A programação do último dia de Mercado SAPI, em Goiânia, nesta sexta-feira, dia 25 de outubro, abriu com o painel "O Brasil no mundo por Brazilian Content e Cinema do Brasil". Os dois programas apresentaram seus projetos setoriais que têm como objetivo fortalecer o conteúdo brasileiro no mundo. Nesta edição, o SAPI recebeu players e palestrantes internacionais pela primeira vez, de países como Argentina e Chile, que participaram dos painéis e das rodadas de negócios. Essa participação foi justamente organizada com o auxílio desses programas e foi resultado de uma articulação feita pela CONNE, que é a Conexão Audiovisual Centro-Oeste, Norte e Nordeste, iniciada anos atrás, numa provocação para que a Apex (Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos), uma das criadoras do Brazilian Content, além da Cinema do Brasil, olhassem para o país de forma mais ampla, com ações efetivas que pensassem para além do eixo comercial Rio-São Paulo. Esse movimento foi encabeçado pelos principais eventos de mercado da CONNE – o Mercado SAPI (em Goiânia, GO, Centro-Oeste), o Matapi (de Manaus, AM, Norte) e o NordesteLAB (em Salvador, BA, Nordeste).
O Brazilian Content é um programa de incentivo às exportações e promoção do audiovisual brasileiro criado em 2004 pela BRAVI (Brasil Audiovisual Independente) em parceria com a ApexBrasil. Sem fins lucrativos, ele tem como objetivo facilitar oportunidades de coprodução e exportação de conteúdo audiovisual brasileiro e novas mídias; promover a internacionalização de empresas e instituições independentes dos setores audiovisual e de novas mídias brasileiras; e impulsionar o conteúdo brasileiro independente no cenário global. Atualmente, mais de 100 empresas participam do programa, que nos últimos dez anos gerou US$ 279 milhões para as empresas brasileiras apoiadas.
Cíntia Faleiro é analista da ApexBrasil e está à frente do escritório da Agência em Goiás. Desde 2022, a Apex tem um escritório em Goiânia, na capital do estado, que foi inaugurado com o objetivo impulsionar exportações de Goiás, Distrito Federal, Mato Grosso e Mato Grosso do Sul bem como atrair investimentos estrangeiros para a região. "Somos uma agência privada, mas veiculada ao Governo Federal. A economia criativa ficou um pouco parada nos governos anteriores mas, na gestão atual, é fortemente apoiada, o que nos impulsiona também", destacou Faleiro. "Entre as formas de atuação do Brazilian Content estão capacitação, mentoria, preparação das empresas, inteligência de mercado e demais iniciativas que ajudem nessa distribuição do audiovisual brasileiro", explicou. Para além desses convênios de parceria com a Bravi, a Apex também tem acordos com a APRO e a Abragames.
Também dentro desse propósito está o Cinema do Brasil. Criado e gerido pelo SIAESP (Sindicato da Indústria Audiovisual do Estado de São Paulo), em parceria com a Apex, ele é o Programa de Promoção e Internacionalização do Cinema Nacional. Seus associados são empresas produtoras de filmes, distribuidoras, agentes de vendas e festivais de diferentes locais do país. Em linhas gerais, o programa atua prestando serviços, consultorias e assistências para projetos audiovisuais brasileiros.
"Eu e Mauro Garcia, da BRAVI, temos usado muito a palavra 'retomada' para definir o momento atual", disse Morris Kachani, gerente executivo do Cinema do Brasil. "Existe esse sentimento. Os talentos do mercado, de todos os elos dessa indústria, sentiram na pele as dificuldades dos últimos anos. O papel protagonista que a Apex tem tido sinaliza essa retomada. Nosso convênio é ambicioso e olha para o contexto como um todo. Esse modelo de contrato, de dois anos, dá segurança para continuarmos. Traz certa estabilidade, o que é muito importante para a indústria audiovisual", completou.
Esse convênio que Kachani citou tem como objetivo geral ampliar a presença do audiovisual brasileiro no mercado internacional – estimulando, por exemplo, encontros e linhas de financiamento especialmente para coprodução e na área de distribuição, mas também na parte de desenvolvimento. "Queremos profissionalizar ainda mais nosso mercado trazendo competitividade e acesso. É um trabalho feito principalmente lá fora. Lidamos com a imagem do Brasil e o que é a produção audiovisual brasileira para o cinema mundial. E temos ouvido muito que o Brasil estava sumido e, agora, está de volta. Existe uma curiosidade latente sobre o mercado brasileiro. Esses encontros de coprodução que promovemos são quase mágicos. Vemos os negócios sendo fechados. É interessante acompanhar essa dinâmica", observou o executivo.
O Cinema do Brasil tem um cronograma anual que organiza delegações brasileiras que vão aos principais festivais de cinema pelo mundo. São eventos que, para além das sessões de filmes, promovem painéis, palestras e rodadas de negócios – o grande foco do programa está aí, na parte de indústria e mercado. Nessas ocasiões, ele organiza encontros, coquetéis e reuniões, além de montar um estande físico do Brasil, o que acaba atraindo a atenção dos players internacionais e auxiliando o trabalho das produtoras brasileiras durante o período.
Hoje, são cerca de 100 associadas, entre empresas de diferentes portes. Para os eventos internacionais, cada uma leva um ou mais projetos para apresentar a potenciais compradores ou coprodutores. O escritório do Cinema do Brasil auxilia as produtoras na condução do projeto e, depois, cria um catálogo com todos eles, com informações como nome da produtora, dos profissionais e qual é a etapa em que o projeto se encontra. "Fazemos esse trabalho de identificar projetos e oportunidades no âmbito nacional e levá-los pra fora. Preparamos os produtores com workshops, por exemplo, que promovemos antes dos festivais, principalmente dos grandes. Para nós, é gratificante ver uma delegação brasileira numerosa, com projetos bacanas. Organizamos possíveis 'matches' que frequentemente resultam em negócios fechados", celebra o executivo. O Cinema do Brasil leva, inclusive, um profissional da área jurídica em todas essas missões, para ajudar os produtores com eventuais problemas de direitos e contratos.
No entanto, Kachani ressalta que é importante que os projetos estejam bem encaminhados e que o produtor saiba se comunicar em outro idioma. Faleiro complementa: "Se levamos empresas que não estão prontas, gera uma frustração para elas e um efeito ruim do lado de lá. Passa a impressão de que o Brasil está despreparado, que é o oposto da imagem que queremos imprimir. Por isso investimos muito em preparação. Não negamos projetos porque eles necessariamente estejam ruins, mas talvez porque aquele não seria o momento dele ainda".
O programa faz um estudo constante do calendário para entender em que medida ele "casa" com a produção brasileira. Esse estudo passa, por exemplo, por mapear festivais temáticos, de gênero e de formatos específicos. "Existe um mercado mundial disposto e interessado em conhecer a realidade brasileira e os projetos dos cineastas daqui. Nossa agência recebe de braços abertos o produtor brasileiro e o ajuda a desenhar e exportar seu projeto".
Faz menos de um ano que o convênio foi assinado. Nesse período de trabalho, um dos grandes destaques foi o Festival de Cannes, em abril, com projetos como "Ainda Estou Aqui", de Walter Salles, e "Manas", de Marianna Brennand. A delegação brasileira que viajou ao Festival foi composta por mais de 60 produtoras. Foram quatro dias de atividades e mais de 100 reuniões realizadas, além de uma geração de negócios imediata de quase 30 milhões de dólares e uma projeção para o ano de outros 90 milhões.
No escopo do trabalho, está ainda a promoção de parcerias com outras instituições brasileiras nesses eventos internacionais, como a própria Bravi; o InvestSP, por meio do programa CreativeSP, da Secretaria do Estado de Cultura de São Paulo; e mais recentemente a Spcine. Num âmbito mais geral, o programa também atua em interlocução com o Ministério da Cultura e o Ministério das Relações Exteriores.
Tanto a Apex quanto o Cinema do Brasil pensam no mercado internacional de forma ampla, a fim de buscar oportunidades para diferentes perfis de produtores e projetos. Entre os próximos passos, está fortalecer ainda mais a relação com os mercados da América Latina. O Festival de Guadalajara – um dos mais importantes festivais de cinema do México e da América Latina, que acontece anualmente, em meados de março – já está no calendário do programa, mas a ideia é ampliar para outros eventos. "É interessante pensarmos nessas oportunidades e fortalecermos essas pontes. São lugares onde o Brasil pode ser protagonista", analisou Kachani.