Para Gustavo Steinberg, de "Tito e os Pássaros", animação nacional está em boa fase, mas resultados podem ser maiores

O filme "Tito e os Pássaros" ainda não teve sua estreia oficial em solo brasileiro, mas já acumula importantes prêmios e indicações para a animação nacional. Pré-indicado ao Oscar 2019 de "Melhor Animação" – o único brasileiro na lista de 25 títulos – a obra teve sua primeira exibição no último Anima Mundi, em julho, que lhe rendeu o prêmio de "Melhor Longa Infantil". Além disso, a animação foi selecionada para a mostra competitiva de Annecy e do Festival Internacional de Cinema de Toronto (TIFF), onde foi a primeira animação brasileira a ser selecionada e teve sua estreia norte-americana. Por fim, recentemente, ele foi também indicado a "Melhor Animação Independente" no Annie Awards 2019, que acontece em fevereiro.

O enredo apresenta a história de Tito, que tem a missão de salvar o mundo de uma epidemia incomum: as pessoas ficam doentes ao sentirem medo. "No momento atual, lançar um filme que discute a cultura do medo com crianças e adultos de forma a abrir esse diálogo é ótimo. Em São Paulo especialmente essa sensação do medo como uma doença é muito clara. Por isso acho que esse é um projeto que precisava ser feito.", explica, em entrevista exclusiva, o diretor do longa-metragem, Gustavo Steinberg, que assina a direção ao lado de André Catoto e Gabriel Bitar.

"É o que chamamos de filme família. Tem uma camada tradicional de filme de aventura, que é divertido de se assistir, mas traz esse pano de fundo real, que tem conexão direta com a realidade e impacta todos nós, adultos e crianças. Adultos em especial têm dificuldades de começar conversas sobre temas tão complexos, como é o caso do medo – como ele se extrai, se espalha pela sociedade, suas consequências. A gente subestima um pouco as crianças, mas a verdade é que podemos ter diálogos profundos com elas, com cuidado para impostar esse discurso.", continua. "Há vários níveis de leitura do filme. Nos quase 60 festivais que já fomos, percebemos que as crianças curtem por ser uma obra do universo infantil, enquanto os adultos pegam outra mensagem. Esse é um bom feedback!", completa.

A questão da direção de arte merece destaque. Os cenários são pinturas, em um trabalho pintado à mão frame a frame para retratar efeitos como fumaça, luzes, iluminação de carros passando nas ruas e demais acabamentos. "A gente queria uma estética única e peculiar, então fizemos muita pesquisa antes de entrar em desenvolvimento. Construímos uma bíblia de estética e, durante esse percurso, encontramos o expressionismo como um dos possíveis caminhos de referência. Ele coincidiu muito com a nossa essência, com o mote do filme.", conta o diretor. "O objetivo é alcançar crianças a partir de cinco ou seis anos de idade, então não podia ser assustador demais, ao mesmo tempo em que precisava trazer a questão do medo à tona. A trilha sonora e a inspiração expressionista foram a chave para isso.", acrescenta. Steinberg afirma ainda que a estética dos personagens foi pensada para funcionar com esse cenário: "Eles não têm contorno externo ou regularidade na forma.".

Por fim, Gustavo discorre sobre o mercado de animação brasileira que, apesar de enfrentar um momento positivo em termos de qualidade e volume de obras, ainda passa por uma série de dificuldades. "Levantar dinheiro não é fácil. O momento é incrível, mas a verdade é que os resultados do FSA e outros recursos estão muito aquém do discurso. O investimento ainda é baixo, além das complicações das novas regras. Eu optei por fazer um filme de qualidade e trabalhar nele por anos, e os frutos que colho não condizem. Não posso concorrer a editais de ficção com ele e também não tenho opções para concorrer como animação.", argumenta. "Existe estrutura, boa vontade e dinheiro, mas dificuldades de operacionalizar tudo isso. Os resultados poderiam ser muito maiores.", conclui.

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