"O Menino e O Mundo" simboliza momento maduro da animação nacional

A indicação de "O Menino e O Mundo" ao Oscar de melhor animação mostra um amadurecimento da animação e do audiovisual brasileiro. O longa, dirigido e produzido por Alê Abreu, vem conquistando prêmios em diversos eventos internacionais, com destaque para os prêmios do júri oficial e do público no Annecy International Animation Film Festival, na França. Trata-se do mais importante festival de animação no mercado global.

A presença em eventos com perfis tão distintos não é comum. Enquanto o Oscar é o grande prêmio da indústria, Annecy privilegia a criatividade nas técnicas, na estética e no roteiro. "Há um trabalho muito brasileiro, feito a muitos braços. Nós estamos encontrando o que é a animação brasileira", disse Alê Abreu em entrevista coletiva nesta sexta, 15.

"Há um trabalho muito brasileiro, feito a muitos braços. Nós estamos encontrando o que é a animação brasileira", diz Alê Abreu, diretor de "O Menino e O Mundo"
"Há um trabalho muito brasileiro, feito a muitos braços. Nós estamos encontrando o que é a animação brasileira", diz Alê Abreu, diretor de "O Menino e O Mundo"

A maturidade não está apenas na criação de uma cinematografia genuinamente brasileira, mas na forma como se trata essa cinematografia, sobretudo no mercado internacional. "Nos últimos dois anos, corri vários festivais em todo o mundo. Depois de Annency, com o prêmio, a imprensa internacional se mostrou muito curiosa sobre o que acontece no Brasil", explica Abreu.

Em entrevista a este noticiário, Sabrina Nudeliman, diretora executiva da Elo Company – agente de vendas do filme no mercado internacional e distribuidora no Brasil em todas as janelas menos cinema -, diz que a indicação ao Oscar depende muito de uma boa estratégia de lançamento. "Sabíamos que tínhamos que entrar nos festivais e que tínhamos que fechar com uma boa distribuidora nos Estados Unidos. Fazer uma venda direta para um canal dos EUA faria muito mais sentido no curto prazo, mas para entrar no Oscar, era importante fechar com a Gkids", explica. A distribuidora escolhida trabalha com animações independentes e leva conteúdo internacional ao mercado americano. "O acordo com a Gkids incluía o esforço deles na indicação ao Oscar", completa.

Uma das estratégias foi esperar um ano para lançar o longa nos EUA, e entrar na corrida pelo principal prêmio da indústria cinematográfica em um momento mais favorável. "Havia uma concorrência mesmo dentro da Gkids, que tinha outros três filmes fortes para concorrer", conta o diretor do filme.

Após a nomeação, o longa começa a disputar a atenção do júri da premiação, os membros da Academia de Artes e Ciências Cinematográficas. O filme concorre com "DivertidaMente", da Pixar\Disney, o grande favorito para levar a estatueta. "Agora é uma guerra de Davi contra Golias, um menino de US$ 500 mil contra um gigante de US$ 200 milhões", diz Alê Abreu, lembrando que "O Menino e O Mundo" custou R$ 2 milhões, sendo que R$ 500 mil foi apenas na distribuição. "Vai ser legal se um filme tão anti indústria ganhar o maior prêmio da indústria", diverte-se.

Carreira

Com distribuição em cinema da Espaço Filmes, "O Menino e O Mundo" fez público de apenas 35 mil espectadores no Brasil. Ainda no mercado local, já tem três janelas de TV por assinatura vendidas, começando pela HBO, seguindo para Turner e Fox. Além disso, conta Sabrina Nudeliman, já está sendo negociado com um canal de TV aberta. Para VOD, a HBO tem exclusividade até 2017. A Espaço Filmes deve relançar em breve nas salas brasileiras.

No mercado internacional o filme já ganhou uma distribuição expressiva. Foi vendido para 90 países, sendo que em 40 deles inclui a janela cinema. O mercado francês foi o responsável pelo público mais expressivo até momento, chegando a 120 mil espectadores, tendo ficado em cartaz nas salas durante sete meses.

"Com a nomeação, o filme ganha valor. Já vendemos muito, mas as janelas ainda abertas passam a ter outro valor", conta Sabrina. Além disso, o filme deve ser relançado em cinema em alguns dos países onde já foi lançado.

Incentivo

Para Alê Abreu, os mecanismos de fomento disponíveis hoje no Brasil permitem um trabalho criativo mais livre nos longas. "Os mecanismos de incentivo permitem que eu não tenha uma preocupação tão grande com as demandas de mercado", diz.

"A maturidade do audiovisual permite começar a pensar no papel das distribuidoras não somente para a janela de cinema no Brasil, mas também para outras janelas e territórios. Hoje o fomento é muito focado nos produtores", diz Sabrina Nudeliman, da Elo Company
"A maturidade do audiovisual permite começar a pensar no papel das distribuidoras não somente para a janela de cinema no Brasil, mas também para outras janelas e territórios. Hoje o fomento é muito focado nos produtores", diz Sabrina Nudeliman, da Elo Company

Sabrina, da Elo Audiovisual, por sua vez, cobra uma atenção maior à distribuição internacional por parte estado. "Acho que o sucesso deste filme é uma oportunidade de se pensar nas políticas públicas. Uma distribuidora que trabalha para 90 territórios não tem nenhum mecanismo de fomento ou financiamento público. A maturidade do audiovisual permite começar a pensar no papel das distribuidoras não somente para a janela de cinema no Brasil, mas também para outras janelas e territórios. Hoje o fomento é muito focado nos produtores", diz.

Portas

Para Sabrina Nudeliman, a indicação ao Oscar "é um reconhecimento ao conteúdo brasileiro e ao nosso trabalho". A indicação coloca os envolvidos no trabalho em evidência e abre novas portas, no Brasil e no mercado internacional. "Agora somos uma agente de vendas brasileira que trabalha com um filme indicado ao Oscar", comemora Sabrina. Para a executiva, no entanto, a um longo caminho a ser percorrido para viabilizar uma distribuição mais expressiva do conteúdo brasileiro no exterior. "A exportação do conteúdo brasileiro é muito difícil. Trata-se de um mercado árido. Produzimos hoje muito mais e com muito mais qualidade que há dez anos, mas temos algumas barreiras, como o idioma", pondera.

O diretor Alê Abreu também colhe bons frutos do sucesso do longa. Ele se associou à Buriti Filmes para a produção de seus próximos longas – ele já trabalha no desenvolvimento do seu próximos longa, chamado "Viajantes do Bosque Encantado". "Me incomodava um pouco o fato de ser o meu próprio produtor. Gastei muita energia na produção de 'O Menino e O Mundo', deixando de me concentrar na direção", explica. Além disso, Abreu vem negociando a possibilidade de coproduzir com a Les Armateurs, produtora francesa ("As Bicicletas de Belleville").

"O Menino e O Mundo" também virará uma série de animação francesa. A série francesa vai misturar dois filmes de longa- metragem. Além da animação brasileira, será composto por "On The Way to School", documentário francês que mostras os caminhos perigosos que algumas crianças enfrentam para chegar à escola. Será metade animação e metade live action.

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