A Rio Cinema Digital continua colhendo bons frutos do seu projeto de curta-metragem "A Menina e o Mar", do diretor, roteirista e produtor Gabriel Mellin, que conquistou o troféu de Melhor Curta-Metragem de Ficção na última edição do Prêmio Grande Otelo, em agosto deste ano. O filme vem sendo reconhecido ao redor do mundo e já ganhou 35 prêmios e passou por mais de 80 festivais, em 20 países. Só na Índia, foram cinco – entre eles, o BISFF, que possibilitou a pré-qualificação da obra para a inscrição no Oscar. O curta também passou por países como Itália, México, Indonésia e Suécia. No Brasil, esteve na Mostra de Tiradentes, no FAM, no Festival de Cinema de Ouro Preto, Festival Internacional de Cinema de Curitiba e Curta Kinoforum, entre outros. "Rodamos os grandes festivais do Brasil e do mundo e fechamos essa trajetória com chave de ouro no Grande Otelo", contou Mellin em entrevista exclusiva para TELA VIVA.
Inspirado no livro infantil "O Menino e o Mar", de Lulu Lima, o filme conta a história do encontro de duas crianças, um menino e uma menina, que possuem formas completamente diferentes de enxergar o mundo. Ele, com medo do que as águas do mar podem trazer; e ela, que encontra poesia em cada grão de areia, aprendem juntos que, para apreciar a vida, basta se entregar aos sentidos. O curta traz temas importantes do mundo atual de uma forma leve, como a diversidade, acessibilidade, o uso excessivo da tecnologia, o contato com a natureza e o uso da imaginação.
No momento, a produtora não está mais inscrevendo o filme nos festivais, mas segue recebendo muitos convites para exibições especiais – algumas delas em canais, como Sesc TV e TV Cultura, além da plataforma da Spcine. O objetivo é conseguir um licenciamento para um grande player de streaming. "Sempre tivemos essa ideia, mas ainda não estamos tendo tantas respostas", revelou o diretor, que já fez contatos com Mubi, Netflix, Globoplay e Disney. "Talvez o prêmio dê uma alavancada. Seguimos tentando", garantiu.
Em paralelo, a Rio Cinema Digital segue trabalhando com outros projetos. A produtora, que hoje atua com o tripé de ficção, programas de TV e branded content, lançou neste ano o "Safra de Inovações – A Fazenda da Família Teló", um reality produzido para a marca de tratores John Deere com o cantor Michel Teló em parceria com a agência Jones. É um projeto de branded content, encomendado pela própria marca, que não queria um conteúdo audiovisual de publicidade tradicional ou institucional demais. O caminho foi mostrar o artista chegando à fazenda de sua família, no Mato Grosso, para conferir e participar do primeiro plantio. São quatro episódios, todos lançados no canal da marca no YouTube, com resultados relevantes: dois deles ultrapassaram a marca de dois milhões de visualizações. O projeto foi formatado pela produtora, com roteiros de Pedro Bueno e direção de Gabriel Mellin. "O resultado superou a expectativa e deixou todos os envolvidos muito felizes. Nós tratamos como se fosse um reality show mesmo, e não uma publicidade, e o processo foi cheio de desafios reais, como tempestade, seca, estresses da fazenda, caminhão que não passava embaixo da ponte… Mas eles foram superados. E a convivência com o Michel também foi ótima. Ele rende muito na frente da câmera. Estamos orgulhosos desse trabalho", destacou Mellin.
E, em janeiro, eles se preparam para estrear "Diogo na Cozinha", no canal GNT. O programa é uma criação de Pedro Bueno baseada no livro de receitas do cantor Diogo Nogueira. Na atração, que também é dirigida por Mellin, o artista recebe amigos e convidados em sua casa e cozinha com eles. Entre os nomes que participam, estão Martinho da Vila, Jorge Aragão, Criolo e Sandra Sá. "Foi um clima muito legal. O Diogo cozinha de verdade, fez todas as receitas. E a casa dele é maravilhosa, foi projetada pensando em filmagens. Não tem muitas paredes, tem muito recuo, o que é o sonho de qualquer produtor. Tem uma cozinha de cinema, em frente a uma piscina. É um cenário pronto", detalhou o diretor. "O programa superou tanto as expectativas que o canal já encomendou uma segunda temporada, mesmo a gente ainda editando a primeira", adiantou.
Completando a lista, está o filme "A Promessa", que Mellin está co-dirigindo com a cineasta Christiane Garcia, em uma produção da Olha Já Filmes, de Manaus – AM. O enredo se passa na década de 1950, com o resgate da tradição do boi-bumbá, e foca na história da primeira mulher que conseguiu entrar como personagem nos autos. Com roteiro também assinado por Garcia, o longa teve sua primeira parte de filmagens finalizada no município de Paratins, onde a equipe obteve autorização para acompanhar o evento, e será retomado no próximo mês de março, por conta das condições climáticas da região. "Em Parintins, conheci a força que tem o boi-bumbá. As pessoas ficaram animadas em participar do filme. É muito importante para a região Norte. Agora, estamos esperando o rio voltar a subir para acessarmos os locais que queremos filmar nessa segunda etapa", disse o diretor.
Mellin já trabalhou anteriormente com a Olha Já Filmes, no longa-metragem de ficção "Enquanto o Céu Não Me Espera", que foi dirigido por Garcia. A Rio Cinema Digital assinou a pós-produção. "É um filme bem poético. A Chris dirigiu sozinha e, quando o material chegou para nós, vimos a sensibilidade dela. Trocamos muito. E daí surgiu a parceria para esse novo filme".
Equilíbrio entre os projetos
A produtora carioca sempre trabalhou com formatos diferentes – mas, como todas as empresas que também fazem ficção, ela acaba sendo a "cereja do bolo", como define Mellin. "Se pudéssemos escolher, estaríamos sempre fazendo ficção. Mas no Brasil isso é muito difícil. Demora. Cada projeto que a gente consegue emplacar leva sete, oito anos. Eu tenho um projeto de ficção que está completando nove anos. E temos que pagar as contas. Não tem como ficar esperando. Desde que começamos a produtora, entendemos que, para nos sustentarmos, precisávamos ser mais diversos", afirmou.
Os trabalhos de publicidade tradicional, que eram mais comuns no início, acabaram migrando para branded content, formato que eles têm preferido fazer ultimamente, pensando justamente nesse viés mais próximo do conteúdo de ficção que gostam. "Virou nosso diferencial. A gente cria, escreve, dirige. Não é só vender produto. Conseguimos migrar um pouco. Antigamente, para a produtora girar, dependíamos mais da publicidade tradicional. Agora, estamos nos fortalecendo mais com conteúdo".
Em paralelo, estão os programas de televisão, para canais como Globo e Multishow, que também suprem, de certa forma, esse desejo. "No momento, estamos editando os episódios de 'Diogo na Cozinha', e minha instrução para a equipe é para que editem como se fosse ficção. É pegar os momentos, construir um olhar, e não sair picotando. O tratamento de imagens, a forma que quis filmar… Tudo isso é a partir dessa premissa de ficção. A série 'The Bear', do Disney+, foi uma das minhas referências. Busco trazer esse tipo de tratamento cinematográfico para os projetos – e tem dado certo".
O diretor analisa: "Descobri depois de 20 anos de mercado que funciona melhor ser uma produtora pequena, com essa capacidade multi-função, porque a gente consegue fazer melhor, com mais qualidade, e mais rápido. Já tivemos 35 funcionários. Hoje, somos em oito. Todo mundo faz um pouco de tudo, e isso é bom. O produtor que é roteirista e também é atendimento acelera o processo. Dessa forma, estamos sempre em dia com as entregas. Conseguimos otimizar as coisas. Não penso mais em ter uma produtora maior. Às vezes, até abrimos mão de alguns projetos por conta dessa escolha de não inflar a produtora ou terceirizar. Escolhemos bem os projetos e fazemos tudo com calma, pensando em entregar bons resultados".
Caminhos do mercado
O diretor Gabriel Mellin e o produtor e roteirista Pedro Bueno escolhem a palavra "esquisito" para definir o ano de 2024. "Não foi um ano de crise, nem um ano normal, e também não foi um ano muito bom. O mercado está muito mutante, todo dia surge uma coisa nova. Teve a bolha do streaming, que depois estourou. Na publicidade, aparecem novos formatos o tempo inteiro. Nós sobrevivemos, mas o maior impacto que tivemos, e isso porque somos uma produtora de 15 anos de história, foi no número de projetos. Foi, disparado, o ano que tivemos menos projetos. Estamos trabalhando naqueles mais longos e conseguindo que eles tenham mais força e fôlego. Acho que o segmento de produtoras médias e grandes está buscando esse caminho, isto é, de fazer menos e melhores do que vários pequenos. É um movimento natural", observa Mellin.
Ainda olhando para o mercado como um todo, ele vê as coisas como cíclicas, e aponta como tendência, por exemplo, a volta do consumo na TV a cabo com mais força. "As pessoas não querem mais um monte de assinaturas de streaming onde não podem simplesmente zapear e achar um conteúdo". Além disso, Mellin cita o cinema, que não voltou com a potência de antes, mas que ainda pode fazê-lo. "Também acho que é cíclico. O público sente saudades do cinema, da experiência coletiva. É algo que 2025 pode trazer".
Por fim, o diretor espera que 2025 seja o ano da ficção para a Rio Cinema Digital. "É um sonho que buscamos há muito tempo. Temos projetos bem encaminhados e players interessados, então esperamos conseguir migrar pra isso. Mas não temos certeza enquanto o dinheiro não cai. Nos últimos editais, pontuamos super bem. Sempre ficamos entre os primeiros suplentes, ali perto. Então estamos caminhando. Uma hora sai". Ele concluiu: "Para projetos de ficção, estamos vendo que o caminho é ou edital, ou streaming – sejam as plataformas brasileiras ou as de fora. São as possibilidades abertas. Com a volta do FSA, podemos encontrar um equilíbrio entre essas duas fontes".