A noite da última quinta, 29, foi marcada por filmes com a temática Amazônia e meio ambiente no Festival de Brasília do Cinema Brasileiro. Como parte da Mostra Competitiva do festival, foram exibidos o curta "Chico Mendes – Um Legado a Defender", de João Inácio, e o longa "O Tempo que Resta", de Thaís Borges – ambos documentários.
O curta de João Inácio fala sobre a trajetória de Chico Mendes, abordando o legado deixado por ele especialmente entre os jovens da região. O projeto foi co-financiado e idealizado pelo WWF (ONG que atua nas áreas de conservação, investigação e recuperação ambiental). "Ainda existe muito debate em torno da figura de Chico Mendes, questionando se ele foi ou não um ativista. O fato é que a maioria dessas pessoas que mora na Amazônia procura viver sustentavelmente, é inerente a quem convive com a natureza", comentou o diretor em debate realizado nesta sexta, 29.
Já o longa "O Tempo que Resta", que marca a estreia da jornalista Thaís Borges no cinema, teve a sessão mais aplaudida do festival até agora. O documentário aborda os ataques à região Amazônica a partir da história pessoal de Maria Ivete Bastos e Osvalinda Marcelino Pereira, duas agricultoras e líderes na luta pela defesa do meio ambiente e a manutenção da floresta. A dupla vive sob constante ameaça por parte das milícias madeireiras e fazendeiros, tendo inclusive já sofrido diversos atentados físicos e psicológicos. Atualmente, as duas moram em Brasília, sob um programa de proteção, mas esperam em breve poder voltar para casa.
O filme de Borges não traz entrevistas com especialistas e nem apresenta dados a respeito da questão ambiental – a diretora preferiu o registro do cotidiano das duas mulheres, acompanhando-as no dia a dia em casa, com os maridos e os filhos, e no trabalho, que consiste em agricultura familiar e comércio de alimentos sem agrotóxicos. Ainda assim, o clima de violência é constante nessas rotinas e o viés político se faz presente. As duas ativistas estiveram presentes no debate realizado na manhã desta sexta, 29, contando mais sobre suas trajetórias e a situação atual – agravada desde que o presidente Jair Bolsonaro assumiu o poder e deu passe livre para a exploração da Amazônia – e comoveram os presentes.
O projeto de "O Tempo que Resta" surgiu quando Thaís ainda era jornalista e estava produzindo uma reportagem sobre os assassinatos no campo. "Os números eram equivalentes aos de uma Guerra Civil. E o mais impressionante é que eram só números – ninguém mostrava o rosto dessas pessoas", contou. Mais tarde, ela e Walter Guimarães, diretor de produção do filme, estavam juntos em um projeto para a Organização Internacional do Trabalho (ILO), no qual eles precisavam contar a história de alguém tivesse o direito de ir e vir, associado ao ativismo, cessado. Foi quando Guimarães conheceu Ivete – uma das personagens do documentário – em Santarém (PA). Ao mostrar a entrevista que havia feito com a ativista para Thaís, ela se emocionou e decidiu se aprofundar no assunto.
O documentário leva a assinatura da Globo Filmes e da GloboNews na coprodução, que por meio do Artigo 3ºA da Lei do Audiovisual aportaram R$150 mil para a obra. A contrapartida é que a diretora faça uma versão reduzida para exibição na GloboNews após o filme original cumprir o circuito de festivais.