Produtoras e canais concordam: conceito de janela de exibição é cada vez mais irrelevante

Canais e produtores independentes se reuniram na tarde desta quarta-feira, 28 de agosto, durante painel na SET Expo 2019, para discutir se no que diz respeito ao conteúdo audiovisual original o momento atual é marcado pelo fim das janelas. A conclusão é unânime: as formas como consumimos conteúdo romperam as paredes que antes delimitavam se o produto foi feito para TV aberta, TV paga, VoD ou cinema.

O mercado concorda que conteúdo é o que move esse cenário. Adriana Favaro, diretora comercial de veículos da Kantar Ibope Media, afirma que, hoje, o foco deve ser em um conteúdo relevante que gere boas experiências e faça com que o consumidor se engaje. "A discussão fica muito em cima de novas tecnologias e formas de distribuição e, às vezes, esquecemos o que de fato aquele consumidor quer ver. Estamos vivendo a chamada Smart Era, ou a Era da Experiência. Por isso o ponto é como gerar a melhor experiência digital para os consumidores para que eles se interessem por todo esse conteúdo que está disponível.", pontua.

Paulo Rabello, diretor de engenharia de entretenimento da TV Globo, explica que o ecossistema de criação e produção de conteúdo original é extenso, e passa por boas histórias, contadas por bons personagens interpretados por um bom elenco, direção, tecnologia de captação e pós e ainda para distribuição ampla. "Tudo isso custa dinheiro e precisamos pensar em formas de rentabilizar esse ecossistema. Existem quatro grandes elementos que pagam essa conta: leis de incentivo e apoio; comercialização de conteúdo, o merchan; peças publicitárias adjacentes ao conteúdo – que paga mais de 80% – e o consumidor direto, com assinaturas e transações do gênero. É a quantidade de pessoas que assistirá a esse conteúdo que fará com que você tenha mais ou menos verba para investir. Essa roda precisa gerar por conta, sem depender tanto de apoio público.", avalia.

O diretor assume que o plano da Globo é maximizar o uso das janelas para ter mais dinheiro e, assim, produzir de forma mais efetiva. Como cases, ele cita "Lady Night", talk show de Tatá Werneck, e "Assédio", série original Globoplay. Ambas as produções nasceram em uma janela pontual e migraram para outras. No caso de "Lady Night", ele estreou no Multishow – foi uma produção em parceria com a Globosat – foi para a TV aberta, onde está em exibição atualmente, e já está disponível no streaming, no Globoplay e também no VoD da Globosat. Já "Assédio" foi lançada em um primeiro momento no Globoplay, como original da plataforma, depois foi exibida em formato de minissérie na TV aberta e, em breve, vai para a programação da Pay TV. "Essa rentabilidade por si só precisa sustentar a cadeia produtiva. Um único player, como era antigamente na TV aberta, não é o suficiente para bancar essa conta. É um raciocínio amplo de financiamento de conteúdo.", conclui.

Roberto d'Avila, fundador da Moonshot Pictures, também tem um case que corrobora com o posicionamento de Rabello: o "Sessão de Terapia". Propriedade intelectual estrangeira, adaptada em muitos países, a série ganhou uma versão brasileira pelas mãos da produtora de d'Avila e fez três temporadas bem sucedidas para o GNT. A última foi exibida em 2014. Agora, em 2019, cinco anos depois, a Moonshot foi procurada pelo Globoplay em parceria com o GNT para uma leva de episódios inéditos do programa. "Acredito que eles quiseram resgatar a propriedade por conta do atual momento onde todos os players procuram conteúdos relevantes e que possam se destacar no gosto do consumidor no meio de tantas ofertas.", afirma. A série que nasceu na TV fechada estreia sua nova temporada – dessa vez no streaming – nesta sexta, 30. "Outro ponto que acrescentaria na fala de Rabelo é a equação territória. Temos que pensar nessas três frentes: tempo, janelas e territórios, sendo essa última muito importante. A própria Globo, com o Globoplay, que é um player doméstico, está entrando nessa briga por território com os gigantes internacionais.", diz o produtor.

Nesse contexto de "quebra de janelas", produtores permanecem incomodados com a falta de clareza de resultados de suas produções. "Contamos com os números de audiência da TV, mas não temos esses dados das plataformas de OTT. São caixas pretas.", define d'Avila. "Não temos acesso ao real impacto que as produções tiveram com o público. Por isso é importante estarmos próximos dos players, que conhecem tão bem sua audiência.", completa Marcio Yatsuda, presidente da Movioca Content House. Paulo Rabello, na posição de um grupo de mídia que tem a vantagem de ser produtor e distribuidor, afirma que a empresa já conta com ferramentas sofisticadas que mensuram a rentabilidade de qualquer conteúdo, e que o Globoplay vem nesse sentido de ajudá-la a entender ainda melhor o seu consumidor.

O diretor traz à tona mais uma questão para o debate e declara que, apesar do momento ser positivo para o crescimento das produtoras, por outro lado elas correm o risco de ficar dependente dos meios de distribuição, justamente por não contarem com as medições de consumo que os produtores estavam comentando. "Todos os grandes players perceberam esse movimento e saíram da Netflix. Senão todo mundo vira mero prestador de serviço das plataformas – enquanto elas se rentabilizam em janelas de tempo e território, o produtor não ganha mais nada com a sua propriedade, passa a agregar pouco.", opina. Beto Gauss, sócio e produtor da Prodigo Films, participa da discussão e afirma que é necessário que as produtoras entendam qual é o objetivo de cada produto, analisando cada um individualmente. "Nós lançamos 'Coisa Mais Linda' com a Netflix com o simples objetivo de explorar o mercado internacional. Ao mesmo tempo, com o nosso último filme, 'O Roubo da Taça', também vendido para a plataforma, penso que se não tivéssemos lançado no cinema os resultados teriam sido muito maiores. É uma fórmula complexa.", discorre.

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