Zordon Analytics identifica que Brasil deve produzir mais ação e destaca acertos do novo cinema cearense

Fernando Cabral, da Zordon Analytics (Foto: Ticiane da Silva/ Agência Pressphoto)

Fernando Cabral, Data Analyst na Zordon Analytics, ministrou uma apresentação no Gramado Film Market, braço de mercado do Festival de Cinema de Gramado, sobre o uso de dados na construção de conteúdos. A Zordon trabalha hoje com grandes produtoras, como Chatrone, Elo Studios, Gullane, Glaz e Abrolhos Filmes, entre outras, com análises de público, conteúdos, perfis de audiência e plataformas. 

A Zordon monitora o acesso às principais plataformas de streaming no Brasil. Esse estudo é feito a partir da quantidade rastreável de acesso às URLs dos sites dos serviços de streaming e identificou, por exemplo, que a Netflix ainda é dominante (34% dos acessos) com o Prime Video aparecendo na segunda posição (15%). Em relação ao conteúdo, o momento é de transformação. Se antes a grande maioria era de filmes e séries, cada vez mais estamos vendo outros formatos, como novelas e reality shows. E, mesmo com o streaming já muito consolidado, o consumo linear ainda é superior ao das plataformas de streaming, segundo dados da Kantar, o que gera interesse nas plataformas em elaborarem conteúdos similares aos da televisão tradicional. 

A presença das novelas nos rankings dos conteúdos mais vistos das plataformas que possuem conteúdos do formato originalmente de canais de televisão, como o SBT, que tem "Chiquititas", do SBT, no catálogo, e o Globoplay, que tem as novelas da Globo, move os principais players no sentido de aumentarem a produção de conteúdos nesse formato. Não à toa, estamos vendo uma proliferação de anúncios de produções de novelas originais por plataformas de streaming, como Netflix e HBO Max. O drama – que está indiretamente ligado às novelas – é um dos gêneros mais populares, tanto para filmes como para séries. Mas Cabral aponta que, no ranking das produções de drama mais vistas das plataformas, tem pouco conteúdo nacional – o que pode sinalizar para a nossa produção uma demanda maior pelo gênero. 

Ele pontuou que, em geral, os gêneros favoritos no Brasil são ação, drama e comédia – e nas plataformas, o drama é o segundo gênero de filme mais consumido. "Mas as produções de ação são fundamentais para sobrevivermos como um ecossistema de produção. Ela aparece entre os gêneros favoritos da nossa audiência há três anos. 

Aposta global em drama e ação 

De acordo com análise da Zordon, os países estão em geral apostando em títulos de drama e ação. Para esse estudo, foram excluídos os títulos dos EUA, a fim de comparar a produção com outros países com uma realidade similar a nossa, isto é, de domínio do conteúdo hollywoodiano. Nesse monitoramento, identificou-se que, enquanto internacionalmente 31,7% das produções têm sido de ação, no Brasil o número é de apenas 9%. Em relação ao drama, a produção praticamente se iguala: 20,6% no cenário internacional e 19% no cenário nacional. A comédia ainda é o grande destaque nacional: 35% no Brasil e 13% no contexto global. Vale destacar ainda as produções que falam de crimes – 15% no território nacional e 9,8% lá fora – e a produção infantil, com 10% no Brasil e o surpreendente número de 0% no internacional. "O insight principal é que é preciso encontrar meios de produzir filmes de ação, mesmo que com orçamentos reduzidos e menor know-how que o filme hollywoodiano. Também é flagrante que damos preferência ao conteúdo infantil nacional", observou Cabral. 

Desempenho dos filmes no Brasil por gênero 

Um monitoramento feito nas plataformas de streaming do país entre abril de 2022 e abril de 2023 revelou o desempenho dos filmes divididos por gênero. Entre os mais assistidos, estão os de comédia, com 15 títulos que figuraram em rankings de mais vistos, e um market share médio de por título do gênero de 2,34%; ação, com seis, e market share por título de 1,55%; drama, com cinco títulos nos rankings, e market share de 3,81%; e infantil, com três, e market share de 3,24%. 

O mais assistido de drama foi "Depois do Universo", um Original Netflix de 2022; o mais assistido infantil foi "Luccas Neto em: O Plano dos Vilões", também de 2022; e o mais assistido de ação foi "Cidade de Deus", de 2002 – o que comprova que o público não está consumindo só produções recém-lançadas. 

"Avaliando o desempenho dos gêneros dividido pelo número de títulos que figuraram em rankings, é possível perceber uma performance média de cada título do gênero. É flagrante que filmes de drama, infantis e crime, mesmo com poucos títulos, tiveram uma performance média para cada título bastante significativa", apontou o especialista. 

Há diferenças de consumo no streaming e no cinema em relação aos gêneros. Falando de ação, por exemplo, o gênero representou 38,7% do consumo no streaming entre 2022 e 2023 e 44,4% no cinema em 2023. Já em relação ao drama, o gênero representou 16,2% do consumo no streaming e 6,5% do consumo no cinema, no mesmo período analisado. A comédia, por sua vez, reuniu as porcentagens de 14,9% do consumo no streaming e 2,4% do consumo no cinema. 

Enquanto os cinemas vendem mais tickets para filmes de ação (44,4%), animação (30,4%) e terror (9,7%), os gêneros mais populares no streaming são drama (16,2%), comédia (14,9%) e crime (6%). Conclui-se, também que o market share por gênero dos títulos no cinema é mais concentrado em menos gêneros do que no streaming, onde o consumo é mais fragmentado. 

Focando novamente na análise do gênero ação, a Zordon identificou que as key-words mais comuns em filmes de ação internacionais buscados no streaming são: em personagens, refém e guerreiro; em situações dramáticas, explosão e morte; em universo, fogo e MMA; em elementos cênicos, pistola e sangue; em temas, violência e enganação; e em ações, assassinato e luta. "Em especial, flagramos elementos de ação que não demandam grandes produções e, ao mesmo tempo, servem a dose de adrenalina desejada pela audiência. Por exemplo, em relação a personagens, o mais buscado não é o herói, por exemplo, e sim o refém. E produzir uma história de refém não é tão complexo", opinou Cabral. 

O novo cinema cearense 

O especialista conclui que o que ele chama de "novo cinema cearense" é o que mais acerta nessa materialização: "Filmes cearenses, que não costumavam ter grande expressividade em bilheterias, passaram a lotar os cinemas a partir de 2008 com alguns filmes espíritas mas, principalmente, com os títulos de ação-comédia da dupla Halder Gomes e Edmilson Filho". 

Em 2019, os filmes do Ceará registraram 621.555 de público nos cinemas. A título de comparação, os filmes do Rio Grande do Sul (onde acontece o Festival de Gramado) registraram pouco menos de 49 mil, mesmo com 12 filmes lançados. Entre os destaques dos últimos anos, estão "Shaolin do Sertão", em 2016; "Os Parças", em 2017; "Cine Holliúdy 2", em 2018; e "Os Parças 2", em 2019. Mais recentemente, o estado também se destacou no streaming, com o lançamento da produção Original Netflix "Cabras da Peste" (2021) e "O Cangaceiro do Futuro" (2022). 

Segundo Cabral, o elemento crucial para o sucesso desses filmes é justamente a ação, e especialmente o "jeito protetor da cultura brasileira que eles têm para absorver o filme de ação". Ele ainda elabora: "Nos primeiros filmes, o talento de Edmilson para o Kung Fu é muito explorado para aproximá-los de filmes de luta. Os filmes mais recentes vêm se aproximando dos filmes policiais e de espionagem. Destaque para 'Cine Holliúdy' e 'Os Parças', cujas tramas não necessariamente precisam de cenas de ação e, ainda assim, elas estão bastante presentes". 

Por fim, Cabral também mencionou que os filmes citados trazem uma comunhão de valores que tem "match" com o público nacional, como simplicidade e humildade, interlocução com o estrangeiro, histórias de Davi vs. Golias (o pequeno enfrentando o grande), amizade e regionalismo. 

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