União entre canais, marcas e agências traz novos negócios na pandemia

Com a chegada da pandemia, as pessoas que puderam passaram a trabalhar em home office e a praticar o isolamento social. Se por um lado elas ficaram fisicamente longe, por outro, nunca houve tanta troca, conversa e diálogo. Essa foi a principal percepção dos líderes publicitários à frente dos grandes grupos de mídia da televisão que agora, graças à união de forças para superar o período de crise, olham para os últimos meses do ano que estão por vir com otimismo, e chamam atenção para a necessidade de novas formas de medição para os conteúdos publicitários nesse futuro. Esses foram alguns dos insights do painel "Novos modelos para a publicidade em TV paga" realizado no segundo dia do Pay TV Forum 2020, evento organizado pelas publicações TELA VIVA e TELETIME que, neste ano, acontece inteiramente online pela primeira vez.

"Claro que o período foi desafiador e nos fez evoluir em um ritmo muito mais rápido do que estávamos prevendo. Vínhamos de uma sequência de anos ruins, mas a perspectiva era boa. Janeiro, por exemplo, foi um mês muito bom. Aprendemos e ainda estamos aprendendo juntos como fazer com que esse ecossistema siga funcionando. Acho que, daqui para frente, vamos lidar cada vez mais com mudanças constantes, diferentes formatos de trabalho e adaptação às novas tecnologias. Desde o final de junho e o início de julho já trabalhamos com uma perspectiva de reconstrução. Vamos botar o pé no chão: a pandemia não vai mudar o negócio que temos. Ela só vai fazer com que a gente encontre novas formas de fazer esse negócio acontecer", disse Roberto Nascimento, o Naná, VP de publicidade da Discovery, em sua fala de abertura no painel.

Herbert Zeizer, head de bens e consumo do Grupo Globo, passou dentro da empresa por uma jornada dupla de reconstrução uma vez que, em fevereiro deste ano, houve uma junção da área comercial da Globo e da Globosat, que passaram a trabalhar de forma integrada entre TV aberta, TV paga e digital. "Já estávamos enfrentando um processo de adaptação de equipes, produtos e estratégias de venda diferentes, buscando construir essa nova cultura. Aí, em março, veio a pandemia. Mais uma mudança. A diferença é que, para a primeira, houve preparação, estudos, comunicação com o time e processos de integração. Para a segunda, usamos os primeiros 45 dias para tentar entender como as coisas iam funcionar, pensando primeiro dia a dia, depois semana a semana. Readaptação é a palavra de ordem e, a meu ver, uma constante daqui para frente", pontua.

Quem ganhou experiência em termos de adaptação foi Marcus Vinícius Chico, VP de publicidade da CNN Brasil. O canal estreou em 15 de março, apenas quatro dias após a OMS ter declarado oficialmente a pandemia do novo coronavírus. Então, a emissora, que havia passado os últimos 15 meses preparando produções originais e apresentando o projeto ao mercado publicitário, se viu obrigada a engavetar tudo o que havia sido planejado para os primeiros 45 dias no ar para cumprir seu papel jornalístico e se dedicar à cobertura da pandemia e seus desdobramentos. "De qualquer forma, nossa chegada ao mercado gerou movimentos positivos para a indústria, tanto com concorrência quanto com anunciantes. Nossas 18 horas de entrega diária de ao vivo seguiram abordando a pandemia, 100% das nossas cotas de patrocínio foram vendidas e a audiência prevista para o período de um ano e meio foi atingida nesses primeiros quatro meses no ar. Hoje, entendemos que estamos entrando na fase dois. É hora de oferecer ao mercado ainda para este ano e para o próximo pacotes de Pay TV e digital, modelando negócios para uma receita oriunda de AD sales, e não subscription", relata. Chisco ainda conta que 90% dos materiais publicitários fechados com os anunciantes passaram por ajustes em cima da hora, já que ninguém podia prever que o canal iria estrear em meio a esse cenário. "Montamos um time dentro das nossas operações comerciais só para atender a essas demandas. É uma realidade de adaptação e, a meu ver, um dos fatores positivos dessa conversa", conta.

Outro canal que também estreou no contexto da pandemia foi o AgroMais, do Grupo Bandeirantes – este, um pouco mais tarde, em 22 de junho. Alexandre Barsotti, diretor de publicidade dos canais Band, disse que os números de audiência têm sido positivos e que o mercado agro praticamente saiu ileso dessa pandemia, com o Terraviva, outro canal do grupo que aborda o universo agro, também performando bem. "Dificilmente o mercado se recupera no sentido de resgatar tudo o que foi perdido, mas acreditamos em um último quadrimestre de retomada forte. Estamos otimistas – em agosto já sentimos essa melhora. É claro que a situação segue atípica, não conseguimos fazer previsões. Mas o importante é que estamos atentos a tudo e tentando extrair o máximo de cada momento", declara. "Acho que, quando você tem uma boa ideia, um bom conceito e uma boa entrega, oferecendo para o cliente aquilo que ele quer comprar e não o que você quer vender, os bons resultados aparecem. É isso que trago como estratégia com a minha equipe", completa. Barsotti explica que, nesse processo de estar atento aos acontecimentos, uma medida importante foi reunir todos os chefes editoriais para buscar oportunidades: "Começamos a criar pautas diferenciadas, escutando o mercado e buscando essa proximidade inclusive com os criativos das agências. Afinidade com os anunciantes é fundamental para entender para onde ir e como ir. É um processo de ver, aprender e testar".

Essa movimentação de ajudar os anunciantes não aconteceu somente na CNN, como relatou Chisco, nem só na Bandeirantes, como lembrou Barsotti – é uma onda que tomou conta das conversas entre canais, marcas e produtoras. Samuel Sabbag, diretor de AD sales da Turner Brasil, afirmou que a transformação aconteceu tanto em relação à produção, que virou remota e adotou novas ferramentas, quanto ao mercado, onde a opção do grupo foi por ouvir as demandas. "Em vez de tentar vender nossos portfólios, fomos ouvir o que os anunciantes esperavam da postura do time e dos nossos conteúdos e produtos. Dessa forma, levamos soluções para o mercado com ferramentas que não tínhamos aqui e trouxemos da nossa matriz dos EUA, que é um mercado mais maduro", cita. Entre elas, estão duas em especial: target now, que é plugada diretamente com o Ibope e, em real time, entrega de forma otimizada os resultados da campanha que está no ar naquele momento para o cliente, e uma outra de performance, na qual canal e cliente trabalham a quatro mãos para atingir os objetivos daquela campanha e o resultado é auditado para ser entregue. "São ferramentas que vieram para ficar, fruto de parcerias com Colômbia e EUA para otimização e análise de dados. Elas já estavam na nossa estratégia e esse período mais crítico acelerou essa chegada", explica. Hoje, Sabbag acredita em uma recuperação do mercado, impulsionada por resultados recentes, como o "Super Agosto" da TNT, com transmissões ao vivo da UEFA Champions League, que contou com 16 marcas patrocinadoras. "Nossa expectativa é que o mercado publicitário retorne não igual estava pré-Covid, mas com bastante força", aposta.

Zeizer, da Globo, também elogia esse trabalho em parceria na pandemia: "Nossa maior fortaleza é a produção de conteúdo, e isso não mudou mesmo com as paralisações de gravações e fechamentos de estúdios. O que era possível de se produzir foi feito – como as lives, por exemplo. Nesse sentido, nós ajudamos muitos clientes que, no começo, tiveram dificuldades de rodar seus filmes, já que as produtoras fecharam. Pegamos filmes deles para produzir. Estivemos muito próximos tanto internamente quanto com o mercado. Exercitamos muito o diálogo, o 'deixa eu ver como consigo te ajudar'. Vejo, entre os principais aprendizados, a capacidade de resolver problemas com união e empatia, o que impactou positivamente o mercado. Até concorrentes se uniram. A gente sai desse movimento diferentes: aprendemos a ouvir mais e que dá para, pelo menos, tentar fazer".

Já Naná, da Discovery, traz uma reflexão mais aprofundada: "Desde o começo, foi necessário pensar em dois caminhos – como preservar e garantir que os negócios contratados continuassem andando e quais seriam os novos modelos à luz do momento. Tentamos muito criar condições para que as marcas continuassem presentes, sem corroer valor. Afinal, a crise não pode destruir o valor do nosso negócio – se isso acontecer, o negócio acaba. Nesse sentido, tivemos conversar muito interessantes com agências, anunciantes e produtoras. É muita gente pensando no negócio. A pandemia obrigou as marcas a construírem seus propósitos e recontarem suas histórias. Recomeçarem, de certa forma. Até marcas tradicionalmente ligadas somente a performance e resultados começaram a contar histórias e agregar valor. Isso será importante a longo prazo".

É hora de abandonar a conversa sobre a base de assinantes da Pay TV

Os heads de publicidade estão confiantes com a retomada. Por isso, é hora de olhar para o futuro. E, nesse sentido, todos concordam que um dos principais problemas a serem resolvidos é o modelo de aferição, que ainda é muito baseado nas horas de conteúdo assistidas na TV por assinatura. A questão é: incomoda aos programadores o fato do mercado bater na tecla da perda de base de assinantes da TV paga como se isso significasse diretamente que as pessoas não estão mais assistindo aos conteúdos da TV paga porque elas estão, mas em OTTs, streaming, redes sociais… "Precisamos modernizar o modelo de aferição para mostrar isso ao mercado. O desafio é entregar um resultado de métrica bem atual", diz Zeizer.

O profissional do Grupo Globo acha inadequada a conversa sobre base de assinantes – "esse é um assunto que interessada para as operadoras; em um primeiro momento, é sensível ao negócio delas", diz. "A gente fala tanto em modernização, dados, insights com base nesses dados… Mas o discurso e a pergunta que fazem para o mercado de TV paga continua versando a respeito da queda de assinantes. Nossos conteúdos estão por toda a parte e as audiências seguem crescendo, como a do Globoplay e o YouTube, por exemplo. Não existe mais projeto que saia sem entrega multiplataforma. Cada uma é só mais um ingrediente. Então não queremos mais que o mercado olhe só para essa dimensão de base de assinantes. Do ponto de vista do publicitário, até a pirataria nos dá visualizações", provoca.

Naná, da Discovery, completa: "No final do dia, cada um de nós vende visualizações. Já saímos dessa posição de sermos somente canais de televisão para fazermos cada vez mais uso das forças das nossas marcas e da relação que podemos estabelecer com o público em qualquer plataforma. O peso da TV é indiscutível, ainda mais no Brasil, mas cada vez mais geramos conversas e discussões a partir de conteúdos que saem da Pay TV e vão para os canais abertos e para as redes sociais. Somos muito mais multiplataforma do que parece".

Para Sabbag, a métrica de horas assistidas deve ser o centro das discussões. A própria experiência da Turner comprova seus argumentos – uma vez que, nos últimos dias, a TNT bateu recordes com a transmissão da Champions League tanto pela TV quanto pelas redes sociais, via Facebook. "A TV pauta e gera as conversas nas redes sociais, enquanto o digital traz audiência para a TV. Esse ciclo se retroalimenta e fortalece ainda mais esses conteúdos, independente da plataforma", garante. Barsotti, do Grupo Bandeirantes, acrescenta: "Precisamos de uma fórmula de encontro de resultados – Pay TV, impactos nas plataformas digitais, aplicativos… Esses dados não são monitorados. Fica a provocação aos institutos, que precisam mensurar isso de formas diferentes. Não dá para ser uma mensuração interna, e sim do negócio como um todo. Existe um grande aprendizado pela frente de como levar esses números ao anunciante e mostrar que o que ele passa para o meu consumidor vai muito além do conteúdo veiculado na Pay TV". Chisco, da CNN, finaliza: "Nós contratamos o Flávio Ferrari, único brasileiro que já presidiu três institutos de pesquisa. Estamos preocupados em falar de comportamento do consumidor e entendemos que o 5G vai mudar ainda mais este mercado para nós. A indústria está em um processo gigante de mutação. Quem for mais ágil, competente e adaptável, com certeza estará sempre a um passo à frente".

DEIXE UMA RESPOSTA

Por favor digite seu comentário!
Por favor, digite seu nome aqui