O documentário "Vai e Vem" nasce da ligação e das trocas entre suas duas diretoras, Chica Barbosa e Fernanda Pessoa, morando em Los Angeles (EUA) e São Paulo (Brasil), respectivamente. O momento é 2020, começo da pandemia, e ambos países marcados por governos negligentes e a escalada da Covid. O longa será lançado em cinemas pela Boulevard Filmes, em 2023, mas, antes disso, abrirá o 11º Olhar de Cinema, em 1º de junho.
"Eu queria que a Chica tivesse um pouco da sensação do que era estar no Brasil naquele momento – os panelaços diários, a obsessão com as notícias, a cidade que deveria estar vazia, mas na verdade nunca ficou, os trabalhadores que não tiveram a chance de parar porque o capital, os empreendimentos imobiliários nunca param por aqui. Por outro lado, queria entender como ela estava vivendo esse momento lá, recém-chegada aos Estados Unidos de Trump", explica Fernanda.
Para estabelecer esse diálogo, as duas jovens cineastas partiram de uma espécie de jogo, tendo como base um livro da professora americana R. Blaetz sobre o cinema experimental dirigido por mulheres. A publicação é composta de 16 artigos sobre diversas cineastas, e Fernanda e Chica se comunicariam por meio de vídeo-cartas curtas, cada uma inspirada por uma dessas mulheres.
Além da lista de Blaetz, a dupla também buscou nomes de outras diretoras para enriquecer o processo. "Não foi simples. Apesar de termos claro que existe uma variedade de artistas experimentais latino-americanas e negras, ainda existe o empecilho de ter um fácil acesso aos seus trabalhos. Queríamos encontrar nomes dos quais pudéssemos levar nossa pesquisa com mais profundidade para assim aplicá-la na nossa correspondência", conta Chica.
O "vai e vem" das correspondências digitais durou meses e atravessou momentos políticos marcantes – como processos eleitorais nos dois países. "No Brasil, quando o filme começou, havia uma esperança de que Bolsonaro caísse. O caos social e a pandemia davam muito medo, mas ao tempo parecia que havia uma possibilidade de mudança muito radical. No entanto, pouco a pouco parece que fomos nos acostumando com os absurdos desse governo e da pandemia", lembra Fernanda.
"Apesar de sentirmos um indício de esperança com a vitória do Biden, 2021 iniciou com a invasão do capitólio e o discurso absurdo sobre a fraude do resultado das eleições. Nem a grande representatividade na equipe do Biden foi suficiente para sentirmos verdadeiramente um avanço no país desde então", complementa Chica.
Para além das transformações sociais e políticas que o filme acompanha nos dois países, "Vai e Vem" foi uma experiência que mudou a vida das diretoras. Fernanda ingressou no doutorado com um projeto sobre o cinema experimental feito por mulheres na América Latina. "Com a pesquisa que eu e a Chica fizemos juntas, e a descoberta da falta de bibliografias e materiais sobre as mulheres latinas do experimental, decidi me aprofundar nesse caminho. Já no âmbito pessoal, além de reforçar minha amizade e admiração pela Chica, me fez buscar mais comunidade entre mulheres", diz.
Combinando diversos tipos de imagens, fotografia e texturas, "Vai e Vem" é um documentário com a urgência do presente e uma observação de duas jovens cineastas sobre o mundo que habitam. O filme será lançado no Brasil pela Boulevard Filmes e tem previsão de estreia nos cinemas para 2023.