo! Eu tô aqui, vivíssima!". Nas redes sociais, o público deu risada da brincadeira, mas logo lembrou que a própria "Beleza Fatal" será exibida na TV aberta.

Análise

Em um momento em que as novelas parecem ter perdido um pouco seu rumo na TV aberta – as últimas produções das nove da TV Globo, como "Travessia", "Terra e Paixão" e a atual "Mania de Você" sofrem com a audiência e com duras críticas do público – o streaming se abre como um novo horizonte para o gênero, que é tão tradicional e querido no Brasil. Se valendo da vantagem de um espectador mais ativo, que escolhe o que quer ver e quando quer ver, a novela original dessas plataformas não precisa se desdobrar para agradar o chamado "grande público", ao contrário da TV aberta, que joga esse conteúdo de canhão para o país inteiro. E, aí, ela brinca: se sente livre para exagerar, ousar e até apelar.

É claro que "Beleza Fatal" tem diversas cenas em que é preciso ser muito desprendido da realidade para embarcar na história. Por exemplo: a personagem Rebeca (Fernanda Marques) sofre uma parada cardíaca durante uma cirurgia plástica, passa dias abandonada num terreno baldio e, mesmo assim, não morre. Depois, Sofia, ainda criança, vê uma reportagem na televisão sobre o caso da Rebeca e, por ter encontrado o celular da menina, decide procurar a delegada responsável. Cinco minutos depois, a garota chega a pé na delegacia que cuida do caso – a mesma que ela viu na TV e que coincidentemente era perto da onde ela estava e que ela, sozinha, conseguiu encontrar. Completam a lista uma série de assassinatos exagerados – com direito a explosão de carro e corpo jogado da janela do apartamento – e pessoas fingindo serem outras sem nenhuma complicação. Mas o público perdoa porque, dentro da trama, faz sentido. E talvez seja justamente esse exagero que as novelas atuais da televisão não estejam conseguindo entregar.

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