Por um audiovisual não binário

O audiovisual brasileiro ainda trabalha com premissas antigas e anacrônicas, criando uma atmosfera de distância entre cinema, audiovisual e outras manifestações culturais.

A tecnologia e seu avanço diuturno nos mostram incessantemente que a verdadeira diferença entre cinema e audiovisual, ou entre filmes e séries, é o conceito difundido por Arlindo Machado, importante teórico da televisão, em seu livro "A Televisão levada a sério – editora SENAC, 2000", que trata de obras "seriadas" e "não seriadas".

A verdade é que nem as chamadas "janelas de exibição" sobreviveram aos antigos modelos. O audiovisual pode estar em qualquer lugar – do cineclube ao streaming ou smartphone. O que indicará o lugar e a prioridade de exibição será o modelo de negócio e o público a ser atingido. Parece simples e óbvio? Não, o óbvio exige muita reflexão e senso crítico.

Nossas linhas do fundo setorial do audiovisual ainda mantêm essa base binária, impondo separatismos financeiros, níveis classificatórios descolados de resultados, sem atualização permanente e modelos de produção e distribuição artificiais. E ainda se trabalha com um fomento divisionista entre os programas Prodav e Prodecine, sem levar em conta as tantas possibilidades de audiência e desenvolvimento econômico-social.

A verdade é que estamos presos a um modelo Fla x Flu, uns versus os outros, polarizados, extremados, divididos, sem a união e reconstrução que desejamos. Somos diversos sim, mas apenas partes, não uníssonas, que resistem sem somar em favor do coletivo.

O mundo em que vivemos no século XXI nos coloca uma reflexão sobre uma nova ordem social, intelectual, produtiva e, sobretudo, do ser humano, de forma não binária. A cultura e o audiovisual precisam se reinventar, conceitualmente, da mesma forma. Imediatismos separatistas apenas vislumbram o curtíssimo prazo, sem qualquer conexão com o desenvolvimento.

Tanto se fala e se elogia a Coréia do Sul com sua estratégia exitosa para o audiovisual. A sua maior virtude, porém, não reside apenas em reproduzir o modelo norte-americano. Os investimentos no chamado soft power feitos por lá foram além, pensando fora da caixa e executando um plano de longo prazo. Falam de exportação de conteúdo como estratégia global – audiovisual, música e games de produção sul-coreana. Para ganhar o mundo e ver florescer a indústria criativa local.

A tal soma não binária, maior, muito maior do que as partes, por aqui divididas.

*Mauro Garcia é presidente executivo da Bravi. (Crédito: Divulgação)

1 COMENTÁRIO

  1. O paradoxo é tanto que existem inúmeros festivais de cinema voltado aos curtas-metragens, incentivos para a produção de curtas e, até mesmo, a maioria dos valores das cotas disponibilizadas através da Lei Paulo Gustavo, no âmbito municipal, favorecem a produção de curtas-metragens! Mas a ANCINE não incluí a minutagem do curta-metragem para a classificação de nível das produtoras brasileiras! Como entender essa lógica?! Nem Dr° Spock consegueria!

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