BNDES e Ancine miram internacionalização de empresas e de projetos

João Paulo Pieroni e Gustavo Rolla

A Nova Indústria Brasil (NIB) marca o retorno de uma estratégia nacional de política industrial com foco na inovação, sustentabilidade e inclusão. Nesta quarta-feira, 28 de maio, João Paulo Pieroni, superintendente do BNDES, participou de um painel no Rio2C apresentando detalhes dessa retomada. 

O BNDES retomou a partir de 2023 sua política industrial, isto é, instrumentos e incentivos visando recuperar um protagonismo da indústria brasileira. Na época, foi reinstalado o CNDI – Conselho Nacional de Desenvolvimento Industrial, onde se desenhou o formato da nova política industrial brasileira, que foi dividida em missões. "Não escolhemos um segmento em particular, e sim um conjunto de missões que endereçam o desafio da economia brasileira no qual um conjunto de indústrias teria uma contribuição importante. São seis missões bastante abrangentes", explicou o superintendente. A missão de número 4, por exemplo, é "transformação digital da indústria para ampliar a produtividade", e a de número 6 diz respeito às tecnologias de interesse para a soberania e defesa nacionais. 

Cada missão se desdobra em metas – uma dessas metas definidas na missão 4 é transformar digitalmente 25% das empresas industriais brasileiras, assegurando a participação da produção nacional nos segmentos de novas tecnologias até 2026 e 50% até 2033. As missões envolvem ainda cadeias produtivas prioritárias – nesta missão 4, está o audiovisual. 

Pieroni pontuou então alguns destaques do setor – como seu potencial de geração de empregos, impacto relevante na economia, difusão cultural, preservação cultural e geração de propriedade intelectual – além de desafios para o seu desenvolvimento, como o fato de ele envolver majoritariamente MPMEs, fluxo de receita irregular ao longo do ano e dificuldade de acesso a crédito. Foi a partir desse diagnóstico que o BNDES buscou atuar. "Para nós, o acesso ao crédito e o desenvolvimento empresarial são alavancas para o crescimento do setor". As ações foram retomadas de forma mais ativa a partir de 2024. Anteriormente, na pandemia, eles trabalharam segundo uma lógica mais emergencial, a fim de preservar empregos e auxiliar empresas com renegociação de dívidas, por exemplo. Mas a partir de 2024, recuperaram esse trabalho ativo, voltando a operar crédito de forma direta, com condições diferenciadas e adaptadas às características e particularidades do setor

Hoje, o BNDES apoia toda a cadeia produtiva do setor registrada na Ancine, em modalidades como infraestrutura; inovação e acessibilidade; e conteúdo e comercialização. Atualmente, há uma carteira importante em andamento. Em março, por exemplo, aprovou financiamento de R$ 32 milhões ao plano de negócios da produtora Conspiração. O financiamento se dá em um contexto de retomada do apoio do Banco ao setor audiovisual, no âmbito do programa BNDES FSA Audiovisual, criado em parceria do BNDES com a Agência Nacional do Cinema (Ancine) com o Ministério da Cultura. O valor prevê o financiamento ao desenvolvimento, produção, comercialização e internacionalização de obras audiovisuais, além de investimentos em infraestrutura, com aquisição de equipamentos para melhorar os processos de produção e pós-produção.

A novidade agora é a aprovação do financiamento de R$ 25 milhões para a distribuidora Paris Filmes investir e ampliar sua atuação – agora incluindo novos mercados na América Latina e países falantes de língua portuguesa. 

Ancine olha para games e internacionalização

Também participando da mesa, Gustavo Rolla, especialista em regulação da Ancine, celebrou a parceria da Agência com o BNDES e suas recentes conquistas, como a nova infraestrutura do Polo de Cinema e Vídeo do Rio de Janeiro e os créditos aprovados para a Conspiração e a Paris. "A internacionalização é um dos nossos focos, e isso está aberto ao segmento de jogos eletrônicos também", ressaltou o executivo. Cada vez mais esse setor tem sido integrado à indústria audiovisual, pensando no potencial do mercado e na possibilidade que o Brasil tem de se destacar nesse meio. Ele vê, inclusive, boas oportunidades de aliar as tecnologias dos games para o audiovisual, facilitando os processos produtivos. 

"Estamos em consulta pública nos Funcines e fazendo um trabalho de casa, que é discutir como internalizar todos os conceitos de games para o nosso arcabouço normativo já existente. Vamos definir, por exemplo, o que configura um desenvolvedor de games independente. Esse desenho institucional está sendo montado. Ao mesmo tempo, há coisas que conseguimos espelhar dentro da nossa estrutura regulatória do audiovisual, como o conceito do que é uma obra brasileira. Isso conseguimos facilmente levar para os games. Tem regras do audiovisual que conseguimos transpor para a indústria dos jogos", avaliou. 

Um ponto que, segundo Rolla, chama a atenção no universo dos games é a sua preocupação com a internacionalização e potencial para isso. "Estive na gamescom latam, em São Paulo, e vi como o pessoal dos games já nasce global. Todos os games já são falados em inglês – mesmo os que têm traços da cultura brasileira", salientou. E, nesse sentido, ele fez uma espécie de alerta para a indústria audiovisual: "Existe muita curiosidade sobre a nossa cultura e o nosso conteúdo, mas a gente não escreve roteiros com apelo universal. A internacionalização é franqueada a todos nós. Tradicionalmente, temos um mercado muito grande, então a gente se basta. A gente tinha um pré-conceito, dizendo que ninguém queria falar português, mas desde que 'Parasita' foi aquele sucesso falando coreano… Acho que o português é tão complexo quanto p coreano mundo afora. Já entendemos que a língua não é mais uma barreira. O que temos que ter são histórias com apelo universal – ainda que tenham uma semente local. O brasileiro tem histórias criativas e muito interessantes, mas quando a gente leva pro mundo, não conseguimos sincronizar". 

Ele relembrou que, em 2019, a Ancine deu um passo importante nesse sentido, criando o edital de coprodução mundo, que hoje é um dos mais "parrudos", nas palavras do diretor, com quase R$ 300 milhões para investimento em coprodução internacional. "Lógico que não é o suficiente, mas é relevante. É preciso ter um fortalecimento de toda essa rede de conexões, como embaixadas e curadores de festivais. O momento é muito interessante. Há curiosidade do mundo, e o Brasil tem capacidade produtiva para isso", afirmou. Rolla ainda comentou que, hoje, vê muitos dos novos entrantes do setor já com essa ambição internacional, e que esse é um bom indício. "É questão de combinar incentivos e estruturar essa governança", concluiu. 

 

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