Afinal, o que é TV por assinatura?

Duas notícias trazidas por este noticiário nesta quinta, 9, sobre o mercado de TV por assinatura, nos levam a uma pergunta estranha, mas necessária. Afinal, o que é TV por assinatura? A julgar para a Pesquisa Nacional por Amostra dos Domicílios (PNAD) divulgada pelo IBGE, as pessoas, quando perguntadas sobre se têm ou não TV por assinatura em casa, acabam colocando tudo no mesmo balaio: TV paga tradicional, streaming, pirataria… Tanto é que, enquanto os dados da Anatel de 2022 mostraram uma queda no mercado de TV paga de mais de mais de 7% na base de assinantes no ano, os dados da PNAD mostraram praticamente uma estabilidade na quantidade de domicílios que se declaram assinantes do serviço, até mesmo com um improvável crescimento nas áreas rurais.

Apesar da diferença de metodologia (o IBGE olha a penetração sobre o total de domicílios com TV, de 71,5 milões de lares, e a Anatel prefere olhar o total de acessos), os resultados deveriam ser mais próximos, e não são. Colocando tudo na mesma métrica, se para o IBGE existiam 27,7% dos domicílios com TV por assinatura no Brasil em relação aos domicílios com TV no final do ano passado, para a Anatel eram apenas 17,5% em 2022. Se para a Anatel esse percentual cai ano após ano e a penetração por domicílios é hoje metade da que era no ápice do total de acessos, em 2014, para o IBGE a penetração por domicílio caiu bem menos: menos de 7 pontos percentuais desde 2016. Por que? 

A explicação mais provável é que, ao responderem, as pessoas não fazem distinção se estão declarando um serviço tradicional (no modelo do Serviço de Acesso Condicionado, regulado pela Anatel e pela Lei 12.485/2011), um serviço pirata contratado clandestinamente por meio das inúmeras ofertas de TV box no mercado, ou um serviço legítimo ofertado pela Internet, como streaming ou um serviço OTT de uma operadora ou programadora de TV paga reconhecida.

Para entender a diferença é preciso olhar o questionário aplicado pelo IBGE ao fazer a pesquisa PNAD (disponível aqui). Existe uma pergunta bastante aberta quando questiona o entrevistado sobre a posse de TV por assinatura na casa. A pergunta é direta: "Este domicílio possui serviço de televisão por assinatura?". Note-se que não são citados nomes de operadoras, tipos de tecnologia ou nenhum outro elemento que permita ao entrevistado refletir sobre a sua resposta. Mas o questionário é bem mais específico quando a pergunta é sobre consumo de streaming: "Este domicílio tem acesso a serviço pago de streaming de vídeo como Netflix, Amazon Prime Video, Disney+, Globoplay etc.?". Além disso, as perguntas sobre streaming acontecem mais adiante no questionário, depois de perguntas sobre consumo de internet, posse de dispositivos conectados entre outras.

Quem está certo?

Independente de qualquer discussão sobre a metodologia, na essência o IBGE capta a resposta mais importante: se as pessoas estão pagando ou não para receber o conteúdo. Ou, em síntese, se estão assinando… TV. E esse é o ponto: a TV por assinatura, que tradicinalmente é lembrada como um serviço em queda, na verdade segue relevante e presente em quase 28% dos lares brasileiros com TV, que é quase o mesmo percentual de penetração que tinha em 2014 (29,8%), quando a TV paga chegou ao seu apogeu no Brasil.

E esse percentual registrado na PNAD de 2022 é certamente maior, se somarmos o percentual das pessoas que certamente souberam fazer a distinção entre ter TV por assinatura e ter acesso a algum serviço de streaming, e responderam conscientemente "não" para a primeira pergunta e "sim" para a segunda. Se para o IBGE existem 27,7% dos domicílios com TV por assinatura (entre os lares com TV) e 43,4% dos domicílios com TV com acesso a algum serviço de streaming (sem contar os domicílios que consomem conteúdos pela Internet gratuitos, como Youtube), é razoável estimar que quase metade dos 70,5 milhões de domicílios brasileiros com TV pagam para receber conteúdos.

O que está "errado" é o número da Anatel, que há anos vem sendo o padrão da indústria para acompanhar o que está aconcendo no mercado de TV por assinatura. É um número limitado pois reflete, apenas, o serviço regulado pela agência (Serviço de Acesso Condicionado), que é classificado como serviço de telecomunicações e regido pela Lei 12.485/2011. O SeAC, de fato, despencou, simplesmente porque foi substituído por outros modelos.

E é ai que entra a segunda notícia do dia: se olhado sob esta perspectiva mais ampla, o ciclo negativo da TV paga está próximo do fim, conforme mostram os crescentes números da base de acessos de TV por assinatura da Claro (maior operadora do Brasil) no modelo OTT. Pela primeira vez este noticiário conseguiu o número preciso (730 mil), e o planejamento da empresa aponta que o crescimento volta a aparecer no horizonte para meados de 2024.

Fato é que hoje 14% da base de clientes de TV pagantes da Claro está fora do radar do número "oficial" da Anatel, assim como estão os assinantes do serviço DGO, da SKY/Vrio; ou o serviço da Watch Brasil (estimado em mais de 1 milhão de assinantes pagantes); ou serviços de outros agregadores de canais lineares que distribuem os serviços pela Internet. Sem falar nos usuários dos serviços piratas.

A reflexão óbvia, portanto, é que a TV por assinatura enquanto produto (e mercado) não morreu. Mais do que isso: se o número da PNAD do IBGE está correto, existem quase 20 milhões de lares com TV pagando para receber TV por assinatura, e mais de 30 milhões de lares pagam para contratar um serviço de streaming. O que não existe é algum sentido em uma parte do mercado ser regulada por uma lei e pela Anatel  (11 milhões de domicílios com SeAC, para ser mais preciso) e todo o resto, não. 

1 COMENTÁRIO

  1. Isso deixa bem claro que o problema da TV por assinatura convencional chama-se regulação, tornaram o serviço caro, engessado, e pouco competitivo, canais obrigatórios que ninguém assiste e só existem pra atender a lobby e servir de mamata pra tal classe artística. Agora esse (des)governo de plantão que só sabe taxar e regular (e apoiado por essa mesma classe artística) quer encarecer e piorar a qualidade do streaming com cotas e taxas (famigerado Condecine, que só serve pra custear produtos ruins que ninguém assiste e ninguém demanda). Está mais do que evidente que streaming não deve e não precisa de qualquer "regulação". E essa tal de lei do Seac tem que ser inteiramente revogada.

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