Para o YouTube, medição de audiência de futebol ainda está longe de refletir a realidade

Gabriela Arthur, líder de insights estratégicos do Google

Se por um lado o YouTube tem comemorado sua relevância dentro do ecossistema de consumo de futebol – segundo dados da própria plataforma, no comparativo entre 2023 e 2024 as visualizações de conteúdos relacionados ao esporte no YouTube no Brasil, como transmissões ao vivo, pré e pós-jogo, cresceram 20% e, somente em 2024, foram consumidas mais de duas bilhões de horas de futebol dentro do YouTube no país – por outro, ainda há um grande elefante na sala, que é o desafio da mensuração de audiência

No início do mês de abril, em parceria com players do mercado, a Kantar Ibope Media apresentou o novo Sports Audience Measurement, uma solução para medir a audiência de partidas esportivas ao vivo – seja na TV aberta, na TV paga ou no streaming. Segundo a empresa, pela primeira vez o futebol brasileiro seria analisado em sua totalidade, com dados comparáveis e padronizados.

Na prática, a medição unifica parte dos aparelhos de audiência que a Kantar já tem nos 15 mercados brasileiros que compõem o Painel Nacional. Com o aparelho já captando a programação assistida na TV aberta, graças à tecnologia de áudio, o decodificador também passa a registrar quando o televisor em questão estiver passando um jogo de uma das duas competições analisadas – Brasileirão e Copa do Brasil – seja por TV por assinatura, plataforma de streaming ou YouTube. Mas, ainda assim, não se trata exatamente da audiência real que aquele jogo teve, uma vez que a Kantar se limita a TVs conectadas e Smart TVs, excluindo assim aqueles que acompanham as partidas pelo celular ou computador, por exemplo.

De acordo com a nova ferramenta, nos dois primeiros jogos dessa temporada do Campeonato Brasileiro 2025, só na audiência domiciliar a Record chegou a alcançar na TV aberta 15 vezes mais do que a CazéTV, também detentora dos direitos de exibição. Os números se referem ao acumulado dos jogos do último dia 30 de março (Vasco 2 x 1 Santos) e do último dia 6 de abril (Sport 1 x 2 Palmeiras), que representa o placar de 7,4 x 0,5 de audiência domiciliar a favor da Record. No entanto, vale repetir: a medição considera apenas o consumo dentro de TVs conectadas e Smart TVs

Aí entra o YouTube. Segundo a plataforma, 45% do consumo de futebol dentro dela acontece em TVs conectadas. Ou seja, os outros 55%, via outros dispositivos, ficam de fora da nova medição da Kantar, o que prova que, de fato, ela ainda está longe de medir a audiência do esporte em sua totalidade. Esse número de 45% muda quando consideramos apenas a CazéTV, que tem grande parte da sua força na transmissão de jogos ao vivo: nesse caso, o consumo em CTV aumenta para 65%. Ainda assim, há uma grande parcela de gente assistindo em outros meios. 

Consumo novo, mensuração antiga  

Nesta quarta-feira, 21 de maio, o YouTube recebeu jornalistas em seu escritório em São Paulo para falar sobre o consumo de esporte na plataforma. No encontro, que girou muito em torno desse desafio da mensuração real da audiência, Aline Moda, diretora de agências, parceiros e branding solutions do Google, foi enfática: "Quando uma ferramenta que não é completa é lançada no mercado no contexto atual de consumo de vídeo, ela gera não só uma distorção, mas uma confusão. E aí ela acaba prestando um desserviço porque não consegue medir o consumo de vídeo em sua totalidade – consumo esse que, hoje, é multi-dispositivo. E não é a gente que está falando, o mercado todo sabe disso". 

Ela afirmou que o YouTube e o próprio Google de forma geral estão muito presentes e participativos em todos os comitês de discussão de mensuração que existem no mercado, como no IAB e no Cenp, por exemplo. "Temos representantes levando propostas nessas discussões, mas o YouTube é só um ator dentro desse ecossistema. Não deveríamos ser o único a dizer ao mercado o que ele deve fazer. Tem que ser uma conversa coletiva. Temos pautado muito o mercado sobre isso, trazido essas discussões em busca de uma medição que seja de vídeo, e não de TV. A solução passa por uma mensuração mais moderna, que coloque o consumidor no centro, analisando a forma que ele realmente consome vídeo hoje, e não olhando só para uma parte desse processo. Isso não ajuda na evolução do mercado", ressaltou. 

Para a executiva, o ponto central está justamente aí, numa mensuração moderna, para além de unificada. "Hoje, temos uma forma de consumir mídia totalmente nova, mas metodologias de audiência do passado. Precisamos cobrir esse gap para termos uma mensuração que reflita a realidade". Ainda assim, ela garantiu que o problema da medição não atrapalha as conversas com as marcas. "Os grandes anunciantes têm a consciência de que a mensuração passa por várias etapas – pela audiência em si, sim, mas também pelo engajamento e resultados para o negócio. No final, a grande medida de sucesso é o retorno nos objetivos dos clientes. Esse é o principal drive". 

Malu Gonçalves, head de comunicação do YouTube Brasil, contou que, diante desse desafio, a plataforma tem trabalhado em três frentes. Primeiro, com licenciamento de uso dos dados, onde oferece seus dados proprietários para agências, por exemplo, para que elas possam estar dentro dessas avaliações de mensuração de campanhas de maneira mais ampla. Em segundo lugar, o YouTube tem atuado também em modelos próprios de medição de audiência. E, por fim, está a parceria com os institutos de pesquisa. O YouTube cede seus dados a esses institutos para que eles possam integrá-los a suas análises de mensuração. "A própria Kantar tem acesso a dados do YouTube. Não exatamente nessa nova ferramenta deles, que é conectada às TVs, mas em outros relatórios e produtos que a Kantar tem existe uma troca com os nossos dados. Estamos trabalhando próximos a eles para que, no futuro, tenhamos um produto que possa endereçar melhor essa questão do consumo por meio de diversos dispositivos, dentro e fora de casa. Esse é o desafio. A gente sabe que o consumo não acontece só no ambiente domiciliar. Precisamos olhar para esses gaps e buscar soluções", concluiu. 

Desafio do "onde assistir" permanece 

É claro que, com a série de mudanças que estão acontecendo em termo acelerado, surgem outros desafios, tanto de ordem técnica quanto também os comportamentais – como facilitar que o consumidor encontre o conteúdo que quer assistir, por exemplo. 

Neste mesmo encontro desta quarta, Gabriela Arthur, líder de insights estratégicos do Google, lembrou que saber onde assistir o jogo do seu time do coração ainda é uma dor do torcedor de futebol. "Hoje, a jornada de consumo começa no Google, quando ele digita 'onde assistir' na barra de pesquisa". E não é só modo de dizer: a busca pelo termo "onde assistir" hoje é quatro vezes maior do que era em 2010, segundo o Google Trends. O dado é preocupante, pois revela que o consumidor ainda se sente perdido. 

Nesse sentido, o próprio Google tem buscado ajudar essa audiência e trabalhado em diferentes funcionalidades. Hoje, quando a pessoa faz essa busca, encontra um "card" que mostra opções de transmissão tanto de TV quanto de streaming – e, no caso de streaming, encontra um botão clicável que o leva direto para a plataforma, facilitando a jornada. Mas vale pontuar que, ainda que o torcedor descubra onde vai passar o jogo, ele corre um grande risco de ser direcionado para uma plataforma de streaming da qual ele não é assinante e, no fim das contas, acabar sem conseguir assistir à partida. 

Delay: problema praticamente superado

Antigamente, quando novas formas de consumir futebol foram surgindo, uma das maiores preocupações do torcedor era o delay – o famoso grito de gol do vizinho que podia chegar antes do gol ser mostrado na sua televisão, celular ou qualquer outro dispositivo. Para Victor Machado, Head de Esportes do YouTube no Brasil, o delay ainda é uma questão, mas que não afetou tanto o consumo na plataforma como eles imaginavam. "No início da Copa do Mundo de 2022, lembro de conversas que tivemos com a CazéTV sobre as partidas que iríamos transmitir. A escolha pelos jogos do Brasil parecia óbvia, mas tínhamos dúvidas se as pessoas que tinham o hábito de assistir ao futebol na TV aberta iriam assistir no YouTube. Mas vimos muita gente decidindo assistir pela CazéTV mesmo com delay. Nossa interpretação desse movimento de 2022 até hoje é que as pessoas estão buscando novas formas de assistir – e, para elas, isso se tornou mais importante do que coisas como delay. E, em paralelo, a gente vem melhorando nesse ponto. Obviamente que não depende só da tecnologia do Google, mas também da Internet que a pessoa tem disponível, por exemplo. Mas estamos acompanhando essa evolução e o nosso nível de delay em comparação com a TV aberta diminuiu muito", celebrou. 

"E, pensando nessa mudança de consumo, poucas pessoas assistem jogo na TV aberta TV aberta mesmo, isto é, na antena. Porque se você fala de TV aberta dentro da Claro tv+, por exemplo, nossa transmissão já é mais rápida ou tão rápida quanto. A evolução natural do ecossistema vai colocar todo mundo num mesmo lugar, cada vez mais o ecossistema estará digital como um todo e estaremos todos alinhados. Hoje, a questão do delay é pouco preocupante para nós". 

1 COMENTÁRIO

DEIXE UMA RESPOSTA

Por favor digite seu comentário!
Por favor, digite seu nome aqui