Alê Abreu fala sobre criação e produção de "Perlimps"

O diretor Alê Abreu (Foto: bjork)

"Perlimps", longa escrito e dirigido por Alê Abreu – cineasta indicado ao Oscar de 2016 por "O Menino e o Mundo", na categoria de Melhor Animação -, estreia nos cinemas brasileiro em 9 de fevereiro. O filme é produzido por Laís Bodanzky, Luiz Bolognesi e Ernesto Soto Canny junto a Buriti Filmes. Viviane Guimarães é a assistente de direção. Sony Pictures, Globo Filmes e Gloob assinam a coprodução. A distribuição no Brasil será feita pela Vitrine Filmes. 

O filme acompanha a jornada de Claé e Bruô, agentes secretos de reinos rivais que precisam trabalhar juntos em uma missão importante. No elenco estão Giulia Benite (a Mônica dos filmes da "Turma da Mônica"), que dá voz a Bruô; Lorenzo Tarantelli (a voz de "Young Sheldon"), que dubla Claé; e Stênio Garcia ("O Clone", "O Rei do Gado"), como João-de-Barro. O novo trabalho de Alê Abreu conta com uma música-tema dos Barbatuques, grupo liderado por André Hosoi, que também cria a trilha sonora do filme. Assista ao trailer:

"Perlimps" estreia nos cinemas em fevereiro

"No meu processo de trabalho, vou colecionando fragmentos, coisas que me chamam a atenção, me brilham aos olhos e ao coração e vou guardando. Sempre foi assim. Quando estava terminando 'O Menino e o Mundo', já tinha anotações do que seria meu próximo projeto. Então me isolei, fui para uma pousada, tirei todas essas folhas e enchi o chão com elas. A partir daí fui entendendo quais seriam os desenhos de personagens e tendo ideias de estrutura, clima. Consegui sair dali com um argumento – ainda meio torto, precisava melhorar", contou Alê Abreu em entrevista exclusiva para TELA VIVA. "Tinha uma cena na cabeça, um momento que considero o começo de tudo e que representa o que o filme mais tarde virou. É um menino saindo da floresta, todo maquiado, e caindo numa poça d'água. Sai dela e vemos na água o espelho desse menino, que revela que ele estava em outro lugar, como se fosse outra dimensão. Sai inundado para um lugar mais mundano, pé no chão. Isso é o que talvez simbolize o que temos. Foi o plano que mais me disse a respeito do que eu queria fazer", completou. 

Assim como "O Menino e o Mundo", "Perlimps" chama a atenção pela riqueza artística – principalmente pelas cores e as paisagens que vão se revelando conforme os desdobramentos do filme. "Eu vinha de um processo muito rico de trabalho com o meu filme anterior, que teve uma personalidade forte, que ficou impressa em mim como artista. Então eu sabia que queria ir por um outro caminho. Ainda estava 'contaminado', precisava me libertar. Então me apeguei em algumas coisas que viriam a ser os conceitos-chave para encontrar meu caminho visual", explicou. "Uma delas era uma bolha da infância – tinha que ter uma certa psicodelia, explosão, uma sensação de 'tudo é possível', um lugar muito livre. Ao mesmo tempo, um lugar cercado por uma luz desconhecida, com névoa cercando todo o lugar. Esse era o primeiro ponto, essa relação entre a infância e um mundo que ainda desconheço. Depois, conforme é o dito no início do filme, os Perlimps chegam a partir de uma explosão de luz no mundo, então queria trazer essa coisa do prisma, do arco-íris. Foram os nortes que me guiaram e, quando os encontrei, o trabalho fluiu", analisou. 

Claé e Bruô são os personagens centrais de "Perlimps"

Produção remota e equipe consagrada

O filme foi feito praticamente inteiro à distância. "Quando começamos, fui para Santo Antônio do Pinhal, na região da Serra da Mantiqueira. Me faz bem circular numa área coberta de verde – foi aí que consegui escrever melhor o roteiro. Para esse projeto, isso foi importante. Os produtores levaram toda a produção para esse lugar. Deu certo: a gente arrumou uma casa para ser nosso estúdio e conseguimos receber bem a equipe de animadores que viriam trabalhar no projeto conosco. Trabalhamos durante um ano nesse lugar. Aí veio a pandemia, quando tudo estava engrenando bem, e nos obrigou a remodelar todo o processo de produção. Por sorte, tive o apoio próximo do Ernesto e da Viviane – produtor executivo e assistente de direção – que logo se organizaram para repensar nosso pipeline. Em pouco tempo, conseguimos entender como fazer tudo à distância – música, finalização, som, foi tudo dessa maneira. Nos encontramos na fase final, quando as coisas já estavam reabrindo", relembrou o diretor. 

Ele também celebrou a equipe com a qual trabalhou: "Pra mim, foi uma grande experiência. Eu, Viviane, Ernesto, Luiz e Laís formamos o núcleo principal do filme, as cinco cabeças principais. Eram pessoas o tempo todo antenadas em querer fazer o melhor filme possível. Sempre buscamos os melhores caminhos, tudo era muito debatido. A Laís e o Luiz leram o roteiro num primeiro momento e levantaram várias questões. Eles têm um entendimento diferente do mundo, mais profundo. Afinal, eu não sou propriamente um roteirista. Eles têm esse olhar mais claro para a questão dramatúrgica e trouxeram coisas importantes em termos de organização, de pensar nos personagens. O processo foi muito rico e me fez fazer outro tipo de cinema". 

Confira aqui um vídeo que mostra alguns detalhes do processo de produção:

Mensagens e temática 

"Perlimps" é uma obra aberta a diferentes interpretações – mensagens diferentes podem ficar para cada um que assiste, como lições relacionadas à amizade, respeito às diferenças, infância e cuidado com a natureza, entre outras questões. E tudo isso surgiu para Abreu de forma quase que inconsciente. "Tudo veio daqueles papéis de ideias e referências que eu tinha no início. São como peças lançadas num tabuleiro, que instigam a gente a criar e como conectá-las entre si. Esse foi o desafio. A questão da polarização, por exemplo, já estava no inconsciente da gente. Ela aparece no filme meio escondida, com a força da metáfora. Eu mesmo entendi isso só depois. É quase que um caminho às avessas: ouço o inconsciente e, mais tarde, busco explicação. Nesse 'buscar explicação' entendi a força dessas personagens. A força da infância é acreditar que tudo é possível – é isso que 'O Menino e o Mundo' e 'Perlimps' têm em comum. Isso desemboca numa esperança muito grande de que é possível mudar as coisas. A criança nasce naturalmente acreditando em utopias. E eu tenho quase um jeito de criança de fazer o filme", observa. 

Próximos projetos 

Alê Abreu segue animado para seguir fazendo seus filmes: "Eu já tenho projetos novos e vejo que agora, com o novo governo, se abre novamente um caminho muito mais produtivo, um campo para plantar e que será regado. As janelas que a TV e o VOD abriram para o conteúdo local foram muito importantes. É uma grande vitrine, que estimula novos artistas. Daí vieram séries animadas brasileiras de muito sucesso, como 'Irmão do Jorel', 'Tromba Trem' e 'Meu AmigãoZão', entre tantas outras. São produções que vieram desse impulso que a demanda por conteúdo causou. Você vê isso se desdobrando, novos artistas surgindo, crescendo, fazendo longas. A animação brasileira segue crescendo num caminho muito bonito, que eu acredito que passe principalmente por entender qual realmente é a animação brasileira. Os países que tem uma cinematografia forte de animação entenderam o que é trabalhar com isso nos seus lugares – como França, Japão e Estados Unidos. A maior armadilha, para qualquer arte, é querer fazer o que o outro está fazendo, imitar, ir pelo caminho óbvio. Nossa tarefa é entender do que se trata a animação brasileira". 

O diretor contou que "O Menino e o Mundo" ficou tão impresso nele que ficou adormecido em algum lugar que ainda o chama. "Estou envolvido com um projeto novo que se passa naquele mesmo universo, mas com outros personagens e outra história, que dialoga de alguma forma com o filme anterior. Paralelamente, meu próximo projeto – o que deve sair mais rápido – é um curta, para ter uma espécie de respiro". 

A estreia mundial de "Perlimps" foi em junho de 2022, na sessão "Événements Excepcionelles" do Festival de Annecy – considerado o evento mais importante do mundo da animação -, na França. No Brasil, as primeiras exibições aconteceram mais tarde, em outubro, como parte da programação do Festival do Rio. Ainda no mesmo mês, o longa integrou a 46a Mostra Internacional de Cinema de São Paulo. Em 2023, "Perlimps" ganha as salas de cinema por todo o Brasil. 

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