Talentos do audiovisual infantil defendem que crianças sejam incentivadas a consumir conteúdo nacional desde cedo

Daniel Rezende, Rosane Svatman, Cecília Mendonça e a moderadora Juliana Capelini, da Conspiração (Foto: Divulgação)

Na manhã desta sexta-feira, dia 14 de abril, o painel "Formação de público e novos olhares para o infantil e o infanto-juvenil" reuniu talentos do audiovisual de diferentes frentes, como direção e roteiro, para debater o desafio de pensar no conteúdo para o público infantil no contexto atual de mercado multiplataforma, onde as crianças estão, desde cedo, acessando janelas como YouTube e TikTok. 

Para Daniel Rezende, que dirigiu os filmes em live action da Turma da Mônica "Laços" e "Lições", o assunto é urgente, político e demanda atenção, uma vez que estamos falando da formação de novos públicos, isto é, quem vai estar assistindo aos conteúdos brasileiros nos próximos anos. "O objetivo é que eles possam, desde cedo, dizer que o audiovisual nacional é bem feito. Temos que nos adequar aos novos tempos, claro, mas não podemos perder a essência de contar uma boa história. É isso que vai prender a atenção", apontou. "Eu não tinha experiência nenhuma nesse mundo e, de repente, peguei um dos maiores ícones da cultura pop brasileira para adaptar. Fui pensando em quem são essas crianças de hoje mas, ao mesmo tempo, não queria adaptar a história para um universo 100% delas. Tanto é que, nos filmes, não tem internet, celular, nem o ritmo rápido do TikTok. São os bons personagens e as boas histórias que vão fazer as crianças se conectarem", defendeu. 

Algoritmos não ditam histórias 

Nesse sentido, ele colocou que algoritmos e pesquisas de tendência são ferramentas, mas não ditam regras a serem seguidas. "A criança não vê algoritmo, vê histórias e personagens. Eles têm que ser a locomotiva que move. Quem está contando a história tem que fazer isso com verdade", reforçou. 

Cecília Mendonça, VP de desenvolvimento e produção da Disney Latin America, concordou e afirmou que, em relação ao algoritmo, ainda prefere ser mais intuitiva: "A tendência é importante, mas números não devem determinar o que vamos fazer. Considero esse mundo multiplataforma ainda novo. Até quem está nesse mercado há anos segue aprendendo. Por esse lado, os números ajudam um pouco. Nós não vamos começar a produzir conteúdo para todas essas plataformas porque não está no nosso DNA. Mas, como convivemos com elas e elas trazem esse ritmo mais ágil, precisamos que os nossos conteúdos prendam a atenção das crianças logo nos primeiros minutos. A maneira de contar tem que prender desde o começo. Estamos aprendendo tudo isso – e sempre querendo contar a melhor história e tratando esse público com muito respeito". 

E para a autora, diretora e produtora Rosane Svatman, que em 2022 lançou "Pluft, o fantasminha" nos cinemas e que, neste ano, lançará a série musical "Vicky e a Musa", uma parceria Globoplay e Gloob, o caminho não envolve só olhar as pesquisas, mas também conversar com as crianças e entender o que elas pensam. 

A executiva da Disney acrescentou que a missão é fazer bons conteúdos que deixem boas mensagens: "Mas não necessariamente tudo tem que ser educativo. É entretenimento com uma boa mensagem, que possa ajudar na educação das crianças. Mas não somos uma escola, não podemos ocupar esse lugar". 

Quebrar barreiras de preconceito com conteúdo nacional  

O cinema como um todo ainda sofre para recuperar o público no pós-pandemia. Com o cinema infantil nacional, não é diferente. "Hoje, temos esperança de que os cinemas voltem a encher, além de novos mecanismos de fomento de produção e distribuição. 'Pluft' foi convidado para estar em muitos festivais, como Gramado e Rio, e em todas as sessões eu perguntava para as crianças quem estava ali, numa sala de cinema, pela primeira vez. A maioria delas levanta a mão. Isso me emociona porque é muito bom que elas possam lembrar para sempre que aquele foi o primeiro filme que elas viram no cinema. E também porque eu acredito que um filme nasce na sala do cinema. A sala escura, a experiência coletiva, tudo isso é único", afirmou. 

"Óbvio que a pandemia afetou bastante. A questão é que sair com as crianças para o cinema é um programa familiar, então temos que fazer com que os pais que tenham filhos escolham levá-los para assistir filmes nacionais. Porque esses pais estão indo no cinema ver filmes internacionais, então não é que o hábito se perdeu. A concorrência é desleal, mas muito disso porque foi estabelecido há muitos anos que lá fora eles fazem filmes de qualidade. As crianças assistem Disney, Pixar. Temos que vencer a barreira de preconceito dos pais e, aí, evitar que ela acompanhe as crianças", analisou Rezende. "E a maneira que temos de fazer isso é produzir mais e mais filmes. Ter cada vez mais opções de filmes nacionais para que as crianças cresçam com essa noção de que nossos filmes são bons", completou. 

Cecília, do ponto de vista de quem trabalha diretamente com uma plataforma de streaming que lança conteúdo nacional, defendeu que quem tem que assistir primeiro aos produtos brasileiros são os próprios brasileiros. "Nós produzimos localmente, mas claro que queremos que os conteúdos sejam vistos no mundo todo. Mas nós viralizamos conteúdos de fora e não damos chance para o nosso. As coisas de fora são boas, mas as nossas também são. E nós ainda não olhamos para o conteúdo nacional nesse mesmo nível, não damos a chance de saber se está no mesmo nível. E cada vez mais está. Eu faço esse esforço todos os dias, mas enxergo que o primeiro desafio do conteúdo nas plataformas é receber a aceitação do público local", destacou. Como exemplo, ela citou a série "Mila no Multiverso", lançada este ano com produção da Boutique Filmes. "A série funcionou super bem fora e, aqui, parece que temos que convencer as pessoas a assistirem. Temos que mudar primeiro esse consumo interno", reforçou. 

Importância política 

Rezende enfatizou a importância de políticas relacionadas a essa formação de público infantil, em ações que combinem cultura e arte com educação. "Devemos levar as escolas para assistirem filmes nacionais. A integração entre cultura e educação é primordial para formar novos públicos. Para tirarmos os estigmas que a produção nacional ainda tem, precisamos ensinar as crianças nesse consumo desde cedo", finalizou o diretor, que se prepara para lançar novos projetos relacionados à Turma da Mônica, como a série "Franjinha e Milena", para o streaming, e o filme do Chico Bento, para os cinemas. Rezende atuará como supervisor artístico dos projetos, que serão feitos pela Biônica, que também produziu os longas.

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