O segmento dos canais FAST evoluiu no Brasil e, hoje, já está num patamar bem melhor do que estava em 2022 ou até mesmo em 2023. O público já conhece e gosta de consumir conteúdos nesse modelo, mas os desafios da monetização e de uma entrada mais efetiva do mercado anunciante ainda são latentes. Esse foi um dos principais insights do painel “Navegando na era FAST: Estratégias para uma audiência em constante movimento”, que fechou o segundo dia de congresso SET Expo 2024 nesta terça-feira, dia 20 de agosto. Daniela Souza, conselheira da SET e CGO da AD Digital, abriu a conversa explicando que a evolução do modelo se deu em três etapas: chegada do conteúdo, depois a audiência e, por último, o dinheiro – sendo essa última fase ainda desafiadora para a indústria.
Já Aline Jabbour, diretora de parcerias na Samsung TV Plus, contou que traz como missão desde o dia um disseminar o FAST e educar o mercado – as estratégias de como fazer isso é que foram mudando um pouco conforme ele foi amadurecendo. Ela relembrou: “Começamos educando a audiência, mostrando que era só clicar no aplicativo e assistir de graça. Depois, educamos os provedores de conteúdo locais. No início, só conseguimos trazer quem vinha de fora porque já conheciam o mercado FAST de outros locais onde o segmento era maior e mais forte”. E sobre o momento atual, avaliou: “Hoje, os principais players têm canais FAST. Evoluiu bastante. Agora, estamos na etapa de fortalecer a comunicação com anunciantes e marcas. É a parte mais cuidadosa, onde estamos focados hoje, para que entendam o valor, testem e experimentem divulgar a marca para o consumidor de FAST”.
A Samsung TV Plus tem atualmente mais de 90 canais no Brasil. É um número expressivo, que comprova um pouco do que Jabbour falou sobre já ter educado a audiência. Ela, inclusive, declarou que o desafio da audiência foi totalmente superado: “Já faz parte do dia a dia do público o consumo no FAST. Temos outros milhões de desafios, claro, mas esse não mais”. Para reforçar essa perspectiva, ela trouxe alguns cases, como a CazéTV e a Dia TV, que estão disponíveis na plataforma da Samsung com excelentes números de consumo. Nas Olimpíadas, 50% dos jovens adultos acompanharam as competições pela Cazé TV. “Isso é furar a bolha. São coisas que só estão acontecendo porque o consumidor está exigindo essa mudança”. A executiva descreveu o consumidor da atualidade como cada vez mais exigente e menos leal, e brincou que deixou de chamá-lo de telespectador e passou a chamar de turista. “Precisamos estar onde ele está, e os canais também entenderam isso. Não estamos buscando fidelidade, e sim fazer com que entendam que a plataforma FAST é o ponto de encontro de qualquer audiência”, afirmou.
Luis Camargo, presidente do Comitê de Vídeo Digital do IAB Brasil, conselheiro da SET e líder da área de desenvolvimento de parcerias e conteúdo de mídia e entretenimento em Google TV, acredita que, para o consumidor, não importa se ele está assistindo FAST, VoD ou qualquer outro modelo: “A sopa de letrinhas é nossa. O consumidor quer encontrar o conteúdo e assisti-lo da forma que achar melhor. Para ele, o meio não importa. É uma questão da indústria”. Pensando no mercado local, Camargo ainda considera que a TV aberta estabeleceu o modelo de consumo do FAST, que é linear, e que por isso no Brasil a adoção disso como hábito é mais fácil. “Por isso não precisamos tanto educar a audiência. Nossa missão é facilitar seu processo de descoberta de conteúdos”, ressaltou, ao que Jabbour completou: “FAST é para a indústria. Pro consumidor, é assistir TV. Às vezes ele consome FAST sem nem saber que está fazendo isso. Criar esse awareness é uma dor que temos que resolver”.
Novos entrantes e possibilidades
Também presente no bate-papo, o CEO da Dia TV e Dia Estúdio, Rafa Dias, está à frente da primeira TV do mundo feita por criadores de conteúdo. A Dia TV foi lançada no ano passado, com uma grade linear de programação, num primeiro momento disponível no YouTube e nas redes sociais, inclusive com conteúdo ao vivo, e hoje está também no FAST, via Pluto TV, TCL e a própria Samsung. Somando as diferentes janelas de distribuição, ela alcança um milhão de espectadores únicos por dia, com um conteúdo que tem a diversidade como pilar e tem como audiência principal o público jovem – 70% pessoas de 18 a 34 anos. “O grande desafio do mercado era falar com esse público. A TV deixou essa faixa etária um pouco de lado. O jovem ficou carente do conteúdo linear. Vimos uma demanda e estamos ocupando esse espaço”, pontuou.
“Quando começamos a Dia TV no ano passado era tudo muito novo”. Tirando o próprio Rafa Dias, que trabalhou por anos na MTV, quase 100% da equipe que toca o projeto nunca havia feito televisão, mas era especializada em conteúdo para a internet. “Passamos esse primeiro ano fazendo e aprendendo com isso. Chegamos no FAST já com um grande aprendizado da nossa audiência. Sabemos que ela é muito conectada, por exemplo, então já produzimos pensando na pessoa que vai assistir com o celular na mão”, mencionou.
Por conta dos bons resultados, o FAST se tornou extremamente relevante na estratégia da Dia TV. “Hoje, estamos pensando bastante sobre a dinâmica desse ambiente e discutindo os novos eventos que faremos. Até então, o FAST não tinha ao vivo, mas em função da CazéTV, por exemplo, vimos que existe essa demanda muito grande por parte da audiência. Esse é nosso desafio hoje para o público no FAST”, revelou, assumindo ainda como esse segmento trouxe diferentes audiências para a Dia TV, que não tinha o hábito de buscar conteúdos no YouTube mas acabou conhecendo o canal por esse outro caminho. “E tem a questão de que a TV reúne mais pessoas na sala. Sai um pouco da individualidade do consumo do celular, o que pra gente também é muito interessante”, acrescentou.
Alvaro Paes de Barros é um dos sócios da OffGrid, que é programadora e distribuidora de canais FAST no Brasil e no mundo, sendo uma das poucas empresas totalmente focadas nesse segmento. Manual do Mundo, FitDance e WePlay são alguns dos canais que estão sob o seu guarda-chuva. “Crescemos porque olhamos para essa indústria com um olhar diferente. Somos talvez um dos primeiros programadores a trazer um conteúdo mais jovem, exclusivo, fresco, bem empacotado e com um bom marketing. Nossa missão é fazer a empresa se estabelecer como um dos players mais ativos em FAST no planeta. Hoje, as barreiras para isso são menores. O desafio diário e pensar e tentar coisas diferentes”, assinalou. “Falamos muito de mudanças, mas precisamos falar também das coisas que não vão mudar: gostamos de boas histórias, preferimos não pagar por elas e gostamos de uma boa experiência de usuário, isto é, com devices fáceis, onde possamos encontrar o que estamos buscando de uma forma tranquila. Essas são algumas constâncias importantes da indústria”, observou Barros.
Monetização é prioridade agora
Nesse cenário de fragmentação de canais e plataformas, que faz com que o bolo financeiro esteja mais repartido, revela-se o grande desafio da monetização. Para Barros, o cenário é claro: existe um descompasso entre a audiência e a monetização. “Atingimos audiências muito grandes, mas ainda monetizamos muito pouco. Acredito que a escassez nos obriga a pensar em formas alternativas de fazer as coisas, isto é, diferentes maneiras de monetizar nosso inventário de conteúdos e essas audiências. Os canais trazem um número expressivo de pessoas, ao mesmo tempo em que temos um inventário qualificado. É quantidade e qualidade. Para nós especialmente é um grande desafio, até porque a gente vive só disso. A fase é de se reinventar e pensar em novos caminhos para monetização”, avaliou.
Camargo, por sua vez, traz uma visão otimista, e diz que o mercado está mais perto do que longe de entender modelos que param em pé. Ele enfatiza que o brasileiro está acostumado ao consumo linear permeado por publicidade – e que só falta o anunciante compreender isso. “Mas precisamos de métricas. Enquanto não dermos ao anunciante algo que faça ele comparar o FAST com o ambiente de TV aberta e TV paga, entendendo se tratar de um mesmo formato de conteúdo, mas no ambiente de internet, teremos essa trava para justificar o investimento”, argumentou.
Ele falou ainda sobre a complementaridade de audiências. “São coisas que não se canibalizam – mas provar isso também está relacionado à métrica. A partir do momento em que tivermos tudo isso mais claro – e fica o apelo para os detentores de audiência compartilharem essas informações – conseguimos um modelo econômico sustentável”. E concluiu: “Fico feliz de ver conteúdos de extrema qualidade indo para esse ambiente. Assim conseguimos reforçar a conversa com o anunciante”.
Por fim, Jabbour reflete que os anunciantes estão quebrando a cabeça para colocar o FAST em alguma das “caixas” que já existem – online e offline, por exemplo – mas precisam entender que ele é, na verdade, uma terceira via: “Tem o comportamento de linearidade, mas também tem vantagens do online, como a segmentação. Enquanto estiverem tentando encaixar o FAST em padrões onde estão acostumados a dividir a verba, ainda estaremos, do lado de cá, discutindo monetização”.