Streaming com publicidade encontra terreno fértil para crescer no Brasil

O streaming já é uma realidade nos lares dos consumidores há mais de uma década. O sucesso do modelo SVOD, com o pioneirismo da Netflix nesse sentido, se espalhou pelo mundo a partir de 2011. De lá pra cá, surgiram inúmeras outras plataformas – o "boom" de serviços foi ainda mais notável na pandemia, quando as recomendações de isolamento social fizeram as pessoas ficarem em casa e, assim, consumirem mais conteúdos de entretenimento. Mas é bom lembrar que o streaming é uma brincadeira cara: assinar os dez principais serviços atualmente disponíveis no mercado custa cerca de R$208 ao mês – considerando os planos mensais e pacotes mais simples de cada um e descartando as possibilidades de assinaturas combinadas. E num cenário de crise econômica, com o bolso do consumidor brasileiro cada vez mais raso, esse valor é se torna quase impraticável.  

A solução para baratear os serviços seria então incluir propaganda, no bom e velho modelo da TV aberta. Aí, entra em cena o AVOD – já bastante popular e em pleno momento de ascensão no Brasil e no mundo – e outros formatos de plataformas sustentadas por publicidade. Dados da Kantar Ibope Media revelam números interessantes: em um dia, plataformas AVOD alcançam 28% das pessoas que consomem conteúdos de vídeo em casa; em uma semana, 46%; e em um mês, 58%. O SVOD, por sua vez, em um dia alcança 11%; em uma semana, 26%; e em um mês, 42%. Ou seja: o SVOD demora quase uma semana para alcançar quase que o mesmo volume que o AVOD alcança em um dia, o que mostra a relevância desse modelo. 

A consultoria BB Media, por sua vez, identifica ainda que a penetração do consumo de conteúdo online no Brasil cresceu, com um aumento de 24,7% de 2017 a 2021, e que todos os modelos de negócio cresceram – com destaque para o AVOD (incluindo YouTube), que cresceu mais de 100% em número de horas assistidas. A própria Netflix, que anos atrás garantia que seu serviço nunca incluiria publicidade, já voltou atrás e prepara planos de assinatura com anúncios com previsão de lançamento para 2023. 

As pioneiras

Lançada no Brasil em dezembro de 2020, a Pluto TV, serviço de streaming gratuito da Paramount, foi uma das pioneiras nesse movimento. A plataforma combina conteúdos exibidos de forma linear, em canais – hoje, são 87 disponíveis em território nacional – apresentados em um formato bastante semelhante ao da TV tradicional, com opções também em on demand. "Temos crescido a base de usuários de forma consistente desde o lançamento, bem como a quantidade de canais que temos. Grande reflexo deste resultado é a quantidade de marcas que temos anunciando na Pluto TV atualmente", garantiu Denis Onishi, diretor de Negócios e Ad Sales da Paramount, em entrevista exclusiva para TELA VIVA. A Pluto não tem um gênero predominante – há canais de filmes e séries variados, bem como outros exclusivos de reality show, de notícias, infantis e de conteúdos clássicos. "A audiência tem gostos e preferências distintas e a variedade no conteúdo é um fator que atrai o público consumidor de streaming", pontuou o diretor. Vale ressaltar que a Pluto é um pouco diferente do AVOD: trata-se de uma plataforma FAST (Free Ad Supported Streaming TV), na qual o usuário tem uma experiência de consumo de conteúdo na TV. 

Para Denis Onishi, da Paramount, bom resultado da Pluto TV está relacionado à quantidade de marcas que anunciam hoje na plataforma

Apesar do constante crescimento de audiência e de anunciantes, Onishi ressalta que ainda existe um trabalho grande de "evangelização" do mercado em relação à utilização da TV conectada. "Mas já conseguimos enxergar uma diferença muito grande de aceitação. Nossa estratégia de participação em eventos do mercado tem nos ajudado muito a abrir portas", revelou. O executivo reforçou ainda a demanda que serviços como a Pluto têm especialmente em países como o nosso: "Se considerarmos um país como o Brasil, onde grande parte da população está concentrada nas classes B, C e D, faz sentido que o consumo de um serviço gratuito seja maior que o pago. Basta comparar, por exemplo, a base de assinantes de celular, onde sua maioria é pré-pago. Porém, quando você junta um serviço gratuito com uma grande qualidade e também uma ampla variedade de conteúdo, esta combinação é perfeita para que o streaming gratuito continue crescendo no país". 

Também em 2020, chegou ao país o ViX Filmes e TV, plataforma de streaming gratuita. O serviço foi lançado nos Estados Unidos e na América Latina em outubro de 2019, quando não havia planos de trazê-lo tão cedo ao Brasil. Mas em março de 2020, com a pandemia, o consumo da plataforma nos territórios em que ela estava presente cresceu exponencialmente, então a companhia tomou a decisão de acelerar o lançamento no Brasil. "A aposta em diversos gêneros e estilos de conteúdo é a estratégia do ViX para se conectar com variados públicos, do esporte, da novela, da gastronomia e do entretenimento, entre outros; queremos proporcionar uma experiência diferente ao usuário, com acesso a conteúdos que muitas vezes não são tão familiares. A ideia é que ViX seja uma plataforma democrática em todos os sentidos e que todos, de alguma forma, se identifiquem. Entendemos que, à medida que as pessoas passam a ter mais informação e conhecimento das plataformas AVOD, além de mais acesso a conectividade, esse interesse só vai aumentar", apontou Fabio Castaldo, diretor comercial do ViX no Brasil. 

"Por ser um formato novo, as agências ainda ficam um pouco reticentes. Já os clientes, percebemos que eles estudam o movimento de migração da Pay TV e TV aberta para o streaming, tanto por ser uma tendência quanto pela rentabilidade e métricas da internet. Hoje, conseguimos sentir uma abertura e interesse maior de agências e clientes para conhecer e testar o formato", acrescentou o diretor, que contou ainda que a empresa consegue entregar um viewability e completion rate de quase 100%, além de dados como gênero do usuário, região e comportamento, para os anunciantes que têm campanhas no ar pela plataforma. 

Fabio Castaldo, diretor comercial do ViX, ainda enxerga agências um pouco reticentes diante do formato relativamente novo

Aposta no conteúdo segmentado 

A Encripta administra uma série de canais gratuitos e a maioria deles têm se destacado com bons resultados. Hospedados no YouTube, o Alta Tensão, focado em títulos de ação, e o Despertar, voltado a produções de fé e espiritualidade, são exemplos. Criado em 2021, o Alta Tensão já conta com mais de um milhão de inscritos, enquanto o Despertar tem 920 mil. Ambos somam, juntos, cerca de 350 milhões de visualizações. Ao contrário da Pluto, que aposta na cartela de canais variados, a Encripta criou marcas bastante nichadas. "A decisão de criar os canais segmentados foi para atingir um público específico mesmo.  Observamos que, apesar de termos mercado para uma plataforma de conteúdos variados, como a NetMovies, temos também um mercado para públicos de nichos, como conteúdos Fé e Família, filmes Clássicos, Terror, entre outros.  Este público de nicho é bem fiel e faz sentido manter um canal de conteúdo segmentado para eles. O segundo objetivo da segmentação é ter este público verticalizado para busca de anunciantes interessados nestes mercados", explicou Marcelo Spinassé, sócio da Encripta. 

Falando sobre o mercado anunciante, Spinassé afirmou: "A aderência do mercado publicitário é crescente. Em mercados mais maduros, como nos Estados Unidos, plataformas AVOD têm seu inventário completamente vendido com meses de antecedência. No Brasil e na América Latina, a recepção ao formato está grande e é crescente. Ainda não temos a mesma aderência, mas chegaremos lá". E sobre o consumidor, o diretor observou: "Certamente o interesse do público pelo AVOD é grande e tende a crescer cada vez mais. Assim como temos no mercado de TV paga e TV aberta, o segmento de AVOD atinge um público muito mais amplo que do mercado SVOD, por vários fatores, desde a questão financeira – pois existe um poder limitado para assinatura de várias plataformas pagas – mas também pela questão da diversidade de conteúdos, facilidade e simplicidade de uso. Nas plataforma AVOD, basta apenas um cadastro simples e o usuário já pode sair acessando o conteúdo, sem nenhum custo". 

Marcelo Spinassé, da Encripta, aposta na segmentação para atrair anunciantes interessados em atingir públicos específicos

No final de 2020, a A2 Filmes estreou no YouTube o Film+, com diversos longas na íntegra 100% gratuitos para o público. Aqui, a segmentação está no fato de que todos os títulos são dublados. "Identificamos que a maior demanda de conteúdos para o mercado brasileiro são os filmes dublados – atingimos o maior público possível quando disponibilizamos os conteúdos neste formato. Além disso, uma grande parcela do público assiste através do mobile, por isso o fato de ser dublado também facilita", disse a equipe do Film+. O canal já soma 954 mil inscritos. 

Expectativas para o futuro 

É unanimidade entre os executivos que o AVOD é tendência e seguirá crescendo cada vez mais – tanto em número de usuários consumidores quanto em receita do mercado publicitário. "As plataforma AVOD serão, em público, maiores que as plataforma SVOD, certamente.  Isto porque o poder aquisitivo do usuário é limitado e ele não conseguirá assinar todas as plataforma e ter acesso a todo conteúdo que gostaria de ter.  Teremos também em breve os formatos mistos, com plataforma SVOD ofertando também publicidade em seus vídeos como também já acontece hoje na TV a cabo.  Mas o mercado de AVOD é promissor e será muito expressivo no futuro", opinou Spinassé, da Encripta. 

"Acreditamos que todas as modalidades de consumo sempre terão seu espaço no mercado de digital – TVOD, SVOD e AVOD -, mas com certeza o AVOD é um modelo de negócio que veio para ficar e cremos que no futuro será uma janela importante", completou a equipe do Film+. 

Já Castaldo, do ViX, comentou: "Acho que é bem possível o crescimento maior do AVOD em relação ao SVOD. Se fizermos um paralelo no cenário de hoje, um seria a TV aberta e o outro a Pay TV. Conforme todas as classes forem tendo acesso à informação e conectividade, a tendência é que o AVOD cresça muito no Brasil por oferecer um conteúdo on demand, variado, com qualidade e de graça. Sem contar que os usuários do SVOD também podem assistir conteúdos nas plataformas gratuitas. Portanto, acredito que em escala, o potencial de crescimento do AVOD é maior". 

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