A consolidação do vídeo sob demanda por assinatura (SVOD, na sigla em inglês) fez muita gente questionar o futuro da publicidade. Houve até quem creditasse o sucesso dos planos pagos de Netflix e companhia a uma suposta rejeição do público aos comerciais que sustentam a televisão. Entretanto, dados da Kantar mostram um cenário diferente.
No segundo trimestre do ano passado, mais da metade (52%) dos estadunidenses disse não se importar de ver anúncios se isso tornar mais barata a assinatura de video on demand. A mesma afirmação também teve força no Reino Unido (44%) e na Alemanha (39%). Ressalte-se que esses três países já são extremamente bombardeados por comerciais e, mesmo assim, suas audiências não dão qualquer sinal de exaustão.
Números assim fazem o mercado publicitário dedicar cada vez mais atenção (e dinheiro) ao vídeo sob demanda. Quase 90% dos anunciantes consideraria investir em um player de SVOD. Além disso, 62% dos profissionais de marketing preveem mudar o orçamento de streaming de vídeo neste ano. Esse percentual é de 53% no caso de streaming na TV.
Vale lembrar que a maior plataforma de vídeos on-line do mundo é o YouTube, cuja receita é quase que inteiramente composta pela venda de anúncios. No último trimestre de 2022, o serviço do Google teve um faturamento global com publicidade que ultrapassou a marca de sete bilhões de dólares.
É evidente, portanto, que existe uma forte aliança entre patrocinadores e telespectadores. Os primeiros desejam aparecer mais, enquanto os segundos aceitam ceder seu tempo aos comerciais, desde que recebam certas contrapartidas, como desconto nas mensalidades, por exemplo.
Disney+ e Netflix são dois exemplos de gigantes globais que já aderiram aos anúncios, sem falar dos serviços FAST (free ad-supported streaming television) que ganham cada vez mais espaço, com destaque para a Pluto TV. A plataforma da Paramount conquistou 6,5 milhões de novos usuários ativos mensais apenas no quarto trimestre do ano passado. No Brasil, a Globo lançou recentemente dois canais FAST para o Samsung TV Plus.
E por falar em Globo, o Globoplay merece uma menção honrosa quando se trata da relação entre streaming e publicidade. O VOD da família Marinho oferece incontáveis formatos de assinatura e anúncios, combinando video on demand, TV aberta, TV paga etc. Tamanha variedade ajuda a explicar o porquê desse player 100% nacional conseguir manter uma participação tão relevante no mercado mesmo sem dispor dos bilhões de dólares que seus concorrentes diretos possuem.
O panorama descrito nas linhas acima deixa algumas lições:
- os anúncios chegaram no streaming para ficar;
- a publicidade amplia e diversifica as fontes de receita das plataformas, que já não angariam assinantes com a mesma intensidade de antigamente;
- os modelos de remuneração, assim como as formas de se consumir conteúdo, não morrem, mas se adaptam e se acumulam;
- as agências e os anunciantes querem investir cada vez mais em todas as formas de vídeos on-line; e
- o público não rejeita comerciais e tem consciência dos benefícios que eles trazem, inclusive no que se refere à oferta de mensalidades mais baratas.
Uma das maiores transformações provocadas pela publicidade no video on demand envolve a criação de dois segmentos de telespectadores:
- (a) aqueles com menos renda disponível e que verão mais comerciais e
- (b) aqueles com mais renda disponível e mais difíceis de serem alcançados pelos anúncios.
Ou seja: o streaming ficará cada vez mais parecido com a TV tradicional e sua histórica divisão entre serviços abertos e pagos. E isso é bom, pois o vídeo on-line não se restringirá às elites e se consolidará como um meio democrático para consumo e difusão de conteúdo. Tal cenário terá reflexos positivos para todos aqueles que investem e trabalham no setor audiovisual, que continuará sendo demandado por novas e maiores produções.