Também na produção audiovisual, mulheres têm muito menos espaço que homens

No primeiro dia do Telas Fórum 2017, um dos painéis mais aguardados teve como tema principal de debate o papel da mulher no audiovisual. Débora Ivanov, presidente da Ancine, abriu o bate-papo apresentando dados de análises recentes acerca de obras produzidas em âmbitos como documentários, ficção e variedades que revelam as porcentagens de participação feminina em cada um dos principais cargos envolvidos nas produções, tais como direção, roteiro e produção executiva.
Em suma, todos os dados mostravam uma participação muito menor das mulheres em relação aos homens nos processos de trabalho. Por exemplo: de 2583 títulos analisados, somente 17% deles contaram com pessoas do sexo feminino na direção. Os números de roteiro e produção executiva são maiores – 21 e 41%, respectivamente. Mas ainda são bastante insignificantes se comparados com a quantidade de profissionais mulheres atuantes no setor e, de forma ainda mais ampla, se pensarmos também no público feminino, que consome amplamente os produtos audiovisuais.
A conclusão óbvia é que a maioria das narrativas que estão sendo contadas hoje em dia foram escritas por homens – e, por isso, muitas vezes reforçam estereótipos já tão batidos e ultrapassados da figura feminina. Outra observação interessante levantada por Débora foi o fato de que em produções de custo menor, como em curtas e médias-metragem, a participação da mulher torna-se um pouco maior. O mesmo quando fazemos o comparativo entre obras de ficção vs. documentários – nestas, também mais baratas, há mais mulheres em cargos maiores.
Segundo Débora Ivanov, Ancine está ciente dessa desigualdade e, por isso, tem buscado ações para amenizar essa disparidade. Um dos exemplos é a paridade de gênero que passa a ser registrada nas comissões do FSA. No registro das obras, passam a ser obrigatórias informações como declaração de gênero dos profissionais envolvidos, mais detalhes de equipe obrigatórios e avanço para novas funções. A presidente da Ancine contou ainda que a pauta já está incluída no Planejamento Estratégico da Ancine e que uma das ações recentes mais notáveis foi a realização do Seminário Internacional para debate da questão. O evento contou com a presença de representantes de países como Canadá e Suíça, que já têm políticas públicas nesse sentido. O próximo a participar, por já estar com projetos encaminhados, é a Inglaterra.

Ações concretas

Outra ação vista como fundamental por todas as participantes da mesa foi a implantação do Bechdel Test no Brasil, isto é, o teste que avalia como a mulher é vista nas obras a partir de três questões básicas: há pelo menos duas personagens mulheres com nome próprio na obra? Elas conversam entre si? Elas conversam entre si sobre algum assunto que não seja homens?
Por fim, a Ancine tem trabalhado ainda com o grupo Mulheres do Audiovisual Brasil, criado de forma despretensiosa em 2015 e que acabou sendo uma alavanca para dar luz às questões de desigualdade no segmento. Hoje em dia, esse grupo está presente no Facebook, com mais de 15 mil mulheres participando. Ainda para este ano, está nos planos o desenvolvimento da Constituição da Comissão de gênero, raça e etnia.
Carole Moser, da Elo Audiovisual, reforçou o claro posicionamento da produtora na luta contra a desigualdade. "Devíamos nos chamar Elas Audiovisual", brincou. Na equipe de colaboradores internos, 80% são mulheres. Elas atuam, por exemplo, na curadoria de projetos que chegam à produtora, avaliando sempre sob a perspectiva feminina, isto é, verificando o Bechdel Test e atentando-se a possíveis conteúdos machistas ou nuances que demonstrem falta de sensibilidade para com o ponto de vista feminino dentro das obras. "Para a Elo, isso é um trabalho que, de tão fundamental, já é feito naturalmente", afirmou Carole.
Já Maria Rita, do CinebrasilTV, comemorou o amparo institucional que as profissionais mulheres do meio têm recebido nos últimos anos por parte da Ancine. Ela, que é coordenadora de conteúdo, acredita que essa mudança também está acontecendo aos poucos dentro dos próprios canais. "No CinebrasilTV, atuamos sob o posicionamento de gênero, raça e luta", define. Ela alerta que é um movimento progressista, que não vai mudar do dia para a noite, mas que quanto mais for ressaltado, mais fácil será. "Precisamos colocar os pingos nos is", defende.
Apesar disso, Carole levantou que ainda não existe uma demanda significativa por parte de canais por conteúdos que estejam atentos à questão de gênero. "Mesmo nos tempos atuais, nos deparamos ainda com muitos conteúdos que desviam muito desse processo que queremos enfrentar de igualdade entre homens e mulheres", lamenta.
Para finalizar o painel, Débora Ivanov informou que a própria Ancine tem contratado mulheres para estarem à frente de cargos internos relevantes. "Estamos em busca do protagonismo, e não mais do papel de assistência", concluiu.

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