Audiência pública sobre outorgas traz poucas propostas

A primeira audiência pública realizada pela Comissão de Ciência e Tecnologia, Comunicação e Informática da Câmara dos Deputados na atual legislatura, que aconteceu nesta quarta, 14, para discutir a melhor forma para a tramitação dos processos de outorga e renovação de outorgas de radiodifusão naquela casa, contou com presença significativa dos parlamentares e muito público. Contudo, o conteúdo da audiência foi fraco, chegando a algumas premissas para tais processos, mas sem propostas concretas nas quais estas premissas sejam contempladas. A deputada Luiza Erundina (PSB/SP), coordenadora da sub-comissão especial que estuda o assunto, sintetizou as intervenções dos cinco convidados: a área empresarial falou da necessidade de agilizar e desburocratizar o processo; enquanto os representantes da sociedade cobraram a vinculação da adequação do conteúdo das emissoras à possibilidade de renovação de sua outorga, além de ressaltar a necessidade de desconcentrar a propriedade da mídia. Em resumo, um lado ignorou as reivindicações do outro.
As premissas que todos aceitaram são: a importância da radiodifusão para o país; a necessidade de valorizar o radiodifusor sério, que obedece às regras da legislação; a necessidade de encontrar uma nova fórmula para aumentar a celeridade na tramitação das outorgas; a necessidade de alterar a legislação, já bastante defasada.
Segundo a deputada Luiza Erundina, os deputados têm ?um enorme desconforto? em analisar os processos. A deputada considera que existe um excesso de burocracia no processo, já a partir da documentação exigida no Ministério das Comunicações, e que os procedimentos e as normas são insuficientes e estão desatualizados. Para ela, há uma necessidade clara de elaborar uma legislação infra constitucional, para aprofundar as exigências da Constituição aos radiodifusores.
Mesmo criticando o processo burocrático, Erundina não deixou de apontar problemas no lado do empresariado, lembrando que há concessionários e autorizados que não se preocupam em manter sua documentação atualizada. A deputada lembrou ainda a existência de denúncias de arrendamento de emissoras de rádio (situação que levaria o proprietário a desinteressar-se pela legalização da outorga) e de denúncias de protelação de prazos.

Radiodifusores

Representada por seu presidente Daniel Pimentel Slaviero, a Abert apontou que o processo de renovação das outorgas deixa os empresários intranqüilos, na medida em que é demandado um conjunto enorme de documentos por parte do Ministério das Comunicações, demanda repetida no Congresso, além da demora excessiva na tramitação. A associação defendeu a transparência total deste processo tanto no Minicom quanto no Congresso: ?nosso objetivo é obter uma maior segurança jurídica em todo o processo?, afirmou Slaviero. Em relação às empresas que estão fora da lei, estas não teriam defesa por parte da entidade. Para ele, o problema está justamente nas emissoras que funcionam de acordo com a lei e que estão sendo penalizadas pela morosidade com que o Ministério das Comunicações e o Congresso Nacional tratam o assunto.
A Abratel, representada pelo vice-presidente, Marcelo Cordeiro, também insistiu na questão da segurança jurídica e na intranqüilidade do radiodifusor com o processo.
Já para a Abra, entidade da qual participam as cabeças de rede da Bandeirantes e da Rede TV!, que foi representada pelo vice-presidente, Frederico Nogueira, é preciso distinguir com clareza o processo de outorga do processo de renovação. Com base no parecer do então deputado federal Nelson Jobim em 1990, a entidade considera que outorga trata de investimentos futuros e concretização de negócios jurídicos a posteriori. ?Já a renovação trata de investimentos e negócios jurídicos já estabelecidos, com todas as conseqüências desta circunstância?, o que exigiria um cuidado maior por parte do Congresso. A Abra não concorda com a diferença de exigências de documentação entre os diversos tipos de emissoras e solicita que sejam eliminadas as redundâncias de documentos.

Conteúdo

Para Augustino Pedro Veit, representando a campanha ?Quem financia a baixaria é contra a cidadania?, no processo de renovação das outorgas, o conteúdo veiculado pelas emissoras deve merecer uma atenção especial dos parlamentares. Como critérios para conceder a renovação, estaria o cumprimento dos dispositivos constitucionais expressos nos artigos 221 e 222, o cumprimento da classificação indicativa estipulada pelo Ministério da Justiça, a atenção à presença das minorias sociais na programação e a regionalização da produção. Veit considera necessária também a participação da sociedade no processo de renovação, já que se trata de uma concessão de serviço público.
Respondendo um questionamento da deputada Luiza Erundina sobre a concordância da entidade em relação à idéia de realizar audiências públicas para aprovar a renovação de outorgas de emissoras de radiodifusão, o diretor executivo da Abert, Flávio Cavalcanti Júnior, lembrou que a entidade tem medo de ouvir somente aqueles que querem se manifestar. ?E a grande maioria silenciosa, como é que fica? Nós já ouvimos o Ibope que nos diz de forma qualificada que a população concorda com a nossa programação?. Cavalcanti lembrou que, com a possível entrada das empresas de telecomunicações na produção de conteúdo, a vigilância sobre a democratização deverá ser bem maior. ?São empresas estrangeiras que não têm intenção em defender o patrimônio da cultura nacional, como é o caso dos radiodifusores?. E provocou: ?eu quero saber se, quando estiverem produzindo e veiculando conteúdo, estas empresas vão ser obrigadas a transmitir a ?Voz do Brasil?, o horário eleitoral gratuito e as redes obrigatórias?.

Democratização

O representante do Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação ? FNDC, o radialista Edson Amaral, defende que parte dos problemas encontrados pelo Congresso na tramitação da renovação de outorgas reside na "inexistência de democracia nas comunicações no País". A proposta do Fórum é iniciar um processo de convocação imediata de uma Conferência Nacional pela Democratização das Comunicações, nos mesmos moldes do que foi feito na área da saúde, que resultou na criação do Sistema Único de Saúde, o SUS.
Ao contrário da Abra para quem não deve haver diferenças relativas aos processos de renovação de emissoras com características diferentes, o FNDC defende a necessidade de estabelecer claramente estas diferenças, como forma de respeitar a equidade, ou o tratamento desigual para os diferentes.
Em relação à democratização, Flávio Cavalcanti Júnior, da Abert, diz que a própria tecnologia está se encarregando de democratizar o acesso às comunicações, ?Democratizar os seis canais de VHF era uma coisa muito difícil. Melhorou com os 20 e tantos do UHF. E será melhor ainda com o advento da TV digital, especialmente após o fim da transição?.

Lei geral

De acordo com o deputado Walter Pinheiro (PT/BA), não se deve deixar de ?botar o dedo na ferida?. Para ele as dificuldades de discutir o assunto vêm justamente da inadequação da legislação existente para um setor em evolução e em processo de convergência digital. ?Que legislação vamos obedecer para renovar as outorgas??, perguntou ao plenário. O deputado baiano ainda provocou a Comissão sugerindo que não dá para esperar a iniciativa do Executivo, e que promete enviar uma proposta para a Lei de Comunicação Eletrônica de Massas. ?Vamos trabalhar nós mesmos no assunto?, provocou. Pinheiro sugeriu também um encontro com o presidente da Câmara, deputado Arlindo Chinaglia, para convocar um seminário de porte sobre o assunto, mobilizando toda a casa sobre o tema.

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