"A Batalha da Rua Maria Antônia" estreia nos cinemas e mira conexão dos jovens com o filme

Cena de "A Batalha da Rua Maria Antônia" (Foto: Divulgação)

Dirigido e roteirizado por Vera Egito, com produção de Manoel Rangel, Egisto Betti e Heitor Dhalia, o longa-metragem "A Batalha da Rua Maria Antônia" estreia nos cinemas nesta quinta, 27 de março, trazendo para as telas um dos episódios mais marcantes da luta estudantil durante a ditadura militar. Produzido pela Paranoïd Filmes, com coprodução da Globo Filmes e distribuição da Imagem Filmes, o longa será exibido em São Paulo, Rio de Janeiro, Porto Alegre, Recife, Belo Horizonte, Salvador e Brasília, entre outras cidades, após ter passado por importantes festivais e conquistado prêmios, como Melhor Filme na Première Brasil do Festival do Rio em 2023 e Prêmio de Melhor Longa-Metragem de Ficção (Escolha do Júri) no Festival de Atlanta em 2024, entre outros.

Na trama, Lilian (Pâmela Germano), estudante de Filosofia da Universidade de São Paulo (USP), até então alheia às questões políticas da época, se vê repentinamente envolvida na violenta batalha entre universitários e agentes infiltrados da ditadura. O confronto, ocorrido em 2 de outubro de 1968, envolveu estudantes do Mackenzie alinhados ao Comando de Caça aos Comunistas (CCC) e ficou conhecido como a Batalha da Rua Maria Antônia. Mais do que retratar os conflitos políticos do período, o filme leva o espectador para dentro do prédio da USP, oferecendo um olhar humano e imersivo sobre a época e os impactos desse dia na vida dos estudantes que o vivenciaram. Assista ao trailer:

Estratégia de lançamento 

Antes da estreia em circuito comercial, o longa participou do circuito de festivais nacionais e internacionais, como normalmente acontece com as produções de cinema, mas também apostou em uma estratégia diferenciada e está sendo exibido em eventos e encontros com estudantes, como o Congresso da União Nacional dos Estudantes (UNE), em Recife/PE, em janeiro. O objetivo é impactar o público jovem e, com seu entusiasmo juvenil, ampliar a rede de articulação para apresentação da obra, tornando-a um marco para reflexão sobre o movimento estudantil e mobilizando a juventude à ação.

"A juventude segue mobilizada. Foi bonito ver o contato das lideranças estudantis e militantes do movimento estudantil com o filme. Isso aconteceu em sessões da Mostra Internacional de Cinema de São Paulo, no Festival do Rio, em diversas ocasiões nesses ambientes de festival. Foi comovente ver essas lideranças estudantis assistindo ao filme em uma sessão feita para eles, lá em Recife. A Vera (Egito, diretora e roteirista) foi muito feliz nesse sentido, de capturar toda a generosidade e entrega desses jovens – que, na visão de pessoas mais velhas, endurecidas e embrutecidas pela vida e pela luta, pode até soar ingênua. Mas é a ingenuidade de quem acredita com muita força em suas convicções. Existe uma profunda conexão dos jovens com o filme. E não só com aqueles que são dos movimentos estudantis, mas todos eles", revelou o produtor Manoel Rangel em entrevista para TELA VIVA.

"Essa conexão acontece exatamente porque estamos falando de intensas experiências e vivências desses jovens. A ditadura é uma questão, claro, mas há outras em curso – dilemas, amores, quem eu sou e como eu me posiciono. A gente tem feito todo um esforço nesse processo de lançamento para estarmos muito próximos dos movimentos estudantis do Brasil inteiro, com essas lideranças engajadas na promoção do filme e com toda uma campanha dirigida para levar universidades e escolas para as salas de cinema. Sentimos que o cinema precisa profundamente disso", afirmou.

Sessão do filme no Congresso da UNE (Foto: Divulgação)

Os produtores acreditam que é papel deles pensar a distribuição desde o início do projeto e acompanhar de perto essa etapa. "Fazemos filmes para que as pessoas vejam. Queremos dialogar com as pessoas, quanto mais gente melhor. Por isso nos envolvemos tanto. Ao longo do processo, acreditamos que o filme estava ganhando cada vez mais atualidade. Quando ele aconteceu na sala de cinema, tocou a corda do tempo que a gente vive hoje. No ano passado, quando ganhamos o prêmio no Festival do Rio, ficou claro que a chegada desse filme nas salas de cinema precisava ser diferente. E aí se fortaleceu na gente a convicção de que havia de ser uma grande campanha promocional, mais do que propriamente um lançamento comercial. A chegada nas salas de cinema devia estar carregada do universo mais potencialmente vinculado ao filme, que são os jovens", contou o produtor.

Para ele, os jovens são, inclusive, o grande alvo das salas de cinema em geral, que nem sempre consegue dialogar com eles, mas segue tendo neles seu objeto de desejo preferencial. Com essa ideia em mente, desenvolveu-se a estratégia. "A força do filme também fez com que as pessoas quisessem abraçá-lo. Os centros acadêmicos, grêmios, organizações e instituições… Um monte de gente foi abraçando o filme porque foi se reconhecendo nele, entendendo as pulsações. Por isso adotamos essa estratégia. E também chegamos aqui porque estivemos o tempo inteiro pensando caminhos, formas de chegar às pessoas". Rangel ainda acrescentou: "Cada filme é um filme. Cada filme indica o caminho que deve seguir – e essa é a melhor maneira de distribuir, programar e exibir um filme. Acreditamos nisso, e é isso que buscamos".

Nesse sentido, Vera Egito, que assina a criação, roteiro e direção da obra, reflete: "Os distribuidores têm a tarefa árdua de lutar pela permanência das pessoas na sala de cinema, ainda mais o cinema de rua – e acho que a vocação desse filme é para o cinema de rua. Não que ele não vai passar no shopping ou em espaços fechados, mas acho que grande parte do nosso público está nas ruas. Para o exibidor de rua e para o cinema independente é uma tarefa de fé. Envolve paixão, crença, fé no cinema, acreditar que as pessoas desejam assistir aos filmes. E nós sabemos que elas desejam. A estratégia de distribuir quase que no corpo a corpo era a que o filme precisava. E isso passa por encontrar distribuidores e exibidores que também têm essa fé". Egito acrescentou que a grande parceria da diretora, ou da pessoa que sonhou com o filme lá no começo, é a produção. "É a única peça que está do começo ao fim. Todos os parceiros passam pelo filme, mas a produção fica desde o roteiro até muito tempo depois da exibição na sala. É uma parceria muito grande. Por isso o produtor sempre participa da distribuição, mas o Manoel entendeu que, nesse caso, deveria estar presente de uma maneira ainda mais frontal, e está fazendo todo o sentido".

Trajetória do filme e mudança de rota

O projeto de "A Batalha da Rua Maria Antônia" começou em 2010, passou por muitas etapas e versões até ser rodado em 2022. A diretora relembra: "Eu fiz USP, me formei na Escola de Comunicações e Artes (ECA), o Manoel também, e essa é uma história que se conta bastante lá, e que me chamou a atenção como dramaturgia, como possibilidade de contar uma história que é quase uma fábula sobre a ditadura militar, que fala muito da dinâmica da política brasileira, latino-americana até. Comecei a pesquisar, ler sobre o evento, me envolvendo e criando essa história. É uma ficção, os personagens são fictícios, mas muito baseados na história real. A inspiração é a realidade. Claro que durante esses anos todos de trabalho as coisas na política se reviraram. E aí mais ainda essa oposição de forças que se coloca no Brasil há tantos anos volta a ter sentido".

Ao longo desse tempo, algumas coisas que já existiam no roteiro desde o início permaneceram, enquanto outras mudaram. A maior mudança foi a escolha por contar a história a partir de um dos pontos de vista. "Em algum momento no roteiro a gente enxergava o outro lado, tinham personagens lá dentro do Mackenzie que a gente também acompanhava. Mas a partir do que aconteceu no Brasil em 2016 fui entendendo que não é possível você não tomar partido, inclusive dramaticamente e esteticamente. O filme precisava de ponto de vista. Entendi que era preciso escolher um lado da rua", contou Egito.

Momento político

Segundo Rangel, ela foi encontrando o leito mais profundo dos personagens, da própria história que se narrava. "E nós, no momento em que o filme veio à luz e começou a circular nos festivais, já estávamos sob o impacto de algo ainda mais radical, que era a ameaça concreta de um golpe de estado que o Brasil viveu no início de 2023 e tudo o que estamos tomando conhecimento hoje sobre o que era realmente o 8 de janeiro e o que se pretendeu. Tudo isso dá um significado ainda mais profundo para o que é a batalha da Rua Maria Antônia", analisou. Para ele, esse momento do lançamento do filme nos cinemas é também um momento muito relevante da vida brasileira – para a política e para o cinema também, que seguem entrelaçados. "O lançamento agora é ainda mais reforçado por tudo o que o 'Ainda Estou Aqui' gerou de comoção nacional, que também lançou uma das facetas daquele momento histórico que foi a ditadura militar. É muito expressivo. E a 'Batalha' reafirma que é preciso lutar e enfrentar".

Para a diretora, tanto o "Ainda Estou Aqui" quanto "A Batalha da Rua Maria Antônia" confirmam algo que sempre foi de conhecimento de quem está nesse meio, que é a verdadeira vocação do audiovisual: "O cinema tem essa vocação de retratar a sociedade – o que se pensa, ama, teme, sonha. Tem esse olhar sempre atual, ainda que seja para uma história do passado. Um artista só conta uma história hoje porque faz sentido que ela seja contada ainda hoje. Essa é a comoção que nós, amantes do cinema, temos em torno dos filmes em geral. Esse retrato da 'Batalha' é um instantâneo nosso, desse momento de agora, onde talvez a ditadura não tenha acabado de fato. As forças que tramaram e tramam o autoritarismo no Brasil seguem ativas, desafiando forças que teimam em construir democracia e liberdade de expressão".

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