Francisco Bosco apresenta o documentário político "O mês que não terminou" em Brasília

Aproximadamente um mês após fazer sua pré-estreia na Mostra Internacional de Cinema de São Paulo, o documentário "O Mês que não terminou", do escritor e filósofo Francisco Bosco, foi exibido na Mostra Competitiva do Festival de Brasília do Cinema Brasileiro na noite da última terça-feira, 26 de novembro. Na ocasião, o filme provocou reações variadas da plateia presente, que variaram entre vaias e aplausos.

A produção, que é assinada por Bosco em parceria com o artista plástico Raul Mourão, parte de uma análise das manifestações que tomaram o Brasil em junho de 2013 para debater seus desdobramentos e consequências – percebidos até os dias de hoje. O filme retoma os principais acontecimentos políticos desses últimos seis anos, como a Operação Lava Jato, o impeachment de Dilma Rousseff e a eleição de Jair Bolsonaro, com comentários de economistas, filósofos, jornalistas e psicanalistas. Os depoimentos são apresentados em meio às artes de Mourão e de registros jornalísticos, em sua maioria cedidos pela Mídia Ninja, com narração da atriz Fernanda Torres, que participou ativamente no longa, contribuindo inclusive no roteiro.

"Meu objetivo, ao fazer esse documentário, era decifrar o enigma: como um movimento popular em sua origem, tendo como princípio claro um aprofundamento da democracia, após uma série de desdobramentos acabou surtindo o efeito contrário, levando a eleição de um presidente reacionário?", explicou o diretor durante debate na capital federal na manhã desta quarta, 27.

Para Bosco, junho de 2013 trouxe à tona quatro elementos que viriam a causar tudo o que aconteceu depois – apesar disso, ele reforça que não seria justo responsabilizar os atores iniciais do movimento por esses desdobramentos. Os quatro elementos, segundo o autor do longa, seriam o surgimento do "antipetismo" e a fragilização da esquerda governista; a fragilização também das instituições do país e o ataque às mesmas, uma vez que a maioria das pessoas estava nas ruas contra o sistema representativo brasileiro; o empoderamento da sociedade civil, que desde a destituição do Collor vivia uma 'desmobilização', em parte graças ao relativo sucesso que os governos dali em diante tiveram, que foi quebrada naquele mês de junho e se transformou em uma tomada de consciência; e a emergência das redes sociais com uma espécie de poder que relativizou o antigo poder das mídias tradicionais e de massa, transformando o espaço público brasileiro. "Com as redes sociais, cada indivíduo passou a decidir o que vai ver, ler e divulgar. São mídias democráticas que, por outro lado, não contam com os filtros argumentativos que o espaço público tradicional contava. As mídias sociais podiam ter tomado outro rumo, mas acabaram gerando as fake news e uma simplificação excessiva da linguagem política", observa.

Para além do viés político, que é dividido na tela em cinco capítulos, o documentário traz uma veia artística graças ao trabalho de Raul Mourão. "Mas o filme não tem diretor. E isso é muito marcante", declara Bosco. "Ele foi feito por um intelectual público e um artista visual. Eu tinha interesse de fazer um filme que de alguma maneira se relacionasse o que eu como amante de cinema entendo como uma tradição dentro do cinema documental e de ficção, que é o que eu chamo de cinema ensaio. Então ele tem uma série verbal muito forte, ao mesmo tempo que traz uma carga imagética densa", justifica. As cenas trazem ainda obras de outras artistas que foram ressignificadas por Mourão a partir das inflexões dos roteiros. "Eu até concordo com críticas que dizem que meu filme não é cinema. Durante a produção, ao lado do Mourão e da Renata Catharino, a montadora, eu sentia falta da presença de um diretor", confessa.

"O mês que não terminou", que concorre na Mostra Competitiva do 52º Festival de Brasília do Cinema Brasileiro, será reprisado nesta quarta, 27, às 18h, no Museu Nacional da República.

1 COMENTÁRIO

  1. Gostei do documentário. Porém faltou dizer algo que está no centro da questão e que tem consequências irreversíveis até hoje (2022 ):

    o antipetismo foi introjetado numa escala gigantesca, "mertelado" diariamente pela mídia (rede globo), incansavelmente, irresponsavelmente.

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