Novas tecnologias podem otimizar processos do audiovisual, reduzir custos e ampliar possibilidades

O painel "Novas tecnologias e o audiovisual do futuro" realizado nesta sexta-feira, dia 29 de abril, no Rio2C, analisou como as novidades tecnológicas podem impactar não só a forma como consumimos audiovisual, mas futuramente também a forma com que o produzimos. 

Malu Andrade, diretora executiva da Coração da Selva, contou que a produtora segue fazendo o audiovisual "tradicional", mas está em uma constante busca por entender como inovar nos processos, trazer novas ferramentas e absorver a tecnologia em suas produções. Ela está, por exemplo, utilizando painéis digitais para criar diferentes ambientes e situações – eles foram usados na série "Temporada de Verão", da Netflix, e novamente agora, em um projeto que a produtora está tocando com a HBO Max. "Os painéis criam ambientes favoráveis de forma muito rápida. Hoje, essa novidade já é uma realidade, a publicidade tem usado muito, mas ainda precisa chegar ao audiovisual mais tradicional, que deve se apropriar dessas ferramentas. É algo que otimiza tempo e reduz custos", disse Malu. 

"Na Coração, estamos trabalhando maneiras de sair da tela e da câmera. O metaverso pode ser muito bem trabalhado no audiovisual. Ele dá voz ao espectador, que se torna um cocriador da obra e passa a fazer parte da história. Vai além da tela e vira experiência. Isso, especialmente para marcas, é muito interessante, pois gera engajamento", observou. 

Thiago de Freitas é CEO da Kokku, empresa de desenvolvimento de jogos, e membro do Conselho Superior de Cinema, onde atua justamente com esse objetivo de trazer a tecnologia para perto do audiovisual. Para ele, os games podem ser o futuro da indústria de cinema. "E não me limito ao uso de painéis de Led. Podemos fazer obras cinematográficas completamente dentro de motores de jogos. Isso já é possível com processos de metahumanos, que proporcionam atores virtuais interpretando todo o seu filme seguindo um sistema de captação de movimento. Nesse sentido, podemos criar as locações que quisermos, em uma realidade virtual totalmente semelhante à real. Isso fará com que a gente não precise interromper nosso processo de produção cinematográfica por conta de uma pandemia, por exemplo", ressaltou o CEO. 

Já Rafael Coimbra, editor-executivo de conteúdos digitais da MIT Technology Review Brasil e diretor do TEC Institute, atua diretamente com pesquisa e análise de tendências, pensando em como podemos aliar mentes humanas e máquinas e entendendo ainda se isso é uma ameaça ou um impulsionador de novos negócios. "Imagino um futuro em que mais do produtores de filmes, teremos programadores de filmes, no sentido de pessoas que farão os filmes usando apenas as tecnologias. Estamos em um processo de captura de padrões de dados onde a inteligência artificial tem um papel fundamental. As máquinas, em algum momento breve, vão capturar não só imagens estáticas, mas também padrões de interpretação dos atores e atrizes. Com isso, podemos contar com atores virtuais, reproduzir um ator no outro e até combinar personalidades de atores, com o rosto de um e o jeito de interpretar de outro. Precisaremos de modelos tridimensionais, como robôs e painéis de Led, para extrair essas informações. Depois, rodaremos tudo como se fosse um jogo", idealizou. 

Ele afirmou ainda que não podemos considerar só a visão e a audição e ignorar os outros sentidos: "Com as tecnologias de realidade virtual já conseguimos reproduzir sensores de calor e pressão, por exemplo. Por que não incluir cheiros e gostos também? Quando combinarmos tudo isso, abriremos novas possibilidades para a criação de narrativas completamente diferentes. As máquinas ainda não criam boas ideias, mas nós podemos criar e dar o comando para elas. Temos que descolar do 2D – ele é muito pouco diante das possibilidades que temos para trabalhar. As tecnologias estão surgindo, mas temos que meter a mão na massa para que elas saiam do papel". 

Máquina x Elemento humano 

É natural questionarmos como ficariam os empregos de diversos elos da cadeia audiovisual se tantas etapas do trabalho fossem feitas por máquinas. Os figurantes, por exemplo, não seriam mais necessários – e futuramente, talvez até os atores principais também não. O mesmo aconteceria com maquiadores, figurinistas e cenógrafos, entre outros profissionais. "Não estamos acabando com o cinema como um todo", garantiu Freitas. "O cinema vai continuar sendo feito. Sempre teremos vontade de assistir a uma bela história feita 'de verdade' por pessoas reais. O que eu tento provocar é que a gente pode ir além. O ser humano é insubstituível. Mas o que ele pode fazer com a tecnologia em termos de provocar novas sensações? Não deixaremos de contratar profissionais, só estamos adicionando mais elementos para contar histórias com menos limites, e não subtraindo nada", opinou. "A pandemia nos obrigou a parar e ligou um alerta. Pode ser que a Covid-19 não tenha sido a única pandemia que enfrentaremos. Por isso o cinema precisa transcender", acrescentou. 

Malu concorda e acrescenta que a questão é apenas adicionar ferramentas possíveis ao processo de produção, e não substituir nada: "Vamos trabalhar com uma mistura. Na produtora, temos os painéis de Led, mas ainda saímos bastante para gravar externas. É uma potencialização de possibilidades. O fazer cinema desde sempre está ligado às questões técnicas. Conforme as tecnologias evoluem, nós também evoluímos o jeito de contar histórias". 

NFT é incipiente, mas o futuro é promissor 

Uma das novidades tecnológicas mais faladas atualmente é a NFT – e segundo os especialistas, sua adoção pode ser benéfica ao setor audiovisual. "É um meio para tratarmos as propriedades intelectuais. Podemos derivar personagens e histórias, por exemplo. No audiovisual, ela ainda é incipiente, mas existe um caminho. Para a produção independente, há a possibilidade de desdobrar fragmentos daquela história para comercializar e financiar o negócio.  O audiovisual precisa explorar essas alternativas", destacou Malu. 

Para Coimbra, isso sempre acontece com as novas tecnologias: quando elas surgem, é um verdadeiro "auê" e cria-se um pico de expectativa, mas depois vem o que ele chama de "desilusão do hype". Segundo o especialista, isso acontece porque não encontramos aplicações concretas – e esse seria o caso da NFT: "Quando entramos num platô de produtividade, a nova tecnologia em questão começa a fazer sentido. Ou seja, ainda falta construirmos aplicações para as NFTs, mas acredito no potencial. Alguns caminhos que vejo é criar colecionáveis relacionados às grandes propriedades intelectuais ou comercializá-las a fim arrecadar recursos para financiar produções". 

Direito de privacidade demanda atenção 

Por fim, os especialistas assumem que com as novas tecnologias surge a necessidade de criar regras mais específicas que cuidem dos direitos de privacidade. Por exemplo: uma vez que o avatar de alguém é criado, como controlar o que será feito com esse avatar no ambiente virtual? Ainda não existe resposta certa. "Essa questão precisa ser mais discutida para garantir segurança. Conforme os avanços acontecem e novas tecnologias aparecem, automaticamente essas questões relacionadas aos direitos vêm à tona", falou Malu. 

Freitas concorda e afirma que isso será "bem complicado". Para ele, esse controle é praticamente impossível: "Não sei como conseguiremos controlar isso, se é que será controlado. A não ser que a gente regule a internet de uma maneira muito extrema". Por fim, Coimbra sugere: "No futuro, talvez tenhamos algum tipo de marcador digital que nos permita saber se alguém pegou a minha imagem na internet e está usando para fins que não autorizei. É um futuro distante, mas podemos construir algo nesse sentido". 

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