Para Sarah Mosses, da Together Films, formação de público, timing e engajamento são os pilares da distribuição de impacto

A fundadora e CEO da Together Films, Sarah Mosses, ministrou uma palestra na tarde desta quinta-feira, 12 de novembro, durante o Reach – Questões de Audiência, braço de programação voltado ao mercado do BrLab, sobre distribuição de impacto. A inglesa Together Films atua hoje como ponta-de-lança da elaboração de modelos de distribuição únicos e no engajamento do público em debates sobre temas de importância. No painel, Mosses enfatizou as mudanças que a pandemia de Covid-19 trouxe para o meio da distribuição, especialmente no que diz respeito aos filmes de impacto, e como ela enxerga o futuro da área.

Mosses explica que, por definição, a distribuição de impacto visa fazer com que os projetos audiovisuais gerem receita ao mesmo tempo que cumpram seu propósito social. É o caso de filmes que falam sobre meio ambiente ou direito das mulheres, por exemplo. O objetivo deles não é apenas fazer com que as pessoas assistam, que os números de audiência sejam altos – mas também que haja um real impacto social. "Não é só sobre vender ingresso, e sim sobre gerar engajamento com o tema. São coisas que demandam tempo e energia. Por isso que eu só consigo vender filmes que me despertam paixão. O que me toca são projetos que visam mudar o mundo", declara. Mas, antes dessa mensagem, vem a qualidade do filme. "Ele precisa ser muito bom antes de tudo, e ter uma narrativa forte. Senão, não irá conquistar o público", completa.

Falando em público, a profissional ressalta a importância de pensar nele em todas as etapas, desde a criação do projeto até a finalização. Para ela, a construção da audiência começa muito antes do lançamento de um filme: "Por meio de newsletters, mídias sociais e sites, você deve ir construindo esse público. O maior asset do produtor hoje em dia é ter o público pronto quando vai lançar o filme, isto é, pessoas já esperando para assisti-lo. Isso garante um lançamento muito mais bem sucedido. E na distribuição de impacto, é ainda mais fácil identificar quem são as potenciais pessoas apaixonadas por determinado tema – e isso é fundamental no processo de construção de audiência". Como exemplo, Mosses cita um filme sobre meio ambiente e questiona: "Qual é o tema central da obra? Ela fala só sobre meio ambiente ou também aborda justiça social?". Ou seja: para pensar em quem será o público-alvo daquele filme e como se dará a sua distribuição, é vital entender quais são as questões apresentadas ali. Além disso, a executiva acrescenta que é essencial também que o produtor saiba o que veio antes, isto é, quais outros filmes sobre os mesmos temas já foram feitos, como eles foram recebidos pela audiência e qual impacto causaram. E não só em relação ao audiovisual: é importante também acompanhar o que tem saído na mídia sobre o assunto. Se estamos falando de mudanças climáticas, por exemplo, em que ponto está essa conversa? Qual o contexto atual? Isso é relevante para que haja uma perspectiva de uma construção anterior ao lançamento de fato.

Nesse sentido, Mosses observa que, apesar de ainda ter como foco na empresa os longas-metragens, ela tem provocado os parceiros a respeito de conteúdos curtos, justamente para que eles possam aproveitar o timing das conversas que têm acontecido sobre o tema com o qual eles estão trabalhando. "Neste ano especialmente, as pessoas têm consumido muito conteúdo curto. Existem muitas opções de novos formatos. A distribuição de impacto mudou muito nos últimos anos e alimentar o público com narrativas curtas tem se mostrado um caminho muito eficiente. Elas ajudam naquele processo de ir criando uma audiência que, mais tarde, quando você for lançar um longa, por exemplo, já estará na expectativa de assistir. Narrativas curtas podem inspirar ações imediatas", afirma.

A executiva bate bastante nessa tecla do timing e da sua importância dentro das estratégias de distribuição de impacto. Por exemplo: todo o mundo sabia que, neste ano, haveria eleições nos EUA. Então qualquer produto audiovisual que fosse falar sobre algum tema relacionado a isso – democracia, a importância do voto, as campanhas presidenciais – precisaria ter em mente esse cronograma, entendendo quando seria mais estratégico lançar seu material para atingir o impacto desejado. "Planejar com antecedência é fundamental. Se a ideia era falar de eleições, o público deveria estar sendo engajado desde janeiro. Este é o momento, por exemplo, de sentar com a equipe e mapear os acontecimentos importantes que já sabemos que ocorrerão em 2021. É claro que queremos estar nos festivais, mas às vezes há outros timings mais importantes", argumenta.

Mosses ainda enfatiza o papel das redes sociais na distribuição de impacto: "É interessante estar presente em todas as plataformas sociais e, ali, trabalhar seu conteúdo, postando frequentemente para criar uma campanha. Não é só anunciar que o filme estará em determinado festival ou pedir para que o público compre ingresso, e sim trocar ideias e promover uma conversa. É claro que tem que falar sobre assistir o filme também – mas postar só isso fica chato. Tem que manter o engajamento da audiência com o tema, checar o que saiu sobre o assunto todos os dias. Você tem que tornar uma fonte de conhecimento sobre aquele tópico". Segundo a executiva, manter essa conversa acesa e uma presença digital constante garantem que, quando o filme for lançado, não haja um pico de audiência que vá cair drasticamente pouco tempo depois. "É importante discutir o assunto por anos, e a melhor forma para isso é fazer com que o público-alvo se torne o motor da sua campanha", completa.

Impactos da pandemia no meio

O setor da distribuição precisou se reiventar quase que por completo com a chegada da Covid-19. Com as salas de cinema fechadas e a impossibilidade de realizar eventos presenciais, a distribuição de impacto sofreu grandes mudanças – as quais Mosses enxerga como positivas e, mais do que isso, definitivas. "A melhor estratégia para a distribuição de impacto são as conversas pós-exibição. Com o screening online, você consegue a participação de palestrantes de alto nível, de qualquer lugar do mundo, que antes, no presencial, você não cogitaria. Conversar com o público faz com que as pessoas se animem, acende uma paixão dos fãs de cinema e dos envolvidos com o tema. Nós já incorporamos realmente a exibição no ambiente digital e percebemos suas vantagens", aponta a especialista.

Ela conta que, recentemente, trabalhou com muitos filmes que falavam sobre direitos da mulher e, alguns deles, tocavam em temas mais delicados, como assédio. "Nas sessões online, havia a possibilidade de as mulheres seguirem para uma sala fechada com terapeutas, apenas se quisessem, logo após a exibição. Fisicamente, no cinema, isso seria inviável. O público ficaria interessado em ver o filme, mas não teria muito mais o que pudessemos fazer. Online, as pessoas sentem menos vergonha. É uma oportunidade incrível de conexão ainda mais profunda com o público", garante. Outras experiências positivas que ela comenta são as premières online seguidas de painéis de perguntas e respostas – nesssa semana mesmo houve uma com mil pessoas assistindo simultaneamente, coisa que nos cinemas físicos seria praticamente impossível.

Para Mosses, "o mercado de distribuição de filmes mudou completamente e para sempre". Ela acrescenta que a ideia de janelas seguindo a mesma ordem – isto é, lançamentos no cinema e só depois de um tempo mínimo no streaming – acabou. "Estou animada para 2021. Acredito que continuaremos vendo esse movimento de mudança da distribuição. A regra é levar o filme para onde o público está. Hoje, já podemos fazer coisas que antes diziam que seria impossível", declara. O conselho da executiva para os profissionais do mercado é para que não se preocupem com regras antigas de distribuição, especialmente no meio da distribuição de impacto: "Se você quer fazer uma exibição online com entusiastas e ativistas de diferentes países, faça. Não espere alguém falar o que você deve fazer. Faça o que fizer mais sentido para o seu filme". No entanto, ela acrescenta: "Mas cheque se a plataforma é segura, isto é, para garantir que seu filme não será pirateado".

A profissional fala ainda sobre a medição de impacto desse tipo de distribuição, e diz que ela muda muito de uma campanha para a outra, dependendo do filme em questão. Mosses indica definir, no ato da estratégia de lançamento, quais são os impactos pretendidos, para além de arrecadar receita. É mudar alguma lei? É incentivar um novo comportamento nas pessoas? É gerar doações para determinada causa? São metas que devem ser estabelecidas caso a caso.

Por fim, a executiva aborda sessões gratuitas, muito comuns quando falamos em distribuição de impacto, e diz não ser contra a prática, contanto que não banalize o filme. "Gerar receita ainda é importante, é um objetivo que deve andar junto com o impacto. Tem investidores envolvidos nos projetos. Sessões gratuitas customizadas, com objetivos pontuais, são os caminhos mais recomendados", conclui.

DEIXE UMA RESPOSTA

Por favor digite seu comentário!
Por favor, digite seu nome aqui